Escócia poderia declarar independência no Reino Unido e ficar na União Europeia?
Uma União Europeia sem o Reino Unido, mas com a Escócia? Os resultados das eleições britânicas levantaram a possibilidade de um segundo referendo de independência, que permitiria aos escoceses, caso a opção separatista saia vitoriosa, permanecer no bloco econômico.
A primeira-ministra da Escócia, Nicola Sturgeon, pediu ao governo do Reino Unido para negociar a transferência de poderes para o Parlamento escocês, o que permitiria ao país organizar um referendo de independência em 2020.
Para Sturgeon, o resultado das eleições gerais neste mês — nas quais o seu Partido Nacional Escocês (SNP, na sigla em inglês), obteve 48 das 59 cadeiras possíveis no Parlamento — torna indiscutível o apoio a um novo referendo.
O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, é contra a realização de outro referendo, alegando que o que foi realizado em 2014 deve ser respeitado — na ocasião, 55% dos escoceses rejeitaram a saída do Reino Unido, contra 45% que votaram pela independência.
Dado que a ampla vitória de Boris Johnson praticamente garante a saída do Reino Unido da União Europeia em 31 de janeiro, o objetivo da Escócia é deixar a união britânica e se reintegrar como Estado-membro do bloco europeu.
Mas isso seria possível?
Porque a independência da Escócia voltou a ser assunto?
Embora a permanência no Reino Unido tenha saído vitoriosa no referendo escocês de 2014, o referendo para o Brexit, a saída da União Europeia, realizado em 2016, mudou esse cenário.
Na Escócia, 62% dos cidadãos foram contra deixar o bloco europeu, enquanto 52% dos eleitores britânicos votaram a favor do Brexit.
O Partido Nacional Escocês considerou isso como "uma mudança material de circunstâncias" que justificaria uma segunda consulta sobre a independência, uma vez que a Escócia seria forçada a deixar o bloco "contra sua vontade".
Desde 2016, o partido obteve bons resultados nas campanhas eleitorais sob o lema de "colocar o futuro da Escócia nas mãos escocesas".
A Escócia tem o poder de fazer um segundo referendo?
Tem havido um longo debate jurídico sobre se o Parlamento Escocês poderia aprovar as leis necessárias para que haja uma nova votação sobre independência — em tese é o Parlamento Britânico, em Westminster, no qual a Escócia tem 59 vagas, que deveria aprovar essa lei.
A questão nunca foi julgada pela Justiça.
De qualquer forma, a primeira-ministra escocesa quer que o governo do Reino Unido concorde em transferir os poderes para o Parlamento Escocês para permitir que haja um referendo, assim como aconteceu em 2014.
Assim, segundo a líder escocesa, isso garantiria que o resultado do referendo fosse considerado legal e legítimo por todos, especialmente pela União Europeia.
Mas o primeiro-ministro Boris Johnson, junto a outras figuras importantes do seu governo, se opõe a isso e diz que não haverá referendo pela independência nos próximos cinco anos.
O que acontece se Boris Johnson disser não?
Sturgeon acredita que Johnson e o Partido Conservador podem "ficar contrariados com a realidade" por um tempo, mas no final terão que se render à "democracia".
Se seus argumentos políticos não fizerem Johnson ceder, Sturgeon não descarta levar o caso à Justiça. Uma jogada arriscada, uma vez que o sucesso não é garantido e pode levar um tempo considerável, mas alguns membros do SNP acreditam que pode funcionar.
O que a líder do SNP descartou é um referendo não autorizado. Ela diz que o exemplo da Catalunha (onde o referendo acabou sendo considerado ilegal) prova que "isso não leva à independência".
Sua outra opção seria conseguir uma vitória esmagadora nas eleições para o Parlamento escocês em 2021, o que catapultaria a demanda por um referendo e aumentaria a pressão sobre o governo britânico.
Os escoceses votariam pela independência?
Nicola Sturgeon não quer organizar apenas um referendo, como também vencê-lo.
Dados de opinião coletados pelo instituto de pesquisa What Scotland Thinks apontam para um aumento de apoio à independência — ela continua, no entanto, não tendo a maioria dos votos.
De uma maneira geral, as pesquisas deste ano apontam para 51% dos votos contra a independência, excluindo os indecisos, e 49% a favor.
O SNP espera, porém, que o Brexit e a rejeição a Boris Johnson na Escócia mudem o rumo dos votos.
A Escócia independente ficaria na União Europeia?
Na prática, a Escócia não se tornaria independente imediatamente após uma vitória do "sim" nas urnas. Primeiro, deveria haver um período de transição.
Em 2014, os defensores da independência afirmaram que levaria 18 meses para criar um Estado escocês independente.
Mesmo que o referendo fosse realizado amanhã, a transição duraria até o fim de 2020, quando o Reino Unido deve concluir a saída completa da União Europeia.
Isso significa que a Escócia deixaria a UE com o resto do Reino Unido ? e precisaria se candidatar para ingressar no bloco europeu novamente.
Os ministros escoceses estão dispostos a seguir esse trâmite, mas querem iniciá-lo "o mais rápido possível".
O que a Escócia teria que fazer para entrar de novo na UE?
A Escócia teria que passar por todos os trâmites de qualquer outro Estado que pretenda fazer parte da União Europeia, apesar de ter a vantagem de ter sido um membro recente.
Os critérios de acesso envolvem uma série de questões como moeda, níveis de deficit e fronteiras.
Sturgeon já abordou essas questões, argumentando que a Escócia poderia continuar usando a libra esterlina inicialmente — e que a situação financeira do país poderia ser ajustada dentro do marco econômico europeu.
No entanto, seu próprio partido acredita que isso pode levar vários anos.
A primeira-ministra também quer evitar barreiras na fronteira entre a Escócia e a Inglaterra. Ela diz que respostas sobre essas questões e muitas outras serão dadas em detalhes antes de qualquer votação.
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