'Ele ficou bem assustado': os bastidores da operação que prendeu Queiroz em Atibaia
Três horas da manhã. Vinte policiais do Grupo Armado de Repressão a Roubos e Assaltos (Garra) saem de São Paulo rumo ao interior do Estado para cumprir um mandado de prisão, busca e apreensão.
Uma hora depois, eles encontram promotores em Campinas e descobrem que vão para Atibaia ainda sem saber que prenderiam Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador Flávio Bolsonaro.
A BBC News Brasil conversou com um promotor do Ministério Público de São Paulo e com policiais civis do Garra, que participaram da operação nesta quinta-feira (18/06). Eles deram detalhes de como Queiroz reagiu assim que foi encontrado e como entraram na casa do advogado de Flávio e Jair Bolsonaro, onde ele estava dormindo.
Na noite anterior, o Garra recebeu um comunicado do Ministério Público pedindo apoio para cumprir mandados de busca e apreensão. "Pensamos que era algo sobre esses desvios de verbas da saúde", afirmou um dos policiais à reportagem.
Às 4h, se encontraram com o Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco) em Campinas. O grupo fez uma reunião para revelar que fariam a operação na cidade de Atibaia. As equipes saíram para o destino pontualmente às 5h.
Susto e portas arrombadas
Os policiais tentaram entrar na casa onde Queiroz estava às 6h.
"Tocamos campainha, chamamos, mas não fomos atendidos. Então, tivemos de entrar à força. A gente cortou a corrente e um cadeado que bloqueavam a entrada e acessamos o local com o mandado em mãos. Está tudo registrado", afirmou um membro do Garra.
Os policiais ainda arrombaram mais duas portas até chegar a Fabrício Queiroz. A primeira foi para ter acesso à parte interna da casa e a segunda, ao quarto onde o ex-assessor dormia.
Às 6h10, Queiroz acordou com o barulho da porta do quarto onde dormia sendo arrombada.
"Ele ficou bem assustado. Ele não esperava. Mas tentamos fazer da maneira menos traumática possível. As circunstâncias da situação por si só já causam um alerta maior. O sentimento dele foi de grande surpresa", relatou um policial.
Queiroz não ofereceu nenhum tipo de resistência. Segundo os policiais ouvidos pela reportagem, ele justificou a mudança para Atibaia afirmando que no Rio de Janeiro não recebia o tratamento adequado para um câncer.
"Assim que ele foi identificado, demos voz de prisão e explicamos os motivos que pesavam contra ele. Dissemos que foi uma ordem expedida por um juiz do Rio de Janeiro e cumprida por equipes de São Paulo e Campinas", afirmou.
Os policiais então iniciaram uma busca na casa por celulares e outros documentos. Não foram encontradas armas ou qualquer outro material ilícito no local.
Foram apreendidos com Queiroz dois celulares, pouco mais de R$ 900 em dinheiro e documentos de Imposto de Renda. Não havia notebooks ou tablets na casa.
Caseiros
Em uma edícula no fundo da casa onde Queiroz foi preso, foram encontradas duas pessoas que trabalham como caseiros do local. Elas foram apenas ouvidas como testemunhas.
Os policiais disseram que o imóvel deveria funcionar como um escritório do advogado Frederick Wassef, que trabalha na defesa do senador Flávio Bolsonaro e também já defendeu seu pai, o presidente Jair Bolsonaro, mas não possui características de um estabelecimento comercial. Não foram encontrados computadores ou documentos, por exemplo, em nenhum dos dois quartos, sala e cozinha do local.
Após ser identificado e preso pelos policiais e promotores, Queiroz foi encaminhado ao IML na capital paulista, onde ele fez um exame de corpo de delito.
De lá, ele foi levado à divisão de capturas do Departamento de Operações Policiais Estratégicas da Polícia Civil (Dope). No local, foi elaborado o registro de captura e foram exibidos os objetos apreendidos.
Em seguida, Queiroz foi escoltado até o helicóptero Pelicano, da Polícia Civil, que o levou do aeroporto do Campo de Marte, na Zona Norte paulistana, até Jacarepaguá, no Rio de Janeiro.
Ocorrência comum
Um promotor ouvido pela reportagem disse que é comum membros do Ministério Público de outros Estados solicitaram apoio para concluir operações.
"Isso acontece três vezes por semana no Gaeco da capital. Temos um protocolo padrão para que a operação seja garantida. Para que a gente se prepare, o órgão nos alerta antes de que aguarda uma decisão judicial para sair em diligência", afirmou.
Ele disse ainda que apenas quando são expedidas ordens judiciais eles ficam sabendo qual o alvo da operação.
"Chegou ontem à noite a informação e fomos checar se o endereço existia, se era realmente naquela cidade, entendemos como é a região, onde fica, se tem fotos. Quando necessário, fazemos uma diligência antes para organizar tudo, dependendo da operação", afirmou à reportagem.
No entanto, o promotor disse que no caso dessa operação não foi possível conhecer o local antes porque eles tiveram pouco tempo. Segundo ele, por conta da pandemia de coronavírus, os promotores estão evitando reuniões presenciais.
O reconhecimento prévio do local foi feito apenas por meio de informações obtidas em bancos de dados e Google Street View. Membros do Ministério Público de São Paulo disseram que também não fizeram nenhum tipo de campana ou vigilância ao redor da casa nos dias anteriores à operação.
A Promotoria do Estado responsável pelo processo, neste caso o Rio de Janeiro, avisa o órgão onde será feita a operação de que há chances de uma decisão judicial desencadear uma operação. Como o caso corre em sigilo, eles não passam o endereço com antecedência.
"Quando sai a decisão, eles dizem: 'Olha, vamos ter um mandado na região de Campinas. Quem cumpre?'. E a gente direciona", explicou um promotor paulista à reportagem.
Ele explica que a primeira atitude que os promotores tomam quando isso acontece é solicitar apoio para cumprir a operação.
"A entrada no domicílio quem tem preparo para fazer é a polícia. O alvo pode ter uma arma, reagir e isso é contido pela polícia", afirmou.
Os policiais e promotores que participaram da operação negaram a informação que circula nas redes sociais de que Queiroz pudesse estar sendo mantido refém no local.
"Os muros da casa eram baixos, só tinha um caseiro e a mulher dele no imóvel. Seria muito fácil fugir. Ele ainda estava com dois celulares. Todas as circunstâncias não são as que normalmente ocorrem num sequestro", afirmou um promotor.
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