Topo

Esse conteúdo é antigo

Os 'fantasmas' que a fala de Trump sobre não reconhecer resultados nas eleições pode acordar

Trump vem questionando a votação por correio, sem garantir que fará uma transição pacífica caso perca as eleições americanas - Reuters
Trump vem questionando a votação por correio, sem garantir que fará uma transição pacífica caso perca as eleições americanas Imagem: Reuters

24/09/2020 08h43

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, não se comprometeu com uma transição pacífica de poder caso venha a perder as eleições em novembro.

"Bem, nós vamos ter que ver o que acontece", o presidente disse em entrevista coletiva na Casa Branca. "Vocês sabem disso."

Trump também disse acreditar que o resultado do pleito pode acabar na Suprema Corte do país, por causa de dúvidas sobre a votação por correio levantadas novamente por ele.

Mais estados estão encorajando votos por correio, citando a necessidade de manter o distanciamento social necessário devido à pandemia de coronavírus.

As declarações do presidente americano aumentaram as tensões nos Estados Unidos, já que o país tem alguns "fantasmas" no passado em seu processo eleitoral — como disputas judiciais na Suprema Corte.

O que Trump disse?

Trump foi questionado por um repórter na noite de ontem se ele se comprometia com uma transição de poder pacífica "vencendo, perdendo ou empatando" com o democrata Joe Biden. O presidente atualmente está atrás de Biden nas pesquisas, faltando 40 dias para a eleição.

"Eu tenho reclamado muito veementemente sobre as cédulas", disse Trump, em referência ao voto postal, que ele acredita ser vulnerável à fraude. "As cédulas são um desastre."

Quando o jornalista disse que "o povo está protestando", Trump respondeu: "Queremos nos livrar das cédulas, e vocês terão uma muito... vocês terão uma muito pacífica... não haverá transferência, francamente, haverá continuidade".

Em 2016, Trump também havia se recusado a se comprometer em aceitar os resultados da eleição durante sua campanha, e foi acusado pela rival, a democrata Hillary Clinton, de atacar a democracia.

Eventualmente ele venceu as eleições, mesmo tendo recebido três milhões de votos a menos do que Hillary na contagem geral de votos, um resultado que ele questionou.

O senador republicano Mitt Romney, que é um dos poucos no partido de Trump que critica o presidente, tuitou na quarta-feira: "Fundamental para a democracia é a transição pacífica de poder; sem isso, existe Belarus. Qualquer sugestão de que um presidente não vá respeitar essa garantia constitucional é impensável e inaceitável".

O que os democratas dizem?

Conversando com jornalistas em Delaware, Biden disse que os comentários de Trump sobre transição de poder são "irracionais".

Sua campanha disse estar pronta para quaisquer "malícias" do presidente.

A equipe democrata também disse que "o governo americano é perfeitamente capaz de escoltar qualquer invasor para fora da Casa Branca".

O próprio Biden foi acusado de provocar incertezas nas eleições ao declarar em agosto: "Alguém acredita que haverá menos violência nos Estados Unidos se Donald Trump for reeleito?"

No mês passado, Clinton fez um apelo a Biden para que ele não reconheça derrota "em quaisquer circunstâncias", se o resultado for apertado.

Ela levantou a possibilidade de republicanos tentarem "bagunçar as cédulas de ausentes" e mobilizar um exército de advogados para contestar o resultado.

O que Trump falou sobre a Suprema Corte?

No início da quarta-feira, o presidente dos Estados Unidos defendeu sua decisão de buscar a nomeação de um novo juiz para a Suprema Corte antes da eleição presidencial, dizendo que espera que o resultado da eleição chegue ao tribunal. Composta normalmente de nove juízes, a Suprema Corte tem agora um lugar vago depois que a juíza Ruth Bader Ginsburg morreu na sexta-feira passada.

"Acho que isso [a eleição] vai acabar na Suprema Corte e acho muito importante termos nove juízes", disse o presidente. "Acho que é melhor se fazer isso antes das eleições, porque acho que esse golpe que os democratas estão tramando — é um golpe — o golpe será levado à Suprema Corte dos Estados Unidos."

Trump estava aparentemente se referindo às suas polêmicas alegações de que as cédulas pelo correio são vulneráveis à fraude.

O presidente disse que nomeará uma candidata mulher para a Suprema Corte neste sábado, em substituição a Ginsburg.

Os partidários de Trump esperam que a sua indicada, se confirmada pelo Senado dos Estados Unidos, consolide uma ascensão conservadora na mais alta corte do país, com 6 juízes conservadores contra 3 liberais.

Todos os candidatos presidenciais perdedores dos Estados Unidos nos tempos modernos concederam derrota, mesmo em resultados eleitorais muito apertados. Isso inclui 1960, quando John F. Kennedy venceu por pouco Richard Nixon, e em 2000, quando George W Bush venceu Al Gore na Flórida.

O voto por correspondência é vulnerável à fraude?

O número de votos por correspondência deverá aumentar significativamente desta vez devido a preocupações de saúde pública com o coronavírus.

Mas Ellen Weintraub, comissária da Comissão Eleitoral Federal, disse: "Simplesmente não há base para a teoria da conspiração de que votar pelo correio acarretará em fraude".

Houve casos isolados de fraude eleitoral, como nas primárias de 2018 na Carolina do Norte, que precisaram ser realizadas novamente depois que um consultor do candidato republicano adulterou os papéis de voto.

Também houve um caso este ano em Nova Jersey em que dois vereadores democratas foram acusados de fraude no voto por correspondência, depois que centenas de cédulas foram encontradas em uma caixa de correio.

Mas o índice geral de fraude eleitoral nos Estados Unidos está entre 0,00004% e 0,0009%, de acordo com um estudo de 2017 da entidade Brennan Center for Justice.

É mais provável que as cédulas postais desapareçam, no entanto, de acordo com uma pesquisa de Charles Stewart, um cientista político do Instituto de Tecnologia de Massachusetts.

Ele calculou que o número de votos perdidos pelo sistema de votação por correspondência na eleição de 2008 pode ter sido de até 7,6 milhões, ou um em cada cinco indivíduos que tentaram enviar suas cédulas pelo correio.