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CPI da Covid: por que empresário Carlos Wizard foi convocado

Carlos Wizard é um dos 14 investigados pela CPI e teve seu sigilo quebrado - WASHINGTON COSTA/MINISTÉRIO DA ECONOMIA
Carlos Wizard é um dos 14 investigados pela CPI e teve seu sigilo quebrado Imagem: WASHINGTON COSTA/MINISTÉRIO DA ECONOMIA

29/06/2021 15h53

Empresário que atuou no Ministério da Saúde junto a Eduardo Pazuello é investigado pela comissão e teve seu sigilo quebrado; ele será questionado a respeito de sua influência na aquisição de cloroquina e vacinas.

As suspeitas em torno de um "gabinete paralelo" e de possíveis irregularidades em contratos de vacinas e medicamentos do governo federal serão abordadas nesta quarta-feira (30/6) no depoimento do empresário Carlos Wizard à CPI da Covid no Senado.

Próximo ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, Wizard havia sido convocado inicialmente para depor em 17 de junho, mas faltou à sessão, o que fez a CPI requisitar à Justiça Federal a apreensão de seu passaporte - medida tomada pela Polícia Federal do Aeroporto de Viracopos (Campinas, SP) nesta segunda-feira (28/6).

O Supremo Tribunal Federal chegou a autorizar a condução coercitiva de Wizard, e senadores cogitaram pedir ajuda à Interpol (polícia internacional) para localizar o empresário, até que a defesa dele confirmasse sua presença na CPI nesta quarta.

Pelo Instagram, Wizard afirmou ter desembarcado no Brasil nesta segunda, vindo dos EUA, onde estava desde março. Ele disse que estava visitando seus pais e sua filha, por ela estar prestes a dar à luz.

"Logo mais sigo a Brasília, onde farei meu depoimento na quarta-feira. Agradeço à manifestação de apoio e carinho dos amigos. Estou com a consciência em paz", escreveu.

'Brasil forrado de cloroquina'

Wizard é apontado por oposicionistas como um dos principais integrantes do chamado "ministério paralelo", como são chamadas as suspeitas em torno de um aconselhamento extraoficial ao presidente Jair Bolsonaro centrado, sobretudo, na aposta em tratamentos comprovadamente ineficazes contra a covid-19.

"Logo, logo você vai ver que o Brasil vai ser forrado de medicamentos da fase inicial do tratamento, cloroquina, hidroxicloroquina", disse Carlos Wizard em uma live da revista Istoé Dinheiro realizada em maio, pouco depois de Pazuello assumir como ministro interino da Saúde.

Embora seja constantemente defendida pelo presidente Bolsonaro, a cloroquina demonstrou não ter eficácia contra a covid-19, além de potencialmente gerar efeitos colaterais sérios e dar uma falsa sensação de proteção contra o coronavírus.

Na mesma live, Wizard mostrou que estava ao lado de Pazuello naquele momento. Sem nunca ter ocupado formalmente nenhum cargo no governo - ele chegou a ser convidado a assumir uma secretaria, mas recusou -, o empresário disse ter recebido do general "a missão de acompanhar os grandes contratos, porque você sabe que o orçamento do Ministério da Saúde é um dos maiores da nação, R$ 150 bilhões".

Pazuello havia lhe pedido, disse ele, "confiando na minha habilidade negocial, que eu participasse desse comitê que analisa esses contratos".

Compra de vacinas

Tanto o "gabinete paralelo" quanto os contratos de fornecimento de medicamentos e vacinas estão na mira da CPI, principalmente depois do depoimento, na última sexta-feira (25/6), do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda e de seu irmão, o deputado federal Luis Claudio Miranda (DEM-DF).

Os dois relataram ter encontrado indícios de supostas irregularidades no contrato bilionário para a compra da vacina indiana Covaxin - e disseram ter levado essas suspeitas diretamente a Jair Bolsonaro. Segundo os irmãos, Bolsonaro disse que "isso (o esquema) é coisa do" deputado federal Ricardo Barros (PP-PR).

Na sexta-feira (26/6), Bolsonaro afirmou que a Polícia Federal iria abrir um inquérito sobre o caso, e Ricardo Barros negou envolvimento com irregularidades.

Além da Covaxin, a CPI também pretende avançar sobre as negociações envolvendo a vacina chinesa Convidencia, intermediada por uma empresa de Maringá que teria proximidade com Ricardo Barros.

Em relação a Carlos Wizard, a investigação da comissão deve centrar em torno de se ele ou Luciano Hang teriam participado da intermediação dessas negociações.

Wizard também encampou uma campanha em defesa da compra de vacinas por parte da iniciativa privada, e não apenas pelo Sistema Único de Saúde.

Em março, ele e o empresário bolsonarista Luciano Hang se reuniram com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para pleitear esse tipo de aquisição.

"A iniciativa privada tem mais velocidade de conseguir vacinas", disse Hang na ocasião.

Em depoimento à CPI em 9 de junho, o ex-secretário-geral do Ministério da Saúde Élcio Franco confirmou que se reuniu com a dupla de empresários para discutir a ideia de comprar vacinas para funcionários de empresas.

Imunologistas argumentam, porém, que a descentralização da aquisição de vacinas e a compra por parte da iniciativa privada fariam com que pessoas mais pobres e mais vulneráveis ao vírus acabassem ficando para trás na fila da imunização, aumentando a desigualdade na proteção contra o coronavírus. Além disso, a escassez de vacinas no mercado mundial tem inviabilizado compras por parte da iniciativa privada.

No momento, Carlos Wizard é uma das 14 pessoas tratadas pela CPI como investigadas, e não mais apenas como testemunhas.

Ele teve seu sigilo bancário, fiscal, telemático e telefônico quebrado a pedido da comissão, juntamente com outros empresários que tiveram ou têm tratativas com o Ministério da Saúde.

Quando foi convocado pela CPI, Wizard solicitou inicialmente que seu depoimento fosse por videoconferência, pedido que não foi aceito. Ele também obteve habeas corpus no Supremo Tribunal Federal para abster-se de responder a perguntas que o pudessem incriminar, mas mesmo assim não compareceu à sessão do dia 17 de junho.

Aconselhamento ao Ministério da Saúde

Sobre o aconselhamento extraoficial no gerenciamento da pandemia, em entrevista à TV Brasil, Carlos Wizard havia declarado que passou um mês em Brasília "atuando como conselheiro do ministério", período em que disse ter tido a oportunidade de conhecer médicos - como Nise Yamaguchi, também investigada pela CPI - que teriam formado um "conselho de voluntários" ao governo federal.

Questionado a respeito disso em seu depoimento, Eduardo Pazuello confirmou seu laço de amizade com Wizard e afirmou tê-lo convidado a assumir uma secretaria em seu ministério, mas negou ter recebido aconselhamento por parte dos médicos.

"Ele (Wizard) por si só propôs reunir médicos aconselhadores. Confesso que não aceitei, não gostei da dinâmica da conversa e foi uma vez só, por 15 minutos, e nunca mais. (...) Não aceitei o formato de aconselhamento que ele tinha pensado".

Senadores governistas têm defendido o direito de Bolsonaro de consultar pessoas de fora do ministério.

"Não é ilegal ou impróprio ele (Bolsonaro) se aconselhar com pessoas que não façam parte da administração pública, isso não é proibido. O que tem de exagerado é dizer que existia esse gabinete paralelo, como se fosse uma coisa se sobrepondo ao Ministério da Saúde. Isso nunca existiu, é uma teoria conspiratória", disse à BBC News Brasil em maio o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado e suplente na CPI.

Oposicionistas ressaltam, porém, que é desse aconselhamento que parecem ter saído estratégias duramente criticadas, como a defesa de medicamentos não indicados por nenhuma agência sanitária para a covid-19.

"(É preciso) esclarecer os detalhes de um 'ministério paralelo da saúde', responsável pelo aconselhamento extraoficial do governo federal com relação às medidas de enfrentamento da pandemia, incluindo a sugestão de utilização de medicamentos sem eficácia comprovada e o apoio a teorias como a da imunidade de rebanho", disse à Agência Senado o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), autor do requerimento de convocação de Wizard.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.