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O dispositivo que pode estar por trás da misteriosa 'Síndrome de Havana'

A síndrome de Havana foi relatada pela primeira vez entre funcionários diplomáticos dos EUA em Cuba - Getty Images
A síndrome de Havana foi relatada pela primeira vez entre funcionários diplomáticos dos EUA em Cuba Imagem: Getty Images

Gordon Corera - Repórter de Segurança da BBC News

03/02/2022 14h48

Um novo relatório de inteligência fornece outra reviravolta no mistério sobre doença que tem acometido funcionários dos EUA em embaixadas.

Um dispositivo de energia direcionada pode fornecer uma explicação plausível para o surgimento de uma misteriosa doença apelidada de "Síndrome de Havana", segundo um novo relatório da comunidade de inteligência dos Estados Unidos.

Até agora ainda não se sabe dizer se os sintomas que afetam os funcionários dos EUA em embaixadas ao redor do mundo foram causados por algum tipo de dispositivo ou se são de natureza psicológica.

O mais recente relatório de um painel de especialistas da comunidade de inteligência dos EUA diz que os sintomas são "genuínos e convincentes" e podem, em alguns casos, ter sido causados por um dispositivo oculto.

Mas o painel não analisa quem pode ser o responsável por acioná-lo.

Em 2016, em Havana, capital de Cuba, oficiais de inteligência e diplomatas dos EUA começaram a reclamar de uma série de sintomas incomuns. No início, as reivindicações foram amplamente rejeitadas dentro do governo.

Mas no ano passado, esses sintomas passaram a ser levados mais a sério. Isso levou a uma enxurrada de relatos de casos, totalizando pelo menos mil em todo o mundo.

Um estudo de janeiro da CIA não encontrou evidências de uma ação específica de algum Estado estrangeiro e afirmou que muitos casos podem ser explicados por causas naturais ou estresse. No entanto, o estudo da CIA reconheceu que um pequeno número, estimado em cerca de duas dúzias, segue sem explicação.

Este novo estudo examinou mais de mil documentos confidenciais e entrevistou testemunhas para se concentrar em um grupo de pessoas que sofrem de um determinado conjunto de sintomas (as autoridades não divulgaram o número exato).

Eles concluíram que esse subconjunto de casos não pode ser explicado por condições ambientais ou médicas e pode ter sido causado por algum tipo de fonte ou dispositivo externo. "Aprendemos muito [sobre os sintomas]", disse um oficial de inteligência que teve contato com o estudo.

O painel da CIA encontrou quatro "características centrais" ou sintomas ? incluindo o início súbito de som ou pressão em um ouvido ou em um lado da cabeça; vertigem, perda de equilíbrio e dor de ouvido e um "forte senso de localização ou direcionalidade" sem outras explicações.

Foram examinadas cinco causas potenciais: sinais acústicos, agentes químicos e biológicos, radiação ionizante, fatores naturais e ambientais, radiofrequência e outras energias eletromagnéticas. Se analisou se algum tipo de dispositivo oculto seria capaz de criar os sintomas relatados.

O painel descobriu que fatores psicológicos ou sociais não poderiam explicar os sintomas, embora pudessem ter agravado alguns dos problemas para as pessoas afetadas. O estudo também descobriu que os sintomas não podiam ser explicados por condições ambientais ou médicas.

"Vários aspectos desta síndrome neurossensorial única tornam improvável que seja causada por um distúrbio neurológico funcional", disse o painel. Isso apontava para um "estímulo externo" ou fonte, na visão do painel.

O estudo descobriu que a energia eletromagnética pulsada, particularmente na faixa de radiofrequência, "explica de forma plausível" as características centrais, embora diga que ainda existem lacunas nas informações.

O painel afirma que antenas não padronizadas podem gerar efeitos no corpo humano. Tal fonte pode ser ocultada e requer apenas energia moderada. Também poderia viajar pelo ar e através das paredes dos edifícios.

Um documentário da BBC em 2021 analisou o papel potencial de um dispositivo de energia pulsada e direcionada ou de microondas na causa dos sintomas da Síndrome de Havana.

Não há detalhes do que poderia ser esse tal dispositivo, nem se a intenção era de causar danos ou realizar algum tipo de espionagem. O painel não analisou quem poderia estar por trás dessa atividade.

Várias pessoas dentro do governo dos EUA acreditam que a Rússia pode ser responsável e a questão foi levantada em reuniões, embora nenhuma evidência conclusiva tenha sido descoberta.

Outra explicação plausível para os sintomas, diz o painel, é algum tipo de ultra-som. Nesse caso, seria necessário que a fonte de emissão estivesse perto do alvo.

O painel fez uma série de recomendações, incluindo a coleta de dados mais padronizados. No entanto, parte das conclusões são confidenciais.

Em uma declaração conjunta, dois dos mais altos funcionários da comunidade de inteligência dos EUA prometeram continuar a investigar o caso, enquanto o governo trata os afetados.

"Vamos continuar com rigor, pelo tempo que for necessário", disseram o diretor de inteligência nacional dos EUA, Avril D Haines, e o diretor da CIA, William J Burns.

Um porta-voz da Casa Branca disse à BBC que as conclusões do relatório são bem-vindas.

Quão importante é este novo relatório?

Esta é mais uma reviravolta no mistério da Síndrome de Havana.

O debate sobre as causas tem sido acirrado e polêmico. O estudo da CIA do mês passado levou muitos a concluir que talvez houvesse menos sinais de qualquer atividade hostil e que as causas fossem condições médicas ou psicológicas.

Isso ainda pode ser verdade na grande maioria dos casos.

Mas o mais recente painel volta a sugerir a possibilidade de algum tipo de atividade maliciosa, ao afirmar que, pelo menos em um subconjunto específico de casos, energia pulsada ou microondas seriam causas plausíveis.