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STF condena Daniel Silveira a 8 anos de prisão: entenda o que acontece agora

Deputado federal Daniel Silveira - Reuters
Deputado federal Daniel Silveira Imagem: Reuters

Leandro Prazeres - Da BBC News Brasil em Brasília

20/04/2022 21h23

Parlamentar era acusado de ameaçar o Supremo de fazer ataques a integrantes da Corte.

O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou nesta quarta-feira (20/4) o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) pelos crimes de tentativa de impedir o livre exercício dos poderes e coação em processo judicial. Ele foi condenado a oito anos e nove meses de reclusão, inicialmente, em regime fechado, à perda do mandato de deputado federal à suspensão dos seus direitos políticos. Ao todo, 10 dos 11 ministros votaram pela condenação do parlamentar. Apesar da condenação, especialistas ouvidos pela BBC News Brasil afirmam que Daniel Silveira não será preso e nem perderá o mandato automaticamente porque ainda cabe recurso da decisão.

Daniel Silveira era acusado pela Procuradoria Geral da República (PGR) pelos crimes de coação (uso de força) no curso de um processo judicial, incitação à animosidade entre as Forças Armadas e o STF e por tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes da União. Os crimes, segundo a denúncia, aconteceram entre 2020 e 2021 quando ele divulgou vídeos em redes sociais atacando o STF, defendendo uma intervenção militar e ofendendo pessoalmente membros da Corte.

De todos os ministros, apenas Nunes Marques, um dos indicados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), votou pela absolvição integral do deputado. Ele criticou as declarações de Silveira, mas considerou que elas se tratavam de "bravatas que, de tão absurdas, jamais seriam concretizadas".

Consequências políticas

De acordo com o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Henrique Neves, por conta da condenação, Daniel Silveira está automaticamente inelegível e, em tese, não poderá disputar as eleições deste ano, na qual ele pretendia concorrer ao cargo de senador pelo Rio de Janeiro amparado pela base bolsonarista que o elegeu em 2018.

"A inelegibilidade decorrente da condenação criminal nasce com a publicação do acórdão (decisão) condenatório, independente de recurso. Ela só será suspensa se o condenado conseguir uma liminar para conceder efeito suspensivo", explicou.

O advogado Raul Abramo, especialista em direito penal, diz que ainda Silveira ainda não será preso e nem perderá o mandato porque, apesar da condenação, sua defesa ainda pode impetrar recursos junto ao STF.

"A defesa pode recorrer e por isso ele não deverá ser preso, ainda. O mais provável é que a defesa ingresse com embargos de declaração, que é um recurso quando se entende que há algum ponto da decisão que não ficou claro ou quando a defesa acha que os ministros deixaram de prestar atenção a algum ponto relevante", diz o advogado.

Raul afirma que, se houver recursos e a condenação for mantida, o STF deverá comunicar a decisão à Câmara dos Deputados para que seja efetivada a perda do mandato. Da mesma forma, após o fim dessa fase, Daniel Silveira deverá ser recolhido a uma unidade prisional onde vai iniciar o cumprimento de sua pena.

União e surpresa

O julgamento de Daniel Silveira começou com uma hora e meia de atraso porque o advogado do deputado, Paulo César Rodrigues de Faria, se recusou, inicialmente, a realizar um teste para detecção de Covid-19, obrigatório para fazer a defesa nas dependências do STF. Após o impasse e diante da possibilidade de ter de defender o réu por videoconferência, o advogado fez o exame, que deu negativo.

Em seus votos, a maioria dos ministros mostrou unidade nas críticas às atitudes de Daniel Silveira. Sua defesa pediu a absolvição do parlamentar e argumentou que seus ataques ao STF e aos ministros estavam abrigadas pelo direito à liberdade de expressão e pela imunidade parlamentar garantida na Constituição Federal.

Além disso, a defesa do parlamentar afirmou que os eventuais excessos cometidos por Daniel Silveira deveriam ser julgados politicamente, pela Câmara dos Deputados, e não na esfera criminal, pelo STF.

"Se ocorreram excessos, a Câmara dos Deputados é o caminho para resolver... com as punições, a cassação, a suspensão (de mandato) e não utilizar instrumentos jurídicos para fazer as vezes da Câmara dos Deputados", afirmou o advogado.

Os 10 ministros que condenaram Silveira, porém, divergiram da defesa. Segundo eles, Silveira extrapolou tanto a imunidade parlamentar quando o seu direito à liberdade de expressão.

"Quem pensa que isso possa ter sido exercício legítimo da liberdade de expressão deveria separar os vídeos e juntar a família na sala... os avós, os pais e os filhos e passar os vídeos [...] em seguida, dizer aos seus filhos: 'Esse é o país que nós queremos. Esse é o padrão moral que nós desejamos para o Brasil. Nós consideramos isso normal'", disse o ministro Luís Roberto Barroso.

Um dos momentos de surpresa do julgamento foi o voto do ministro André Mendonça, que assim como Nunes Marques, foi indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), de quem Silveira é aliado. Havia rumores de que ele poderia pedir vistas do processo para poupar o deputado de uma condenação dada como certa e dar a ele a chance de disputar as eleições deste ano.

André Mendonça, porém, votou pela condenação de Daniel Silveira, mas apenas pelo crime de coação e a uma pena mais branda, de dois anos e quatro meses de prisão em regime aberto. Apesar de defender uma pena menor, Mendonça criticou as ações do parlamentar.

"Não se pode ter como abarcada na atividade parlamentar a exortação de que o Supremo seja invadido e um dos seus ministros agredido e jogado numa lixeira. Não há como afirmar que isso esteja relacionado às atividades do poder legislativo", afirmou.

Quem é Daniel Silveira?

Até 2018, Daniel Lúcio Silveira era apenas policial militar do Rio de Janeiro com um histórico de faltas disciplinares. A partir daquele ano, porém, ele passou a fazer parte do grupo de militantes adeptos do bolsonarismo que dominou o ambiente político naquelas eleições.

Silveira ganhou notoriedade no período eleitoral quando participou de uma manifestação no Rio e quebrou uma placa com o nome da vereadora Marielle Franco, assassinada em março daquele ano. Foi eleito com 31 mil votos como deputado federal pelo PSL, mesmo partido ao qual Bolsonaro estava filiado.

Depois de eleito, Silveira continuou sua vinculação com o grupo bolsonarista no Congresso Nacional, apoiando pautas caras ao movimento como a flexibilização do porte de armas.

Em 2020, em meio ao aumento das tensões entre o presidente Jair Bolsonaro e o Poder Judiciário, o deputado passou a ser investigado pelo STF e pela Procuradoria-Geral da República nos inquéritos que apuravam a realização de ataques ao tribunal e a disseminação de informações falsas.

Em fevereiro de 2021, já sob investigação, ele foi preso por ordem do relator do caso, o ministro Alexandre de Moraes.

A prisão aconteceu depois que Silveira divulgou vídeos defendendo o Ato Institucional Nº 5 (AI-5) e a destituição de ministros do Supremo. O AI-5 foi o ato mais severo da ditadura militar no Brasil (1964 a 1985), que suspendeu liberdades individuais e decretou o recesso do Congresso Nacional.

No vídeo, ele atacou cinco ministros do tribunal: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Ele chamou Fachin de "moleque" e "menino mimado" e Alexandre de Moraes de "idiota".

Em novembro de 2021, ele foi solto e passou a responder ao processo em liberdade. Ele foi denunciado pela PGR e é réu por coação no curso de processo, incitação à animosidade entre Forças Armadas e o Supremo e tentativa de impedir o exercício de Poderes da União. Coação é quando há o uso de ameaça ou violência contra alguma parte de um processo judicial.

Mesmo após a prisão, ele continuou a questionar decisões do STF e chegou a se recusar a cumprir uma ordem de Alexandre de Moraes para que usasse tornozeleira eletrônica.

Em meio ao impasse, ele chegou a se refugiar dentro do Plenário da Câmara dos Deputados para impedir que policiais federais pudessem cumprir a determinação do ministro. Isso aconteceu porque, por lei, a PF não pode entrar no Plenário sem autorização da própria Câmara.

O imbróglio foi resolvido no dia seguinte, quando Silveira recuou e aceitou usar o dispositivo.

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