Este ano é meu
da BBC, em Londres
Há mais de 50 anos que sou leitor da revista Time. Assinava no Brasil, assino aqui. Sai mais barato essa revista que já foi bem, mas bem melhor mesmo. Antes que o mundo inteiro passasse a notícia de não mais que 33 linhas.
A Time que comecei a ler lá pelos anos 50 tinha um excelente crítico do cinema, Brad Darrach, que era debochado e desconhecia o que fosse um “filme de autor” ou “noir”.
Ele gostava de, em primeiro lugar, cinema, depois de fazer graça e jogo de palavras. Entre os meus amigos que liam inglês e francês, o Time era leitura imprescindível.
Havia uns mais metidos a besta, creio que acreditando liberais beirando o sempre em moda e nunca definido socialismo, os que, dizia eu, preferiam o Newsweek, mas este, bolas! não se encontrava em todas as bancas.
Com a guerra-fria, ou quente mesmo, comendo solta na Coréia, dava apesar de tudo para a gente ler e se sentir bem informado e torcer para os americanos quebrarem a cara.
Claro, eles não eram donos do mundo? Então? Essa a impressão que ficou. E impressão é a única coisa que conta na vida.
Um dia ainda vou dar uma conferida na coleção encadernada que comprei num sebo da rua São José, no Rio, por apenas 180 cruzeiros e que cobria (e cobre, está lá em casa) os anos de 1944 a l956.
Gente grande e pequena
Foi a revista Time que instituiu essa história de “Homem do Ano”, tão popular hoje nos mais diversos e inesperados setores, feito o “Treco do Ano”, digamos.
A Time se inspirou naquela noção apregoada pelo filósofo escocês Thomas Carlyle, que escreveu que “a história do mundo não é mais que a biografia dos grandes”.
Todo fim do ano, a revista nascida em 1923 escolhia o “Homem do Ano”, ou seja, alguém cuja existência ajudara a melhor entender o que se passara, e como e porquê, nos últimos 365 anos.
Nem é preciso ter coleção encadernada para adivinhar que já foram “homens do ano” Winston Churchill (mais de uma vez), Albert Einstein, Roosevelt e Stálin.
O critério não era apenas quem mais fizera pelo resto da humanidade no ano prestes a se encerrar. Valia também quem menos fizera, quem mais mal fizera, quem – enfim – mais quase não deixa o ano acabar.
Que o digam os anos em que Hitler (1938) e o aiatolá Khomeini (1979) enfeitaram a capa da revista dentro do critério de Carlyle. Houve também anos de inovação: o ano em que o homem do ano foi a “gente do ano”, como em 1956, com os “freedom fighters” húngaros, ou o ano dos “cientistas americanos”, em 1960.
Um detalhe importante: o primeiro “homem do ano” a ser mulher foi a sra. Wallis Simpsons, em 1936, ano em que quase vem abaixo o império britânico devido aos amores de Eduardo VIII.
A mulher americana foi a – digamos assim – “turma do ano”, em 1975 e até hoje ninguém entendeu direito porquê, a não ser a alta cúpula da publicação. Muita coisa na revista “Time” não era entendida direito, ou então, mais chato, por demais de bem entendida.
Objetivando
Este ano, como já devem saber, você e eu fomos eleitos pelos distintos da redação da revista como a gente boa do ano.
Cortesia do mundo virtual da internet, com seus blogues, vídeos e redes sociais.
Quer dizer, aquele pessoal fazendo graça no YouTube (gatinho derrapando na neve, ex- do Ronaldo Gordo curtindo uma, ou numa, praia), a marotíssima Wikipédia, tudo isso e o MySpace, onde os suspeitos de assassinatos múltiplos na Inglaterra, deixam seus dados e preferências, passou a ser “você”, virou sinônimo de “mim”, do boneco aqui.
No texto que justifica a escolha, ninguém falou em googlar o teorema de Fermat, pesquisar livros e autores, catar poemas, baixar música barroca ou tão simplesmente jogar pôquer com desconhecidos dos quatro cantos do mundo.
Nada disso. Simplesmente, “você”, “eu”, “nós” YouTubando. Não gostei da intimidade. De me ver na capa num papel prateado fingindo de espelho.
Eles repetindo, “Sim, você mesmo.” Me ameaçando, “Bem-vindo a seu mundo.”
Ficarei no meu mundo que é zarpar nas águas mornas de meu por vezes infiel computador, mas me recuso a ser capa de revista americana, só para eles fazerem gênero.
Prefiro as gracinhas de Brad Darrach e seus trocadilhos com “Bem Hur” e eu apenas leitor e não participante. Como dizem e fazem os mal-humorados, cancelem minha assinatura. Newsweek, lá vou eu.
A Time que comecei a ler lá pelos anos 50 tinha um excelente crítico do cinema, Brad Darrach, que era debochado e desconhecia o que fosse um “filme de autor” ou “noir”.
Ele gostava de, em primeiro lugar, cinema, depois de fazer graça e jogo de palavras. Entre os meus amigos que liam inglês e francês, o Time era leitura imprescindível.
Havia uns mais metidos a besta, creio que acreditando liberais beirando o sempre em moda e nunca definido socialismo, os que, dizia eu, preferiam o Newsweek, mas este, bolas! não se encontrava em todas as bancas.
Com a guerra-fria, ou quente mesmo, comendo solta na Coréia, dava apesar de tudo para a gente ler e se sentir bem informado e torcer para os americanos quebrarem a cara.
Claro, eles não eram donos do mundo? Então? Essa a impressão que ficou. E impressão é a única coisa que conta na vida.
Um dia ainda vou dar uma conferida na coleção encadernada que comprei num sebo da rua São José, no Rio, por apenas 180 cruzeiros e que cobria (e cobre, está lá em casa) os anos de 1944 a l956.
Gente grande e pequena
Foi a revista Time que instituiu essa história de “Homem do Ano”, tão popular hoje nos mais diversos e inesperados setores, feito o “Treco do Ano”, digamos.
A Time se inspirou naquela noção apregoada pelo filósofo escocês Thomas Carlyle, que escreveu que “a história do mundo não é mais que a biografia dos grandes”.
Todo fim do ano, a revista nascida em 1923 escolhia o “Homem do Ano”, ou seja, alguém cuja existência ajudara a melhor entender o que se passara, e como e porquê, nos últimos 365 anos.
Nem é preciso ter coleção encadernada para adivinhar que já foram “homens do ano” Winston Churchill (mais de uma vez), Albert Einstein, Roosevelt e Stálin.
O critério não era apenas quem mais fizera pelo resto da humanidade no ano prestes a se encerrar. Valia também quem menos fizera, quem mais mal fizera, quem – enfim – mais quase não deixa o ano acabar.
Que o digam os anos em que Hitler (1938) e o aiatolá Khomeini (1979) enfeitaram a capa da revista dentro do critério de Carlyle. Houve também anos de inovação: o ano em que o homem do ano foi a “gente do ano”, como em 1956, com os “freedom fighters” húngaros, ou o ano dos “cientistas americanos”, em 1960.
Um detalhe importante: o primeiro “homem do ano” a ser mulher foi a sra. Wallis Simpsons, em 1936, ano em que quase vem abaixo o império britânico devido aos amores de Eduardo VIII.
A mulher americana foi a – digamos assim – “turma do ano”, em 1975 e até hoje ninguém entendeu direito porquê, a não ser a alta cúpula da publicação. Muita coisa na revista “Time” não era entendida direito, ou então, mais chato, por demais de bem entendida.
Objetivando
Este ano, como já devem saber, você e eu fomos eleitos pelos distintos da redação da revista como a gente boa do ano.
Cortesia do mundo virtual da internet, com seus blogues, vídeos e redes sociais.
Quer dizer, aquele pessoal fazendo graça no YouTube (gatinho derrapando na neve, ex- do Ronaldo Gordo curtindo uma, ou numa, praia), a marotíssima Wikipédia, tudo isso e o MySpace, onde os suspeitos de assassinatos múltiplos na Inglaterra, deixam seus dados e preferências, passou a ser “você”, virou sinônimo de “mim”, do boneco aqui.
No texto que justifica a escolha, ninguém falou em googlar o teorema de Fermat, pesquisar livros e autores, catar poemas, baixar música barroca ou tão simplesmente jogar pôquer com desconhecidos dos quatro cantos do mundo.
Nada disso. Simplesmente, “você”, “eu”, “nós” YouTubando. Não gostei da intimidade. De me ver na capa num papel prateado fingindo de espelho.
Eles repetindo, “Sim, você mesmo.” Me ameaçando, “Bem-vindo a seu mundo.”
Ficarei no meu mundo que é zarpar nas águas mornas de meu por vezes infiel computador, mas me recuso a ser capa de revista americana, só para eles fazerem gênero.
Prefiro as gracinhas de Brad Darrach e seus trocadilhos com “Bem Hur” e eu apenas leitor e não participante. Como dizem e fazem os mal-humorados, cancelem minha assinatura. Newsweek, lá vou eu.