Igreja Católica denuncia que a Argentina está "doente de violência"
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Dmitry Neymyrok/Reuters
Ambulância transporta a ex-premiê ucraniana Yulia Tymoshenko até hospital em Kharkiv, na Ucrânia
Sob o título "Felizes os que trabalham pela paz", o documento elaborado pela Conferência Episcopal argentina não poupa críticas aos diferentes atores relacionados com a luta contra a violência e a insegurança.
Os bispos condenam em termos contundentes a política carcerária, a lentidão da Justiça e rejeitam os linchamentos públicos.
A declaração coincide com uma polêmica política sobre o mal-estar social provocado pela violência, as responsabilidades das distintas administrações no aumento da delinquência e o papel das forças de segurança no combate ao crime organizado.
Segundo a Conferência Episcopal, "os fatos delitivos não somente aumentaram em quantidade, mas também em agressividade" na Argentina.
Os bispos denunciam que "a lentidão da Justiça deteriora a confiança dos cidadãos em sua eficácia", mas são taxativos em sua rejeição aos linchamentos públicos, como os ocorridos há semanas em diferentes pontos do país.
Apesar da violência e da insegurança gerarem "indignação" entre a população, "de nenhuma maneira justificam respostas de vingança ou da erroneamente chamada 'justiça por conta própria'", adverte o documento.
"A corrupção, tanto pública como privada, é um verdadeiro 'câncer social', causador de injustiça e morte", sustenta a declaração, que retoma um termo utilizado pelo papa Francisco para referir-se ao problema.
"Estes delitos habitualmente prescrevem ou sua perseguição penal é abandonada, garantindo e afiançando a impunidade. São fraudes econômicas e morais que corroem a confiança do povo nas instituições da República e assentam as bases de um estilo de vida caracterizado pela falta de respeito à lei", ressalta.
Os bispos criticam, além disso, a política carcerária: "A prisão gera na sociedade a falsa ilusão de trancar o mal, mas oferece poucos resultados".
"É motivo de dor e preocupação que quase a metade dos presos não tenha sentença. A maioria deles são jovens pobres e sem possibilidades para contratar advogados que defendam suas causas", acrescentam.
A Conferência Episcopal considera que "é urgente na Argentina recuperar o compromisso com a verdade, em todas suas dimensões. Sem esse passo, estamos condenados ao desencontro e a uma falsa aparência de diálogo".
"O modelo para sair de situações de violência é o cânone da escola, da família, do trabalho mesmo, e, na medida que consigamos fortalecer estas instituições, vamos criar uma sociedade mais pacífica, mais justa e com mais segurança", resumiu o bispo Jorge Lozano, presidente da Comissão Episcopal, em entrevista à rede de televisão "TN".
Segundo sua opinião, "não se deve concentrar-se na foto do delito, mas no filme completo, ter uma visão mais ampla para enfrentar o problema".
Pouco antes da divulgação do documento, o chefe de Gabinete do governo argentino, Jorge Capitanich, denunciou a existência de uma "campanha deliberada" para responsabilizar o Executivo pela insegurança e pediu ao Poder Judiciário uma maior "eficácia" para castigar os crimes.
Segundo Capitanich, "de nada vale o esforço unilateral ou individual de um poder do Estado, se os outros poderes do Estado somente falam".
Capitanich pediu aos juízes "rapidez, eficácia e confiabilidade" na hora de investigar e castigar os delinquentes para que o trabalho das forças de segurança não fique "incompleto".
Na província de Buenos Aires, a maior do país e a mais castigada pela delinquência - com 82 crimes por hora segundo estimativas oficiais -, o governador Daniel Scioli, candidato a suceder Cristina Kirchner na Casa Rosada, transformou a luta contra a insegurança em um dos pilares de sua gestão.
Scioli declarou um "estado de emergência" durante um ano que inclui um aumento da dotação material e dos recursos humanos destinados a "encurralar o crime".