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Custando até US$ 100, testes de covid-19 são luxo para poucos na Venezuela

Salário mínimo mensal na Venezuela é de 7 bolívares, o equivalente a US$ 1,5 (cerca de R$ 8,50) - Cristian Hernandez/AFP
Salário mínimo mensal na Venezuela é de 7 bolívares, o equivalente a US$ 1,5 (cerca de R$ 8,50) Imagem: Cristian Hernandez/AFP

28/01/2022 20h47Atualizada em 28/01/2022 21h28

Um paciente com sintomas de covid-19 na Venezuela precisa ter de US$ 40 a US$ 100 para pagar um exame para determinar se contraiu a doença ou, caso contrário, fazer uma peregrinação pelos centros públicos procurando um improvável teste gratuito ou finalmente optar pelo autodiagnóstico.

Os testes de diagnóstico direto, seja o RT-PCR ou de antígeno, são a melhor forma de corroborar a presença do vírus SARS-CoV-2 no corpo, mas vários especialistas manifestaram preocupação com as dificuldades que os venezuelanos estão enfrentando para ter acesso a esses exames.

E não é para menos: o salário mínimo mensal venezuelano é de 7 bolívares, o que equivale a US$ 1,5, quantia com a qual nenhum cidadão pode pagar os custos de um teste de covid-19 e, muito menos, o tratamento para aliviar os sintomas da doença.

O presidente da Sociedade Venezuelana de Doenças Infecciosas, Manuel Figuera, está ciente dessa dificuldade e declarou à Agência Efe que o Estado deve garantir esses testes gratuitos, "algo que, infelizmente, não fez", deixando os cidadãos indefesos contra a pandemia.

Sem testes, nem registro

Figuera disse que atualmente os pacientes com sintomas de covid-19 devem percorrer diferentes Centros de Diagnóstico Integral (CDI), hospitais públicos e escritórios da Previdência Social para encontrar um local onde seja realizado o teste de covid-19, já que os exames não estão disponíveis de maneira regular nesses centros.

"Antigamente, até em centros privados faziam exames desse tipo, mas deixaram de fazer há muito tempo. Hoje em dia, infelizmente, as pessoas têm principalmente exames particulares que, do ponto de vista epidemiológico-estatístico, não são incluídos nas estatísticas nacionais", destacou o também infectologista.

Dessa forma, o especialista somou o problema da subnotificação de casos positivos à limitação do acesso aos testes para descartar a covid-19.

Nesse caso, Figuera se referiu ao surgimento de novos laboratórios que funcionam em escritórios comerciais, hotéis e até estacionamentos e oferecem o teste de covid-19 sem que os dados de casos positivos sejam enviados às instâncias do Executivo Nacional, que ignora esses resultados em sua contagem oficial.

Essa é uma das razões pelas quais, nos últimos dias, a Sociedade Venezuelana de Doenças Infecciosas recomendou a ampliação da disponibilidade de testes diretos gratuitos para detectar a covid-19.

Nesse sentido, os médicos emitiram um comunicado no qual destacaram a importância de "ampliar a disponibilidade gratuita de testes" para detecção de covid-19, "para que pessoas sintomáticas e seus contatos possam ser isolados em tempo hábil em caso de positividade", já que a falta de diagnóstico também influencia a propagação do vírus.

"O mais importante é que a pessoa que apresente sintomas desde o primeiro dia seja testada e não espere, porque, se um caso positivo for detectado desde o primeiro dia e for isolado, você evitará mais infecções", explicou Figuera.

Sem opção

Andrea González, jornalista venezuelana de 27 anos, vivenciou a jornada de contrair a covid-19 e não conseguir arcar com as despesas causadas pelo vírus.

Os sintomas apareceram nos primeiros dias de 2022, quando a situação econômica de González não era boa. Ela tinha apenas US$ 100 quando ela e seu parceiro ficaram doentes e tiveram que escolher entre comprar remédios, comida e itens pessoais ou pagar por exames para confirmar que tinham covid-19.

"O mais difícil foi fazer o teste, porque eu tinha condições, mas nem todo mundo pode pagar US$ 25 por um teste. Agora imagine pagar US$ 100 por um teste molecular, porque eu fiz o rápido e ele não é 100% confiável", relatou à Efe.

Nos laboratórios mais conhecidos de Caracas, um teste de PCR custa US$ 80 para adultos e US$ 100 para crianças menores de 12 anos. Quanto aos testes de antígeno, o custo é de US$ 40 para adultos e US$ 60 para menores de 12 anos.

Todos os custos nos laboratórios são expressos em moeda americana e os cidadãos podem pagar em moeda estrangeira ou em bolívares, de acordo com a taxa de câmbio.

Dessa forma, os venezuelanos que nem conseguem pagar pelo menos caro dos testes são obrigados a presumir que estão doentes, manter alguns dias de quarentena e torcer para que a covid-19 deixe seu corpo como veio, sem deixar rastros.