Câmbio e falta de fornecedor local ameaçam atrasar usinas solares no Brasil
Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - A alta do dólar e a falta de fornecedores locais de equipamentos têm dificultado projetos de usinas solares que venderam energia no primeiro leilão promovido pelo governo federal para viabilizar investimentos nessa fonte no país, o que poderá adiar ou inviabilizar parte dos empreendimentos, afirmaram à Reuters especialistas do setor.
Realizado em outubro de 2014, o certame voltado à contratação de energia solar atraiu forte interesse dos investidores e fechou contratos com 31 usinas que somam quase 900 megawatts em capacidade instalada, para entrega de energia em 2017. Os projetos tiveram na época investimentos estimados em 7 bilhões de reais.
Porém os investidores atualmente encontram poucas opções de módulos fotovoltaicos montados localmente, uma exigência para obter os atrativos financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e ao mesmo tempo veem os preços dos equipamentos dispararem no mercado externo devido à desvalorização do real desde 2014, quando ocorreu a licitação.
"No dia do leilão (em outubro de 2014), o dólar estava cotado em 2,51 reais. Então, de fato, aquelas empresas que não fizeram um hedge, uma proteção contra a variação cambial, elas têm um desafio grande... isso impacta, sim, alguns dos projetos", afirmou à Reuters o presidente da Associação Brasileira de Energia Solar (Absolar), Rodrigo Sauaia.
Ele explicou, sem citar nomes, que os investidores têm buscado saídas como parceiros que possam apoiar os empreendimentos, outras fontes de financiamento ou negociações para alterar as condições contratuais.
O gerente do departamento de energias alternativas do BNDES Marcos Cardoso confirmou que há empresas com dificuldades.
"Eles estão pleiteando essa postergação (da operação da usina)... para empurrar um pouco o prazo do leilão de 2014, de forma que se equacione um pouco o câmbio, porque a tarifa foi definida lá atrás, com outro câmbio, isso pode afetar", disse.
Até o momento, o BNDES não recebeu pedidos de financiamento para esses projetos solares, até devido ao escasso cenário de fabricantes de painéis que atendam aos requisitos de conteúdo local.
Atualmente já existem fabricantes brasileiros credenciados pelo banco de fomento, mas voltados principalmente a instalações de menor porte, como placas solares em telhados.
NOVOS FABRICANTES LOCAIS
As geradoras por enquanto têm aguardado a chegada de fabricantes de maior porte e reconhecimento internacional para fechar as compras de equipamentos, de forma a garantir uma maior segurança para as usinas, que fecharam contratos para a venda da eletricidade para o governo por 20 anos.
"Temos tido muitas conversas com os vencedores (dos leilões), mas essa decisão (pedido de financiamento) de fato ainda está atrelada a essa decisão das grandes fabricantes", disse Cardoso.
As regras do BNDES exigem que ao pedir o financiamento o empreendedor apresente as características de seu projeto, o que inclui o fornecedor dos equipamentos e os custos.
O BNDES afirmou à Reuters mais cedo nesta semana que há três empresas interessadas em abrir fábricas no Brasil, com perspectivas de estarem em operação no segundo semestre do ano.
Mas Sauaia, da Absolar, afirmou que teve contato com os investidores e que estes têm pedido desonerações de impostos para viabilizar a entrada no país.
"Esses investimentos estão congelados, esperando uma solução para a questão de competitividade... sem a desoneração, eles iam basicamente fabricar um equipamento a um preço muito mais elevado que o mercado tem condições de pagar. E ninguém vai produzir se não tiver para quem vender", explicou.
A vantagem, segundo ele, é que os projetos solares são de rápida implementação, o que daria um prazo aproximadamente até o final do ano para que a questão seja equacionada.
"As empresas geralmente conseguem colocar em pé um projeto solar em mais ou menos seis meses, oito meses... o desafio está em atrair os fabricantes de modo que os projetos tenham tempo hábil, porque o processo de análise de crédito pelo BNDES demora um certo tempo", disse.
Ele, assim como o BNDES, não quis revelar o nome dos investidores interessados em montar as fábricas.
O leilão de 2014 representou a primeira contratação de energia solar em escala no Brasil, mas os projetos viabilizados, de quase 1 gigawatt, ainda são apenas um primeiro passo na consolidação dessa forma de geração no país.
As usinas eólicas, por exemplo, já somam atualmente 8,5 gigawatts em capacidade instalada, enquanto as hidrelétricas, principal fonte da matriz, representam 87 gigawatts.
(Por Luciano Costa)