Dilma diz à Folha que Cunha manda em governo Temer e que causa real de impeachment é parar Lava Jato
(Reuters) - A presidente afastada Dilma Rousseff afirmou, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo publicada neste domingo, que a divulgação de conversas gravadas de caciques do PMDB revela que a real intenção do impeachment era obstruir a operação Lava Jato, e que o presidente suspenso da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), tem influência central sobre o governo interino de Michel Temer.
"Eles (áudios) mostram que a causa real para o meu impeachment era a tentativa de obstrução da operação Lava Jato por parte de quem achava que, sem mudar o governo, a 'sangria' continuaria", disse Dilma na entrevista, em referência à expressão "estancar a sangria" usada pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) em conversa gravada pelo ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado como parte de um acordo de delação premiada no âmbito da Lava Jato.
Após a divulgação do áudio na semana passada, Jucá deixou o comando do Ministério do Planejamento até que o Ministério Público se manifeste sobre a conversa. Ele nega qualquer irregularidade. Também foram gravados por Machado em conversas sobre a Lava Jato o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o ex-presidente da República José Sarney.
Na entrevista ao jornal paulista realizada no Palácio da Alvorada, onde trabalha com assessores para tentar voltar à Presidência, Dilma afirmou também que o governo do presidente interino Michel Temer terá "de se ajoelhar" a Cunha, apesar de o deputado ter sido afastado de seu mandato por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).
"Podem falar o que quiserem: o Eduardo Cunha é a pessoa central do governo Temer. Isso ficou claríssimo agora, com a indicação do André Moura (deputado ligado a Cunha e líder do governo Temer na Câmara). Cunha não só manda: ele é o governo Temer. E não há governo possível nos termos do Eduardo Cunha", afirmou.
Em resposta às declarações de Dilma, Cunha rebateu neste domingo por meio do Twitter afirmando que a presidente afastada "demonstra a sua incapacidade e despreparo" para governar, e que a sua gestão "foi um desastre".
"Além do crime de responsabilidade cometido e que motivou o seu afastamento, as suas palavras mostram o mal que ela fez ao país. O custo da reeleição de Dilma para o povo brasileiro já está em 303 bilhões (de reais) de déficit público, além de uns 700 bilhões (de reais) de juros da dívida", afirmou.
Dilma foi afastada da Presidência em 12 de maio, por até 180 dias, após a decisão do Senado de instaurar um processo de impeachment contra ela. A presidente é acusada de crime de responsabilidade por atrasos de repasses do Tesouro ao Banco do Brasil por conta do Plano Safra, as chamadas pedaladas fiscais, e pela edição de decretos com créditos suplementares sem autorização do Congresso.
Para a defesa, as pedaladas não constituíram operação de crédito junto a instituições financeiras públicas, o que é vedado pela lei, e os decretos serviram apenas para remanejar recursos, sem implicar em alterações no volume de gastos.
A presidente afastada criticou ainda a suposta intenção do governo interino de reduzir investimentos em programais sociais, e disse que Temer deveria defender a recriação da CPMF, como ela.
"Já falaram em acabar com o Mais Médicos, já falaram que o SUS não cabe no orçamento. Depois voltaram atrás. Os que são chamados de coxinhas acreditam que o Bolsa Família é uma esmola. Não é. Ele tem efeito enorme sobre as crianças. Entre fazer isso (cortes em área sociais) e criar um imposto, cria um imposto! Para com essa história de não criar a CPMF", disse na entrevista.
Dilma também afirmou ter confiança em retornar à Presidência após o julgamento final do processo de impeachment pelo Senado, quando serão necessários dois terços dos votos, ou 54 senadores, para condenar a presidente em definitivo.
"Nós podemos reverter isso. Vários senadores, quando votaram pela admissibilidade, disseram que não estavam declarando (posição) pelo mérito. Então eu acredito", afirmou.