ANÁLISE-Encolhimento da Petrobras exige atenção em mudança regulatória para evitar o pior

Por Marta Nogueira

RIO DE JANEIRO (Reuters) - O encolhimento da Petrobras previsto em seu plano de negócios e a consequente perda de relevância da petroleira estatal na economia brasileira demandam mudanças severas na regulação do setor de petróleo e gás, cuja estruturação precisa ser bem feita e cuidadosa para que o país não perca investimentos.

O Plano de Negócios e Gestão da empresa, divulgado na semana passada, prevê aportes de 74,1 bilhões de dólares no período 2017-2021, 25 por cento a menos que o programa anterior, enquanto as vendas de ativos, estimadas em 34,6 bilhões de dólares entre 2015 e 2018, buscam prioritariamente reduzir o enorme endividamento da companhia num ambiente de preços mais baixos do petróleo.

"Para a Petrobras é um plano muito bom, que está atacando de forma contundente a redução da dívida... agora, eu acho que coloca um desafio muito grande para o governo", disse Edmar de Almeida, pesquisador do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Almeida afirmou que o plano demanda que o governo estruture meios para que o país se desenvolva com uma presença menos forte da Petrobras, que está vendendo participação relevante na subsidiária de combustíveis BR Distribuidora, unidades de transporte de gás, termelétricas e até ativos no pré-sal.

Além do fim da obrigatoriedade de a Petrobras ser a operadora única do pré-sal, previsto em projeto no Congresso Nacional, o Brasil precisará equacionar pedidos de reformulação das exigências de conteúdo local nos equipamentos da indústria, para que possam de fato favorecer o desenvolvimento de uma indústria local eficiente.

Para acelerar a produção e reduzir custos, a Petrobras e outras petroleiras que atuam no país têm buscado atualmente permissões da agência reguladora setorial para comprar equipamentos no exterior, mais baratos.

"Alguém tem que olhar para o setor, se nada for feito para compensar essa redução dos investimentos da Petrobras, para coordenar, vamos ter uma crise muito grande", disse Almeida, destacando que a petroleira precisa trabalhar junto ao governo pelas mudanças necessárias.

A Petrobras hoje é responsável pelo abastecimento nacional de derivados e de gás natural. Com a redução do seu papel em ambos os segmentos, o governo precisa encontrar formas de garantir que o mercado tenha segurança de suprimento.

"Nos próximos anos, em função desse desinvestimento da Petrobras, teremos grandes desafios regulatórios, que a gente vai ter que executá-los com o carro em movimento...", disse o diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires.

Segundo o especialista, crítico voraz das políticas consideradas intervencionistas do governo passado, é preciso "cuidado" nas mudanças.

"Às vezes você pode transformar um monopólio da Petrobras em um monopólio privado, tem que se evitar isso, porque senão as pessoas vão começar a sentir falta da Petrobras", acrescentou Pires.

Em conversa com a Reuters na semana passada, o secretário de Óleo e Gás do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, disse que o governo está trabalhando nas mudanças regulatórias necessárias para favorecer o plano da Petrobras e também toda a indústria. Além de aperfeiçoamentos na política de conteúdo local, o governo trabalha na regulamentação da exploração e produção no pré-sal e em uma reforma do setor de gás natural.

PODER REGULADOR

John Forman, geólogo e ex-diretor da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), vê com preocupação a concentração dessas decisões no governo.

Segundo ele, a melhor opção seria fortalecer a agência reguladora do setor para que ela crie regras de longo prazo. Para o especialista, assim como o governo anterior, o atual está interferindo muito na regulação setorial.

"Você tinha um governo que tinha um viés muito estatizante, agora está mudando... as regras devem ser as mesmas seja lá qual for o governo, e isso só é possível se a agência for independente e não sujeita aos humores políticos do governo da ocasião", afirmou Forman.

Passada a euforia da indústria com as perspectivas de um governo mais voltado para o setor privado, representantes do mercado já começam a temer que novas regras não favoreçam de fato a indústria nacional.

Recentemente, o diretor-geral da Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip), associação que representa fornecedores nacionais, Eloi Fernández y Fernández, criticou a Petrobras por colocar a exigência de conteúdo local como um dos principais riscos atuais da empresa.

RESPOSTA RÁPIDA

O presidente da Petrobras, Pedro Parente, por outro lado, afirmou na terça-feira, após reunião com o presidente da República, Michel Temer, que mudanças regulatórias podem dar "resposta muito rápida em termos de investimentos" para ajudar na retomada da economia brasileira.

O presidente do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), Jorge Camargo, disse na quarta-feira, em São Paulo, que uma regulamentação que torne o Brasil mais competitivo pode dobrar a participação do país nos investimentos globais em exploração e produção de petróleo.

A opinião tem respaldo em outro consultor privado.

"O conteúdo local é completamente irresponsável do jeito que está feito hoje... o Brasil não pode perder tempo... o quanto antes precisa mudar (as regras de conteúdo local), dessa forma você garante prazos e evita sobrepreços", afirmou David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da ANP e diretor da DZ Negócios com Energia.

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