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Câmara deve conter 'aventuras' e populismo de Bolsonaro, diz Marcelo Ramos

"Eu acho que não haverá movimentos bruscos neste ano. Pode haver até tentativas, mas eu acredito que elas serão contidas", disse o vice-presidente da Câmara - Estadão Conteúdo/Frederico Brasil
"Eu acho que não haverá movimentos bruscos neste ano. Pode haver até tentativas, mas eu acredito que elas serão contidas", disse o vice-presidente da Câmara Imagem: Estadão Conteúdo/Frederico Brasil

Maria Carolina Marcello e Anthony Boadle

De Brasília

12/03/2021 14h42

Há pouca margem para "aventuras" fiscais na Câmara dos Deputados, mesmo com a aproximação das eleições e diante da possibilidade de uma guinada populista do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), avaliou hoje o vice-presidente da Casa, Marcelo Ramos (PL-AM).

Ao mesmo tempo, Ramos afirmou, em entrevista à Reuters, que o Congresso está convicto da necessidade urgente de imunização em massa da população como um instrumento não apenas de saúde pública, mas também de retomada da economia. Segundo ele, haverá cobranças pelo cumprimento de compromissos relacionados à vacinação.

"Nós temos pouco espaço para aventura... Como o Orçamento está muito apertado e a capacidade de endividamento está muito estressada, você corre o risco do efeito inverso. O efeito inverso é o país explodir antes da eleição", disse em uma entrevista via videoconferência à Reuters, mesmo tendo no horizonte as eleições de 2022.

"Eu acho que não haverá movimentos bruscos neste ano. Pode haver até tentativas, mas eu acredito que elas serão contidas", acrescentou.

Para o deputado, a entrada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no jogo eleitoral também pode influenciar as tomadas de decisão do presidente Jair Bolsonaro e suas iniciativas de olho na popularidade. Ramos confia, no entanto, no sistema de "freios e contrapesos" que impedirá guinadas drásticas.

"Eu acho que o presidente Bolsonaro passa a ter uma sombra que ele não tinha. A força do presidente Lula com essas camadas mais pobres da sociedade, ela é inegável. E o fato de ele estar elegível, certamente do ponto de vista político, muda um pouco o tabuleiro do jogo. Pressiona um pouco o presidente da República e obviamente pode exigir do presidente da República movimentos pensando mais na sua popularidade do que na questão do fiscal do país", avaliou.

"No entanto, eu registro que a Câmara dos Deputados tem se mostrado muito atenta e diligente com essa questão fiscal."

Ramos citou como exemplo a conclusão da votação, na madrugada desta sexta-feira, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial, que além de abrir as condições para a concessão de um auxílio financeiro a vulneráveis, estabelece travas a serem acionadas em situação de crise fiscal para a contenção de despesas.

Para ele, a aprovação da proposta, ainda que com algumas supressões no texto e mesmo diante de pressões por maiores desidratações, demonstra que o Parlamento manteve tendência de aprovar medidas de responsabilidade fiscal.

"Eu não diria que o governo tem uma base", disse, questionado se a votação da PEC traduziu uma consolidação do apoio do governo no Congresso, já que, por se tratar de uma mudança na Constituição, precisava de quórum especial para ser aprovada de no mínimo 49 senadores e 308 deputados.

"Eu acho que a responsabilidade fiscal tem uma base mais sólida no Congresso", afirmou, citando ainda a aprovação da reforma da Previdência em 2019.

Tradicionalmente, no entanto, percebe-se uma tendência no ambiente político a pautas de maior apelo popular à medida que se aproxima o período eleitoral. Neste ano, especificamente, as pressões aumentam diante da crise enfrentada pelo país por conta da pandemia de Covid-19.

Sobre eventual prorrogação desse novo auxílio, que, segundo o governo, terá valor médio de 250 reais por quatro meses, Ramos acredita ser impossível bater o martelo. Lembrou, no entanto, que a PEC aprovada pelo Congresso limita o montante do auxílio a 44 bilhões de reais.

"Isso é uma trava objetiva. Agora, dizer o que vai acontecer daqui a quatro meses em uma pandemia, que nós não temos a mínima ideia de como vai se movimentar... seria temerário dizer que vai ter ou que não vai ter (prorrogação)."

Próximos passos

Terminada a discussão da PEC, Ramos elenca como prioridade zero a aprovação do Orçamento. Cita, ainda, as propostas de privatização da Eletrobras, e ainda as reformas administrativas e tributária. Lembra, ainda, da possibilidade de votação da lei do Gás, na próxima semana.

O vice-presidente da Casa avalia como possíveis as aprovações da reforma administrativa, por restringir sua abordagem aos novos servidores, e não aos já efetivos, e da MP relacionada à capitalização da Eletrobras, justamente por entrar efetivamente em vigor apenas após a conversão da medida provisória em lei.

Já a reforma tributária, para Ramos, tem complexidades que podem alongar sua discussão no Congresso.

"A reforma tributária, eu diria que ela está um passo atrás. É muito mais difícil você conseguir chegar a uma composição setorial e federativa na questão tributária do nosso país", explicou.

Ramos pondera, por outro lado, que a proposta já tem ao menos um trajeto acertado, e deve começar sua tramitação pelo Senado assim que tiver seu relatório apresentando na comissão mista informal criada para discutir o tema.

"Já temos aí pelo menos um horizonte de tramitação", disse.

Vacina no braço

Sobre a vacinação, tema que tem afligido os brasileiros e é defendida por uma grande maioria dos parlamentares, Ramos afirma que não há como "não ser crítico à condução do Ministério da Saúde"

"A Câmara tem muita clareza de que o remédio para a economia é o mesmo remédio para a doença, que é vacina... a vacina é um remédio para as duas coisas", afirmou.

"Quem não der conta de responder a isso com agilidade, será cobrado duramente pela Câmara", acrescentou.

O parlamentar descarta, no entanto, a necessidade de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) por ora, por considerar que ela pode "pegar um ministério que já tem dificuldade de gestão para administrar esse tema e dividir suas energias entre responder uma CPI e ter que ir atrás de solucionar os problemas e vacinar os brasileiros".

Ramos cita a vacinação como um dos assuntos mais prioritários do Congresso, acima de posições partidárias ou políticas. E defendeu que esse foco seja mantido, ao lado das pautas econômicas, ao comentar a indicação de bolsonaristas do PSL para o comando de importantes comissões da Câmara, caso da Constituição e Justiça (CCJ), e do Meio Ambiente.

"Os presidentes de comissão do PSL têm que decidir se querem ajudar ou atrapalhar o governo . Se eles quiserem ajudar o governo, e eu espero que queiram.... eles vão priorizar o que é importante para o país que são as pautas relacionadas à vacina, o combate à pandemia, e as pautas econômicas, e não criar tensão na Casa por pautas que são secundárias", alertou, lembrando que eventuais tensões podem "inviabilizar a tramitação de matérias fundamentais".

Nessa pauta secundária, que pode atrapalhar a condução de outros temas, inclui-se a flexibilização do acesso a armas, alvo de recentes investidas do presidente Jair Bolsonaro.

"Esse é o país... que vive esse drama social, econômico e sanitário do lado de fora das Casas Legislativas e do Executivo, ele não precisa de armas", disse o deputado, citando os ainda baixos níveis de imunização da população, o alto número de desempregados, e o fechamento de micro e pequenas empresas.

"Eu espero que o presidente, com a responsabilidade que tem com o país, tenha consciência e grandeza de que o que Brasil precisa hoje é de vacina no braço e comida no prato."