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Azevedo admite que deixou Defesa por pressão pra envolver Forças Armadas na política

Lisandra Paraguassu

Em Brasília

30/03/2021 13h32

Demitido repentinamente pelo presidente Jair Bolsonaro, o agora ex-ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva admitiu a interlocutores que se sentia desconfortável no governo e havia uma pressão para maior envolvimento político das Forças Armadas, o que ele não permitiu e terminou por levar a seu afastamento, disseram à Reuters fontes que acompanharam as conversas.

Demitido no início da tarde de segunda-feira por Bolsonaro, Azevedo recebeu diversos telefonemas. Entre eles, do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, e de pelo menos três outros ministros do STF, além de vários parlamentares. Em todos, a preocupação com possíveis riscos institucionais que poderiam vir das mudanças planejadas por Bolsonaro nas Forças Armadas.

De acordo com as fontes ouvidas pela Reuters, a avaliação do ex-ministro passada em suas conversas é que não há risco de instabilidade institucional e nem desejo do comando das forças em se envolver politicamente no governo. Para um dos interlocutores, considerando a conversa com o general, as forças "estão comprometidas com o estado democrático de direito".

Depois da conversa com o ex-ministro, segundo uma das fontes, Fux disse a interlocutores que "ficou mais tranquilo" e avaliou que há um "realinhamento político" do governo e não algo que crie preocupação sobre instabilidade institucional.

A pressão política, no entanto, existe e foi o que levou à saída de Azevedo. O próprio general revelou em suas conversas que se recusou a politizar as forças.

Os pedidos foram muitos e incluíram o pedido de Bolsonaro para trocar o comandante do Exército, general Edson Pujol, o que Azevedo sempre impediu. O presidente se irritava com a resistência do general em demonstrar apoio ao governo e, por mais de uma vez, reagiu mal a falas do comandante, que deixava claro não ver o Exército como parte da política.

A última delas, em novembro, foi uma das mais contundentes. Em uma fala durante uma live, Pujol deixou claro que o Exército não faria parte da política.

"Não queremos fazer parte da política governamental ou política do Congresso Nacional e muito menos queremos que a política entre no nosso quartel, dentro dos nossos quartéis. O fato de, eventualmente, militares serem chamados a assumir cargos no governo, é decisão exclusiva da administração do Executivo", afirmou.

O general acrescentou ainda que as Forças não são instituição de governo, mas de Estado, e não têm partido. "Não mudamos a cada quatro anos a nossa maneira de pensar e como cumprir nossas missões", disse.

Por mais de uma vez, Bolsonaro declarou que é "comandante supremo" das Forças Armadas, o que é um fato constitucional, mas várias vezes as chamou de suas, o que não é o caso. As Forças Armadas não são de um presidente ou governo, mas do Estado brasileiro, independentemente de quem seja o governante.

Mais recentemente, disse que não iria usar o que chamou de "meu Exército" para, por exemplo, reforçar políticas de lockdown nos Estados.

"O meu Exército não vai para a rua para cumprir decreto de governadores. Não vai. Se o povo começar a sair de casa, entrar na desobediência civil, não adianta pedir o Exército, porque meu Exército não vai. Nem por ordem do papa. Não vai", disse a apoiadores há cerca de 10 dias.

Na manhã desta terça, Azevedo se reuniu com os comandantes das três forças —além de Pujol, o comandantes da Marinha, Ilques Barbosa, e da Aeronáutica, Moretti Bermudez. Segundo uma das fontes, a tendência é que os três coloquem os cargos à disposição, mas não é certo que Bermudez e Barbosa saiam de fato. Já Pujol, sua saída é dada como certa.

Walter Braga Netto, que deixa a Casa Civil e assume a Defesa é, como Azevedo, um general de quatro estrelas da reserva, é respeitado nas tropas e um homem fiel aos princípios do Exército. No entanto, depois de ter ocupado um cargo político como a Casa Civil, é visto como mais alinhado ao bolsonarismo e bastante próximo ao presidente.

Ainda assim, de acordo com uma das fontes, a análise, inclusive no STF, é que o novo ministro não deve abrir caminho para "riscos institucionais".

O governo Bolsonaro teve início em 1º de janeiro de 2019, com a posse do presidente Jair Bolsonaro (então no PSL) e de seu vice-presidente, o general Hamilton Mourão (PRTB). Ao longo de seu mandato, Bolsonaro saiu do PSL e ficou sem partido até filiar ao PL para disputar a eleição de 2022, quando foi derrotado em sua tentativa de reeleição.