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Banco de dados reúne estatísticas da degradação de direitos humanos no Brasil

Policiais militares são flagrados agredindo jovens em baile funk na zona sul de São Paulo - Reprodução/YouTube/Marcos Brandão
Policiais militares são flagrados agredindo jovens em baile funk na zona sul de São Paulo Imagem: Reprodução/YouTube/Marcos Brandão

30/01/2020 14h08

Entidades francesas e internacionais que atuam sobre o Brasil lançaram hoje um banco de dados inédito sobre as violações dos direitos humanos no país desde 2016. As estatísticas, recolhidas junto a organismos oficiais e organizações da sociedade civil, evidenciam o aumento da violência contra as minorias, como mulheres, indígenas e homossexuais.

Os dados estão compilados em um site em francês e integram a campanha "Le Brésil resiste: lutter n'est pas um crime" (O Brasil resiste: lutar não é um crime), promovida por 17 organizações reunidas na Coalizão Solidariedade Brasil. Os números não são inéditos nem refletem novos estudos, porém, uma vez agrupados, dão uma dimensão global da piora da situação dos direitos humanos no país.

"Existem vários dados anunciados por setores no Brasil, mas não existe nada transversal", explica Erika Campelo, co-presidente da Autres Brésils, que participa do projeto.

"Essa é a força desse barômetro, para mostrar que, desde 2016, as coisas pioraram muito no Brasil e só estão piorando mais. O governo federal tem a ambição de apagar a história e os dados, mas eles são importantes para entender como a progressão é forte e a violência só cresce."

Estatísticas alarmantes

Alguns exemplos refletem essa avaliação: de 2016 a 2018, houve 47,3% de aumento do número de vítimas da violência policial, que em 75% dos casos visou negros; 113% de alta dos assassinatos de LGBTQI+; e 141% nos de indígenas.

As estatísticas de 2019, primeiro ano do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), ainda estão em fase de conclusão. Entretanto, as diferentes políticas adotadas pelo líder de extrema-direita "não sugerem que essa curva vai se inverter, pelo contrário", como ressaltou Juliette Gallou, da ONG Secours Catholique.

"O governo Bolsonaro se mostra catastrófico para as populações LGBT, tanto em termos de violências e mortes quanto em medidas que terão claramente um impacto terrível na luta contra a aids, principalmente os mais pobres", afirma Fraçois Emery, integrante da organização Act Up Paris, que combate a propagação do vírus HIV.

"Ele acabou com os tratamentos de substituição para os usuários de drogas, bloqueou o desenvolvimento de pesquisas de medicamentos antirretrovirais genéricos e prega a abstinência sexual como método de prevenção", denuncia.

Pressão internacional via acordos econômicos

No portal Le Brésil Résiste, representantes da sociedade civil dão testemunhos da degradação na sua área de atuação, como o humorista Gregório Duvivier, da Porta dos Fundos. Em um vídeo, ele relata os recentes ataques e censura ao grupo, que é alvo de "ameaças físicas e judiciais" cotidianas, diz Duvivier.

"Os governos europeus continuam a importar as nossas matérias-primas, mas sabem pouco sobre o Brasil. Seria bacana se pudessem se informar mais sobre esse país que está cada vez menos democrático", comenta o humorista.

Já o padre Julio Lancellotti, do programa A Gente na Rua, ressalta que "o Brasil é o país que mais mata defensores dos direitos humanos".

"No Brasil, há quase uma identificação do conceito de direitos humanos com defesa de bandidos", frisa o religioso. "Os defensores de direitos humanos são agredidos, insultados, perseguidos e até mortos. Existe um ódio permanente, constante e sistemático contra eles."

A coalizão espera que o banco de dados, que será regularmente atualizado, possa se transformar em uma ferramenta para o governo francês e a União Europeia pressionarem Brasília, em especial pelo acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. O tratado foi firmado em 2019 entre os dois blocos, mas ainda deve ser ratificado pelos Parlamentos dos países contemplados pelo acordo.