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Irmãs brasileiras se reinventam profissionalmente em Israel e superam crise provocada pela covid-19

Brigadeiros - Unsplash/Divulgação
Brigadeiros Imagem: Unsplash/Divulgação

Daniela Kresch, correspondente da RFI em Israel

28/06/2020 12h02

Duas irmãs brasileiras estão se destacando em Israel por conseguirem se reinventar profissionalmente em meio à pandemia do novo coronavírus. Monica e Carol Hauser, de 41 e 39 anos, respectivamente, adotaram o país do Oriente Médio há cerca de cinco anos e, desde então, tiveram sucesso em se integrar à sociedade e se recolocar no mercado de trabalho local.

Mas a chegada da covid-19 mudou tudo e as duas se viram sem trabalho em um país onde o desemprego aumentou de 3,9% no começo de março para 27% em abril. Apesar de todos os desafios, as irmãs empreendedoras partiram para iniciativas inovadoras que estão dando mais frutos do que pensavam dentro da comunidade brasileira local, com cerca de 15 mil pessoas.

Nascidas em Manaus, as irmãs foram ainda pequenas para o Rio de Janeiro. Monica se tornou jornalista e Carol, consultora empresarial. Em 2015, já com 35 anos, Carol decidiu se mudar para Israel, mesmo falando pouco a língua local, o hebraico. Conheceu seu atual marido israelense bem rápido, mas, até recentemente, falava com ele em inglês.

Segundo Carol, isso atrapalhou na busca de emprego, principalmente durante 2018, quando passou por processos de seleção, mas demorou para se recolocar:

"Eu estudei em colégio judaico a vida inteira, mas sempre fui muito fraca em hebraico, sempre tive vergonha de falar. Eu não falava. Passei os dois primeiros anos falando inglês e isso me atrapalhou muito, eu acho. Durante esse período que eu fiquei desempregada, eu também fiz o Ulpan [instituto para aprendizagem de hebraico], eu fiz o curso de hebraico, fiz mais dois cursos e mudei a língua que comecei a falar com meu marido em casa. A gente começou a falar em hebraico em casa."

Nesse período de busca de trabalho, Carol começou a escrever um blog no jornal israelense The Times of Israel, em inglês, sobre a adaptação para o mercado de trabalho local. No começo deste ano, ela deixou o último emprego por vontade própria. Só não contava com o advento de uma pandemia mundial como a de covid-19, que paralisou a economia.

"Kadima Brasil"

Com a necessidade de buscar soluções, Carol criou o Kadima Brasil, ou, em português, algo como "Avante, Brasil", um grupo voltado à recolocação de imigrantes brasileiros no mercado de trabalho israelense e que, com apenas três meses de atuação, já conta com 500 inscritos.

"O objetivo é consolidar uma comunidade, uma rede profissional de brasileiros morando em Israel", explica Carol. "Eu não quero ser uma empresa de recrutamento e seleção, não é esse o objetivo. Mas me dá uma ideia também de procurar empresas e oferecer esse grande banco de dados de brasileiros."

O Kadima Brasil também promove webinars em português com pessoas que trabalham em alguma área de interesse, como profissionais de RH, que explicam um pouco a diferença entre o Brasil e Israel. Uma dessas diferenças é a informalidade. Outra, o jeito de ser do israelense:

"Aqui é tudo muito mais light. Eu já vi gente de havaianas no trabalho. Então, por exemplo, as minhas roupas sociais que eu usava no Brasil, está tudo dentro da mesma mala, só tem que criar coragem de jogar fora, de doar", conta Carol Hauser. "E as desvantagens, eu acho que o brasileiro, ele dá muita volta para chegar aonde ele quer chegar. E o israelense, ele é mais direto ao ponto. Essa ainda é a minha maior dificuldade: ir direto ao ponto, sem sentir que eu estou sendo grossa".

Pão de queijo e brigadeiro

A irmã mais velha de Carol, Monica, se mudou para Israel há cerca de quatro anos, deixando para trás uma carreira de sucesso como dona de assessoria de imprensa no mercado cultural, de moda e culinário. O sonho antigo de morar em Israel também a levou a recomeçar a vida, aos 37 anos de idade, em outro país.

Por sorte, conseguiu emprego rapidamente como professora de creche, outro sonho antigo. Mas acabou recebendo um convite para trabalhar numa agência de turismo que tinha como público alvo peregrinos cristãos do Brasil. O sucesso na nova carreira foi rápido. Mas ela também não contava com a reviravolta que o novo coronavírus causaria no mercado de turismo da Terra Santa.

Israel - Gil Cohen-Magen/AFP - Gil Cohen-Magen/AFP
Trabalhadora testa amostras de casos suspeitos do novo coronavírus em laboratório de Israel
Imagem: Gil Cohen-Magen/AFP

Com o fechamento das fronteiras, a agência de turismo colocou todos os empregados em férias sem remuneração. "Aqui em Israel, graças a Deus que o governo está ajudando, mas é 50% do meu salário", conta Monica. "Eu falei: preciso arranjar uma maneira de pagar as contas, que continuam chegando. Eu preciso arranjar uma maneira de conseguir recuperar esses outros 50%. E aí comecei a pensar em coisas, o que fazer."

Monica era apaixonada por culinária desde a infância, mas nunca havia pensado em transformar o dom que tem na cozinha em profissão. Decidiu, então, aprender a fazer iguarias brasileiras para vender à comunidade em Israel, ávida pelo gostinho da terra natal. Deu tão certo que, hoje, apenas um mês depois, ela já tem mais de 40 clientes e estuda abrir uma empresa e deixar o turismo e as creches para trás.

"Nunca tinha feito coxinha, nunca tinha feito rissoles... Pão de queijo era a única coisa disso tudo, e os brigadeiros, que eu realmente já fazia sempre. E aí eu resolvi testar, testando, testando, comecei a dar para umas amigas que moravam muito perto de mim para provar. Minha irmã também. E aí foi super aprovado e eu falei: então eu vou começar", conta Monica.

Covid-19 foi desafio e oportunidade

Para as irmãs Hauser, o novo coronavírus se tornou um desafio e uma oportunidade. A epidemia foi o catalisador da mudança, como diz Monica Hauser. "Acho que não importa se você é funcionário ou se você é dono de empresa, você tem que ser empreendedor."

O mesmo pensa a irmã, Carol Hauser. "Acho que a grande questão do se reinventar é a gente fazer o que a gente gosta, né? Descobrir qual é a nossa paixão e fazer aquilo que a gente gosta."