Brexit: em clima de tensão, Reino Unido e UE retomam negociações para finalizar divórcio
A imagem se repete em todas as análises: o precipício que se aproxima e o relógio que não espera. Esta tem sido a técnica de negociação usada pelo Reino Unido e a pela União Europeia (UE) para acertar os detalhes finais do Brexit. A estratégia é ver quem pisca primeiro.
A nova rodada de reuniões - a oitava e, possivelmente, a última - acontece esta semana em Londres sob a sombra de rumores de que os britânicos podem deixar a mesa de negociações e ainda mudar os termos do acordo que já havia sido acertado com Bruxelas, as chamadas bases para o divórcio.
A novidade despertou desconfiança entre os europeus e azedou o tête-à-tête presencial. O negociador chefe da UE, Michel Barnier, desembarca na capital britânica hoje com a seguinte mensagem: se é para mudar o que já estava acertado, não tem conversa.
De acordo com o jornal britânico Financial Times, o governo do primeiro-ministro Boris Johnson pretende passar uma lei que, se aprovada, vai rescrever o combinado com Bruxelas sobre o status da Irlanda do Norte, uma das questões mais complicadas da novela do Brexit, que se arrasta há mais de quatro anos.
Fronteiras
A Irlanda do Norte é parte do Reino Unido, mas tem uma fronteira terrestre com a República da Irlanda, que é parte da UE. Hoje, não há nenhum tipo de controle entre os dois lados. E isso foi fundamental para que se pacificasse a Irlanda, palco de muita violência até os acordos da Sexta-feira Santa, de 1998. Como tirar o Reino Unido do espaço aduaneiro europeu mantendo a fronteira da Irlanda do Norte aberta para a República da Irlanda? Essa é uma das grandes sinucas do Brexit. Até agora, era ponto pacífico. Foi isso que permitiu a Johnson, finalmente, fechar com os europeus as bases para o divórcio, coisa que sua antecessora, Theresa May, não conseguiu. Custou-lhe o cargo.
Durante ontem, o governo britânico tentou colocar panos quentes sobre a informação vazada à imprensa. Explicou que a nova lei não mudaria o que já foi dito, apenas esclareceria pontos específicos do que foi acordado. Barnier vai cobrar explicações do seu homólogo britânico, David Frost, nos próximos dias.
O fato é que a menos de quatro meses de o Reino Unido deixar a União Europeia (UE) em definitivo, é cada vez maior a pressão para que a equipe de Johnson mostre como pretende deixar o bloco sem prejudicar ainda mais a combalida economia britânica. Sob a ameaça de uma segunda onda de contaminações pelo novo coronavírus, os britânicos temem que deixar o bloco sem um acordo pode trazer ainda mais incertezas e prejuízos para o país.
O Produto Interno Bruto (PIB) do Reino Unido encolheu nada menos que 20,4%, no segundo trimestre deste ano, o pior resultado desde 1955, sobretudo em função da covid-19. E a segunda onda de contaminações pode estar logo ali. O país registrou pelo segundo dia consecutivo um recorde no número de novos casos diários desde maio. Isso pode significar novas medidas restritivas e até confinamento, o que tem efeitos inequívocos sobre a atividade econômica e o nível de empregos. O que se quer agora é que o governo busque com os europeus um acordo que poupe a economia britânica do pior.
É difícil entender por que o Reino Unido, que parece a parte mais frágil nestas negociações, tenta forçar os europeus para o precipício. Um Brexit sem acordo é ruim para a Europa, mas os 27 países que ficam no bloco têm a tranquilidade de estar dentro de um mercado de meio bilhão de habitantes. O Reino Unido, por sua vez, terá de renegociar sua posição no mundo, com novos acordos comerciais, com os europeus inclusive.
O relógio não para. O tempo é cada vez mais curto. As regras de transição, que permitem ao Reino Unido funcionar como se ainda estivesse dentro da UE, terminam no dia 31 de dezembro. Mas um acordo - se é que ele será possível - tem de ser acertado até meados de outubro. Isso porque é preciso dar tempo para que o entendimento seja submetido e aprovado pelos parlamentos de cada um dos 27 países da UE.
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