Dez anos de guerra e quase 400 mil mortos: por que Bashar al-Assad segue inabalável na Síria?
A guerra na Síria completa 10 anos nesta segunda-feira (15), com um dramático balanço de ao menos 388.652 mortos, de acordo com o levantamento divulgado neste domingo (14) pela organização civil Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), baseada no Reino Unido. Apesar dessa tragédia humanitária, o presidente sírio, Bashar al-Assad, é o único dos ditadores contestados pelo movimento da Primavera Árabe, iniciado em 2011, a continuar no poder. O líder sanguinário perdura graças ao apoio da Rússia, do Irã e de seu grupo étnico-religioso, os xiitas alauítas.
Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, do total de quase 400 mil mortos em 10 anos de guerra, cerca de 117 mil vítimas eram civis, incluindo 22 mil crianças. A OSDH também documentou ao menos 16 mil mortes em prisões governamentais e centros de detenção. No entanto, este balanço é subestimado porque não leva em conta cerca de 88 mil pessoas que morreram em consequência de sessões de tortura nas prisões do regime.
Os ataques do governo sírio e das milícias aliadas são responsáveis pela maioria das mortes de civis, destaca o OSDH. Em 2020, os confrontos diminuíram devido ao cessar-fogo na região noroeste do país e ao combate à pandemia do coronavírus.
Em sua missa dominical no Vaticano, o papa Francisco exortou as partes em conflito a "depor as armas" e a "reconstruir o tecido social" no país devastado por uma década de combates sangrentos. "Renovo o meu sincero apelo às partes em conflito para que deem sinais de boa vontade, para que um lampejo de esperança se abra à população exaurida", apelou o papa, após sua tradicional oração Angelus, na praça de São Pedro.
"Espero também um compromisso construtivo, decisivo e renovado de solidariedade por parte da comunidade internacional para que, uma vez que as armas forem depostas, o tecido social possa ser reconstruído, e a reconstrução e a recuperação econômica [do país] possam começar", acrescentou o pontífice argentino.
Uma década de repressão feroz e um território em ruínas
O movimento de insurreição contra líderes autoritários de países árabes, que ficou conhecido como Primavera Árabe, alcançou a Síria em 15 de março de 2011, quando as primeiras manifestações pró-democracia aconteceram em Deraa, no sul do país. A guerra civil começou com a repressão brutal do regime aos opositores que clamavam por reformas democráticas e depois se agravou com a aparição de grupos jihadistas em solo sírio.
Dez anos mais tarde, o conflito provocou a fuga de 6 milhões de sírios para países vizinhos. O país, que tinha 21 milhões de habitantes antes da deflagração dos combates, tem hoje apenas 17 milhões. Cerca de 80% da população vive abaixo da linha da pobreza.
A Síria se transformou numa colcha de retalhos. O movimento islâmico HTS controla parcialmente a área de Idlib, a oeste do território, que se encontra atualmente sob domínio turco. Os curdos controlam a região noroeste, enquanto do nordeste a leste resíduos de grupos jihadistas ainda resistem. Milícias iranianas atuam no sul, enquanto Israel está nas colinas de Golã.
O apoio político e miliar contínuo da Rússia e do Irã faz com que Assad se apresente como o defensor da unidade territorial, mas na prática o regime domina apenas 20% das fronteiras do país. Aos 55 anos, o ditador sanguinário de Damasco é alvo de várias investigações por crimes de guerra e contra a humanidade. Mas, aparentemente inabalável, Assad segue aplicando a estratégia aprendida com seu pai, Hafez. Depois de chegar ao poder por meio de um golpe de Estado nos anos 1970, Hafez al-Assad estruturou um regime apoiado no partido único Baas, num aparelho repressivo bem organizado e num Exército fiel às ordens da família. Bashar herdou essa estrutura.
Muitos se perguantam quando a guerra da Síria irá acabar e a resposta é um enigma. Para se manter no poder, Assad adotou há algum tempo uma estratégia perfeitamente calculada, segundo analistas. Ao libertar jihadistas da prisão, para que espalhassem o terror com atentados contra uma população já traumatizada, o combate ao terrorismo islamista se tornou uma prioridade e enfraqueceu a oposição democrática. O conflito sírio ganhou uma dimensão confessional que não tinha no início e que legitima a posição de Assad como defensor da integridade do país.
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