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Russos ignoram visita de Bolsonaro a Moscou: 'Seria surpreendente se fosse o Biden'

Presidente Jair Bolsonaro desembarca em Moscou, na Rússia - Reprodução/TV Brasil
Presidente Jair Bolsonaro desembarca em Moscou, na Rússia Imagem: Reprodução/TV Brasil

Silvano Mendes

Enviado especial a Moscou

15/02/2022 12h01

A viagem do presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL) a Moscou, que começa hoje, é acompanhada de perto pela imprensa no Brasil. Mas poucas horas antes do início da visita, pouca gente sabia que o chefe de Estado ia desembarcar na capital russa e se encontrar com Vladimir Putin. Mesmo assim, alguns comentam o momento escolhido para a visita, em plena crise entre Moscou e a comunidade internacional.

Basta pronunciar a palavra "Brasil" nas ruas de Moscou para que os russos deixem de lado a postura sisuda, de rigor nas ruas da capital, principalmente com os termômetros abaixo de zero, como é o caso nesse momento. "Futebol", "Amazônia" e "Favelas" foram as expressões mais ouvidas pela reportagem da RFI na noite de ontem quando o nome do país latino-americano foi mencionado.

"Carnaval" e "calor" também estavam entre os termos mais lembrados, com alguns entrevistados arriscando cantarolar e até insinuar um movimento de dança em plena avenida Tverskaïa, a principal do Moscou, que desemboca na Praça Vermelha e no Kremlin. No entanto, das dezenas de pessoas encontradas em diferentes bairros da cidade, praticamente ninguém mencionou a visita do presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que voava naquele momento em direção à capital russa.

"Nós seguimos a atualidade com atenção e soubemos quando outros presidentes vieram aqui, como [o francês Emmanuel] Macron, que passou pela cidade. Mas o brasileiro eu não sabia", comenta uma senhora que, como muitos entrevistados, não conhecia o nome do chefe de Estado brasileiro.

Mesmo assim, todos tinham uma opinião sobre o encontro entre Bolsonaro e Putin. "O Brasil é um país importante", disse outra russa, lembrando da presença brasileira no BRICs, grupo do qual participa junto com Rússia, Índia, China e África do Sul. "Mas porque o presidente do Brasil está vindo para Moscou nesse momento? Espero que ele não vá falar sobre a Ucrânia, pois vai perder sua credibilidade", desabafa.

A declaração mostra que a situação na fronteira ucraniana monopoliza as atenções da população, preocupada com a crise na porta do país vizinho. Alguns arriscam uma análise política, afirmando que "qualquer encontro é importante, principalmente se os países se pronunciarem [sobre as tensões internacionais]". No entanto, ponderam o peso de uma eventual declaração do líder brasileiro sobre questões geopolíticas. "Uma simples visita não representa muita coisa", resume outro russo.

Pontos em comum com Putin

Um jovem que passeava com a namorada também disse que não sabia da visita de Bolsonaro. "Mas isso não me surpreende", afirma. "Seria surpreendente se fosse [Joe] Biden. Afinal, o presidente da Hungria, como o presidente do Brasil, tem pontos em comum com Vladimir Putin", enfatizou, em alusão às afinidades políticas entre os líderes húngaro, russo e brasileiro.

Seguindo essa linha, duas jovens de cerca de 20 anos com look moderno, viam a visita de Bolsonaro como um sinal forte de apoio de Brasília a Moscou diante da crise ucraniana. "A situação é injusta com relação à Rússia, então quanto mais países nos acompanhando, melhor", disse uma delas.

Já a amiga foi mais enfática. "Nesse contexto tão difícil, é ainda mais importante se unir para combater o 'inimigo comum'", disse, usando um vocabulário habitual dos "jovens patriotas", como são chamados os partidários de Vladimir Putin. Das dezenas de pessoas entrevistadas, as duas jovens, que defenderam claramente a ação militar na fronteira ucraniana, eram as únicas que estavam sabendo da passagem de Bolsonaro por Moscou".

Interesse modesto da imprensa

"Na minha opinião, do lado russo, não haverá nenhuma provocação para que Bolsonaro faça declarações sobre a situação geopolítica. Talvez os jornalistas brasileiros estejam esperando por isso. Não os russos", analisa Dmitry Razumovsky, diretor do Instituto de Estudos Americanos da Academia de Ciências da Rússia.

Enquanto isso na imprensa local, os jornais de hoje ainda davam pouco destaque para a passagem do presidente brasileiro por Moscou, se concentrando principalmente na visita do chanceler alemão, Olaf Scholz, que passou na véspera por Kiev.

O Rossiiskaja Gazeta (RGRU) disse que "o Kremlin espera com impaciência a visita do presidente do Brasil", enquanto o Neaaavisimata Gazeta se contentou com o discurso oficial, afirmando que "o presidente brasileiro quer apoiar as relações com a Rússia". Já o Pravda resume a situação com uma frase ambígua: "Não vai ter guerra. Vai ter Bolsonaro no Kremlin".