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Críticas a Bolsonaro e malas prontas: a rotina dos brasileiros na Ucrânia

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

15/02/2022 12h00

Embora relatem normalidade no dia a dia, brasileiros que vivem na Ucrânia dizem estar atentos às notícias sobre a possibilidade de um ataque russo, afirmam estar de malas prontas para uma eventual necessidade de saída emergencial e criticam a visita de Jair Bolsonaro (PL), que chegou hoje à Rússia e irá se encontrar com o presidente Vladimir Putin na quarta-feira (16).

Apesar das consultas em busca de informações dos cidadãos na Ucrânia, o embaixador brasileiro no país europeu, Norton de Andrade Mello Rapesta, minimiza: "Ninguém quer guerra. A vida segue normal e não há pânico. A comunidade brasileira está tranquila aqui", disse ao UOL News. A Embaixada do Brasil estima a presença de cerca de 500 brasileiros no país entre estudantes, executivos de multinacionais e familiares de ucranianos.

A modelo Paula Corrêa Pereira, 36, que deixou Jundiaí (interior de São Paulo) em outubro de 2020 para morar com o marido ucraniano em Odessa, ao sul do país às margens do Mar Negro, diz acreditar que o presidente brasileiro escolheu o pior momento para visitar Putin.

"O momento é inconveniente. Bolsonaro não deveria ir à Rússia antes da situação com a Ucrânia estar resolvida. A intenção dessa visita não está clara", avalia.

Por que Bolsonaro não incluiu uma visita à Ucrânia? Isso passaria uma mensagem de paz aos países envolvidos e seria um gesto de respeito com o povo ucraniano. [A visita de Bolsonaro] é exatamente o tipo de situação que o Putin quer. Com a visita de líderes mundiais, ele passa uma mensagem ao mundo de que não está sozinho"
Lucas Coser, matemático brasileiro em Kiev

A especialista em tecnologia Fernanda Krupin, 29, que se mudou de São Paulo para a capital Kiev com o marido há um ano e meio, diz concordar. "O momento da visita não é o mais oportuno. Já que vai se encontrar com Putin, o comportamento ideal seria que Bolsonaro pensasse nos brasileiros que estão aqui e também visitasse a Ucrânia".

Fernanda Krupin relata a rotina dos brasileiros na Ucrânia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Fernanda Krupin relata a rotina dos brasileiros na Ucrânia
Imagem: Arquivo pessoal

Rotina normal nas ruas

A brasileira Paula Corrêa Pereira conta que não há tensão nas ruas. Mas reconhece que há preocupação, principalmente entre seus parentes no Brasil.

"Essa tensão geopolítica não se reflete na população. É uma realidade paralela, eu diria. Os ucranianos, de certa forma, estão tranquilos. Os bares, restaurantes e estabelecimentos comerciais estão funcionando normalmente, e a possibilidade de uma guerra não vem à tona em uma conversa", avalia.

Os estrangeiros são os que ficam mais preocupados, talvez por estarem longe da família. Existem brasileiros que querem deixar o país, que estão preocupados e sem saber o que fazer em caso de invasão. O maior causador do desespero vem do noticiário internacional. Parece uma situação de caos, pânico e desespero. Mas a rotina segue igual"
Paula Corrêa Pereira, que mora na Ucrânia

A modelo brasileira Paula Corrêa Pereira relata rotina na Ucrânia em meio a tensão com a Rússia - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
A modelo brasileira Paula Corrêa Pereira relata rotina na Ucrânia em meio a tensão com a Rússia
Imagem: Arquivo pessoal

Fernanda Krupin traça um cenário semelhante. "Muitas empresas, por serem multinacionais, propuseram mudança do país aos seus funcionários. Mas não houve nenhum tipo de alteração na vida das pessoas na capital. Os brasileiros que conheço aqui só vão sair da Ucrânia se a situação se agravar", diz.

William López, diretor de vendas luso-brasileiro que vive na Ucrânia, não vê pânico entre os ucranianos. "O sentimento e a sensação de insegurança parte mais dos estrangeiros, porque o povo ucraniano já vive sob essa tensão há muito tempo e não acredita em uma invasão. Tenho mulher e filhos, e nós não sentimos essa pressão. O pânico não ajuda em nada", disse, em entrevista ao UOL News.

Malas prontas e atenção ao noticiário

Apesar da tranquilidade na rotina, Paula Corrêa Pereira reconhece ter passado por um momento de incerteza há duas semanas, quando chegou a se articular para uma saída emergencial do país.

"Eu e meu marido estávamos mais atentos e até cogitando a possibilidade de sair e passar um tempo em algum país vizinho. A gente tem uma pasta com reserva de dinheiro e documentos essenciais. Mas conversamos e decidimos ficar", conta.

A decisão se baseou justamente no risco que seria deixar a Ucrânia em meio à tensão. "No caso de ataque, talvez tudo aconteça muito rápido. Nesse cenário, seria seguro sair para algum lugar? O risco seria maior nas ruas do que dentro de casa", avalia.

Decidimos montar uma mala com os nossos documentos se eventualmente precisarmos sair rapidamente. Mas estamos levando uma vida normal. O que mais assusta são as notícias que chegam principalmente de fora do país. É uma situação que gera desconforto e incerteza"
Fernanda Krupin

Em meio à enxurrada de notícias, a preocupação das brasileiras é de passar tranquilidade para a família no Brasil. Paula e Fernanda costumam compartilhar vídeos e fotos para mostrar a rotina delas na Ucrânia.

"Às vezes, a notícia chega de uma forma, mas a realidade é outra. Antes de entrarem em desespero, sempre é bom que as pessoas no Brasil tentem contato com os parentes aqui", recomenda Fernanda."Eu digo para a minha mãe: 'não estou tentando amenizar as coisas, mas é assim que as coisas estão acontecendo'", relata Paula, à espera do momento em que poderá repassar um relato capaz de tranquilizar a sua família no Brasil.