Com investigação inconclusiva e expectativa de indenização, tragédia do AF-447 faz um ano

Arthur Guimarães*
Do UOL Notícias
Em São Paulo

Um ano após sumir dos radares no oceano Atlântico com 228 pessoas a bordo, o avião que fazia o voo AF-447 da Air France entre Rio de Janeiro e Paris no dia 31 de maio de 2009 continua desaparecido no fundo do mar. Mais de 400 pedaços do Airbus A330-200 foram encontrados nestes últimos 365 dias, mas todo o material não soma 5% da aeronave.

Parentes não creem na resolução do caso

Cinquenta corpos foram achados, mas outros 178 perderam-se nas águas e, até hoje, não foram enterrados pelos familiares. As caixas-pretas, essenciais para elucidar o episódio, já não emitem mais sinais há 11 meses e igualmente continuam submersas, em uma área do tamanho de Paris – mas com um relevo tão irregular quanto o da Cordilheira dos Andes.

O mistério que cerca a tragédia ganhou contornos ainda mais dramáticos com a montanha-russa das buscas. Desde o dia da queda, as autoridades francesas encarregadas de explicar o acidente emitiram pelo menos três alarmes falsos, anunciando ter encontrado pistas dos destroços e dos equipamentos que gravam as conversas dos pilotos e registram as informações sobre a condução do voo.

Em junho do ano passado, o diretor do Escritório de Investigação e Análise francês (BEA), Paul-Louis Arslanian, chegou a dizer que a "investigação se aproximava do objetivo de encontrar as causas do acidente". Além disso, o BEA cancelou e retomou três vezes, em um ano, a milionária (US$ 15,8 milhões) caça pelos restos do Airbus, feita através de uma gama de recursos que incluiu navios, radares, aviões, submarinos e até robôs.

Nesse cenário, especialistas já começam a tratar como quase impossível a tarefa de chegar aos detalhes da catástrofe. “Com os dados que as autoridades têm até agora, jamais poderá ser feito um relatório conclusivo. Sabemos que, de fato, distorções em alguns sensores fizeram com que dados sobre a velocidade do avião fossem transmitidos com erros para os comandantes, o que poderia ter influenciado o piloto a fazer manobras de alta intensidade que poderiam levar ao descontrole. Mas é só”, explica Ronaldo Jenquins, especialista no assunto e diretor técnico do Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (SNEA).

Como ele explica, os pedaços da fuselagem encontrados até podem dar pistas do que ocorreu naquela madrugada, mas é provável que as investigações sejam encerradas sem desvendar o mistério sobre a tragédia. “Esse tipo de análise varia de acidente para acidente. Em alguns casos, os destroços ajudam a contar uma história. Infelizmente, sobre a aeronave da Air France, isso ainda não é possível. Temos apenas hipóteses, sem nada consistente”, argumenta ele, que tem mais de 20 mil horas de voo e já atravessou diversas vezes o ponto estimado da queda. “Voar ali não é nada do outro mundo. Tem tempestade? Tem. Tem zona de convergência? Tem. Mas o avião está preparado para isso. É claro que houve algum problema, mas não é possível saber qual.”

Se as investigações parecem engatinhar, as indenizações aos familiares das vítimas parecem andar a passos um pouco mais rápidos. Uma parte dos parentes pode receber as indenizações por danos morais e econômicos a partir de julho. Tendo a Airbus e mais 17 fornecedores como réus no processo – a Air France será acionada posteriormente –, pelo menos 36 famílias de brasileiros (de um total de 58 envolvidas) estão com ações judiciais tramitando na Justiça norte-americana, escolhida estrategicamente pela rapidez e jurisprudência nesse tipo de ocorrência. “Até agora, não recebemos um centavo. Mas nos deram a previsão de que iremos ter um resultado até agosto”, explica Maarten Van Sluys, que perdeu a irmã Adriana na tragédia e hoje é um dos responsáveis pela Associação dos Parentes das Vítimas do Voo 447.

Segundo ele, o tratamento recebido até agora da Air France é frio. “Na época do acidente, mandaram médicos visitar minha mãe, mas nada mais”, diz. Como Van Sluys conta, algumas famílias conseguiram um adiantamento de cerca de R$ 42 mil, mas no geral as pessoas estão esperando a indenização judicial final. “Existem basicamente três divisões de casos: cerca de dez estão sendo arrolados no Brasil, outros estão atuando junto ao escritório de advocacia Podhurst Orseck, em Miami, e ainda há os que tentam o pagamento na França”, afirma.

Posição oficial
A companhia Air France, solicitada a esclarecer pontos sobre o acidente, disponibilizou apenas comunicados de imprensa já divulgados anteriormente.

A Aeronáutica, representada pelo Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), afirmou que tem um representante acompanhando as apurações no BEA. Segundo o órgão, “os indícios de fatores contribuintes para o acidente foram obtidos a partir da análise das mensagens que foram enviadas para a Base de Manutenção da Aeronave na França, mensagens entre tripulação e Controle do Espaço Aéreo, e da análise dos destroços”.

Como diz o Cenipa, “o BEA é o responsável pela investigação” e cabe a ele anunciar as notícias sobre o episódio. Procurado para informar os próximos passos da investigação, o consulado da França em São Paulo, elo brasileiro com o BEA, anunciou que não irá se pronunciar.

O acidente
O avião da Air France, um Airbus-A330, caiu a cerca de 1.500 km de Recife no ano passado. Às 23h14 (horário de Brasília) do dia 31 de maio de 2009, a aeronave emitiu uma última mensagem automática, indicando despressurização e pane elétrica. Equipes de buscas brasileiras e francesas resgataram 50 corpos do oceano, sendo que 20 eram de brasileiros -12 homens e oito mulheres- e 30, de estrangeiros (13 homens e 17 mulheres).

 

Inicialmente, até um raio foi apontado como causador da tragédia. Com o tempo, as autoridades passaram a descartar análises conclusivas, assumindo a falta de provas para tais afirmações.

Deficiências na manutenção do Airbus-A330 podem ter contribuído para o acidente. A informação consta de um relatório preliminar elaborado por peritos judiciais franceses, cujo teor parcial foi divulgado pelo jornal parisiense "Libération". Segundo o jornal, os sensores pitot, que ajudavam o piloto a saber a velocidade da aeronave, podem ter falhado porque não estavam sendo limpos com a devida frequência.

Os sensores, dizem os peritos, ficaram rapidamente cobertos por uma camada de gelo, o que impediu o correto funcionamento dos equipamentos. O avião, antes de cair, atravessava uma forte tempestade. Pouco depois do acidente com o voo AF-447, o congelamento dos sensores já era apontado pelos investigadores como uma das prováveis causas do acidente. Após a queda do avião, a Air France substituiu o equipamento em todos os Airbus A-330 e A-340.

* Com informações da Folha de S.Paulo e de agências internacionais

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