Caso Barroso é bom para separar o bolsonarismo golpista do eleitor de Jair
A polêmica levantada pelas declarações do ministro Luís Roberto Barroso em um evento da UNE, nesta quarta, gerou barulho nas redes e em Brasília.
Taí uma ótima oportunidade para demonstrar a diferença entre o bolsonarismo e os eleitores de Bolsonaro. Até porque todo adepto do bolsonarismo é eleitor de Jair Messias, mas nem todo eleitor de Jair Messias abraça o pacote da extrema direita.
Recapitulando: a extrema direita está em polvorosa nas redes sociais, pedindo o impeachment do ministro do STF Luís Roberto Barroso, por ele ter afirmado, em um evento da UNE (União Nacional dos Estudantes), que "nós derrotamos o bolsonarismo".
"Essa é a democracia que conquistamos. Nós derrotamos a censura, nós derrotamos a tortura, nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia e a manifestação livre de todas as pessoas", foi a declaração de Barroso.
Nesta quinta, ele soltou uma nota afirmando que se referia "ao extremismo golpista e violento que se manifestou no 8 de janeiro e que corresponde a uma minoria". E, diante da repercussão negativa, completou: "Jamais pretendi ofender os 58 milhões de eleitores do ex-presidente nem criticar uma visão de mundo conservadora e democrática, que é perfeitamente legítima".
Barroso certamente aprendeu que importa menos o que ele quis dizer e mais o que o bolsonarismo faz das declarações contra qualquer um que estiver no seu caminho. Mas o caso é didático.
De fato, a sociedade derrotou, nas urnas, o bolsonarismo, movimento violento e antidemocrático que, insatisfeito, tentou um golpe de Estado. O bolsonarismo não se confunde com os eleitores de Bolsonaro — é uma pequena, mas ruidosa, fração deles.
O bolsonarismo não criou a extrema direita no Brasil, mas foi bastante competente em organizá-la, dar-lhe um líder, uma expressão eleitoral e levá-la ao poder.
Contando com elementos neofascistas, essa ideologia abraça o negacionismo científico, o justiçamento no lugar da Justiça, o autoritarismo, o armamentismo e a misoginia. Recorre ao discurso de costumes e comportamentos como instrumentos de controle. Tem no culto à figura de Bolsonaro uma dimensão messiânica, que se sobrepõe às instituições democráticas.
Pesquisas apontam que ela varia de acordo com o nível de ultrapolarização da sociedade, mas raramente ultrapassa os 18%. O que, convenhamos, é muito.
Já os eleitores de Bolsonaro são um universo maior e representam 58,2 milhões de brasileiros (49,1% dos votos válidos) e decidiram depositar seu voto no ex-presidente pelas mais diferentes razões: costumes e comportamento, antipetismo e antilulismo, alinhamento a Paulo Guedes, redução do papel do Estado ou porque concordam com o pacote do bolsonarismo descrito acima.
O show de ilusionismo da extrema direita é querer convencer a sociedade que todo eleitor de Bolsonaro é adepto do bolsonarismo. Para isso, conta, não raro, com uma ajudinha da própria esquerda, que chama equivocadamente todo eleitor do ex-presidente de gado, radical ou fascista, em uma generalização que afasta mais do que une.
Durante as eleições, houve um público que não estava polarizado, nem era militante de Lula ou Bolsonaro, com pautas que os conectavam aos dois, principalmente na classe trabalhadora. Uma parte se reconectava a Lula, com base no legado de cuidado dos pobres do passado, outra se desconectava dele pela pauta moral, simbólica e de costumes ligada a Bolsonaro.
Momentos como este, de polêmica nas redes, são usados pelo bolsonarismo para tentar convencer que é bem maior do que realmente é. Cabe aos adultos na sala tomarem cuidado com o que falam, para não alimentar os pombos, mas também ao restante a não cair nas armadilhas deixadas por aqueles que querem fazer crer que metade da população compartilha dos mesmos ideais antidemocráticos e golpistas.