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Thaís Oyama

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Palácio foi pego de surpresa com Centrão -- capaz de tudo, menos de perder

O quase ex-ministro Ramos, ?atingido por um trem?: menos desenvolto que seu sucessor  -  Marcos Corrêa/PR
O quase ex-ministro Ramos, ?atingido por um trem?: menos desenvolto que seu sucessor Imagem: Marcos Corrêa/PR

Colunista do UOL

22/07/2021 09h27

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O general e quase ex-chefe da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, sentiu-se "atropelado por um trem", como confessou à colunista Eliane Cantanhêde; a ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, até a manhã de ontem não tinha a mais remota ideia do que estava por acontecer; e o cansado general do GSI, Augusto Heleno, que recentemente foi obrigado a ficar uma semana de molho em casa por causa de dores na coluna, tampouco foi ouvido na manobra guiada pelo colega Fabio Faria para levar o Centrão ao coração do governo.

Faria, o jovem ministro das Comunicações de Bolsonaro, tinha 38 anos quando o PP, partido para o qual está de mudança, virou peça fundamental na batalha do impeachment de Dilma Rousseff. Na qualidade de quarta maior bancada da Câmara, a sigla, já então presidida por Ciro Nogueira, passou a ser alvo de assédio tanto dos dilmistas quanto do grupo rival, o do vice-presidente Michel Temer.

Ciro, mesmo quando o PMDB já havia jogado Dilma aos leões, prometeu à presidente que o PP ficaria com ela até ao menos a conclusão do processo. Às vésperas da votação, a petista chamou o senador. "Ciro, posso contar com você?", perguntou. A resposta do cacique do Centrão, relatada por ele próprio a amigos, entrou para os anais da política nacional: "Presidenta, eu preferia ganhar com a senhora, mas eu só não posso perder".

Ciro Nogueira e o Centrão, como se sabe, não perdem nunca.

Da base do governo Dilma, o PP pulou para a base do governo Temer, de onde, pouco depois, passou a mandar beijos para Lula, em quem Ciro declarou voto em 2018. Agora, o senador está pronto para oferecer seus relevantes serviços a Jair Bolsonaro - o presidente que ele chamou de "fascista" e que nunca mais poderá pronunciar em público a expressão "velha política", a não ser, claro, se for para elogiar.

Mas se a nomeação de um senador e cacique do Centrão irá desgastar ainda mais a imagem do governo e constranger bolsonaristas com a garganta roída de engolir quadrado, ajudará a amenizar vários problemas do presidente, sendo o principal deles a ameaça do impeachment.

Na Câmara, o presidente Arthur Lira e seus 11 bilhões de reais em emendas RP 9 prometem segurar o rojão. Já no Senado, liderado por um potencial rival de Bolsonaro nas eleições de 2022, Rodrigo Pacheco, a posição do presidente era mais frágil. O senador do Piauí e futuro ministro plenipotenciário da Casa Civil cuidará de reforçar esse laço por meio da liberação e distribuição dos quase 6 bilhões de reais em emendas com potencial de desanuviar qualquer mal-estar entre o Executivo e a Casa. No Congresso, ninguém tem dúvidas de que ele cumprirá a tarefa com muito mais desenvoltura que o general Ramos ou a pouco experiente ministra Flávia Arruda (PL-DF).

Da parte do senador do Piauí, sua ida para o governo lhe traz ganhos na pessoa física e na jurídica. Para começar, como novo ministro, ele se desincumbe da tarefa de concorrer ao governo de seu estado, onde pesquisas mostram o ex-presidente Lula com até 65% das intenções de voto. Leva ainda o bônus de escapar do ambiente da CPI da Covid, onde seu nome circulou na semana passada ao lado de um suposto esquema de desvio de dinheiro envolvendo uma empresa contratada para transportar vacinas. Sobretudo, o cacique do PP, com sua nomeação, consolida a liderança da holding do Centrão com a promessa de reagregar partidos que, como o PL, já se mostravam tentados a se desgarrar do acordo societário do bloco para passear sozinhos no mercado.

Da parte do governo, as expectativas com a contratação do chefe do bloco que é a encarnação do "establishment", como dizia até há pouco o "gabinete do ódio", são mais simples: chegar inteiro e competitivo em 2022.

Se der certo, Bolsonaro pode contar com o Centrão ao seu lado.

Se der errado, o presidente, como sua antecessora, ficará falando sozinho. O Centrão é capaz de tudo, só não pode perder.