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Cineasta e equipe remota figuram em acusações de Russomanno contra Boulos

Candidatos à prefeitura de São Paulo (da esq. para dir.) Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL)  participam de debate promovido pelo UOL e Folha de S. Paulo - Mariana Pekin/UOL
Candidatos à prefeitura de São Paulo (da esq. para dir.) Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL) participam de debate promovido pelo UOL e Folha de S. Paulo Imagem: Mariana Pekin/UOL

Lucas Borges Teixeira*

Do UOL, em São Paulo

11/11/2020 16h56Atualizada em 11/11/2020 17h40

As duas produtoras que estão no centro das acusações de Celso Russomanno (Republicanos) contra Guilherme Boulos (PSOL) no debate UOL/Folha são de uma diretora de cinema freelancer e de uma equipe que trabalha remotamente. Ambas estão registradas e foram declaradas nos gastos da campanha.

As empresas em questão são a Kyrion Consultoria e a Filmes de Vagabundo. A primeira foi contratada por R$ 500 mil e a segunda, por R$ 28 mil, de acordo com as despesas declaradas pelo candidato.

O vídeo foi divulgado no mesmo horário em que acontecia o debate UOL/Folha por um dos principais acusados no inquérito das fake news que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal), o blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio. A publicação aponta para um suposto "laranjal" de Boulos. Eustáquio já foi preso dentro dessa investigação.

A campanha de Russomanno não esclareceu ao UOL se a acusação contra Boulos foi pautada no vídeo produzido por Oswaldo Eustáquio. A reportagem questionou se o candidato tem conhecimento sobre a disseminação de notícias falsas por parte do blogueiro, mas não houve retorno. Um assessor afirmou que "independente da fonte, se for verdade é muito grave. A nossa equipe vai levantar esse caso".

A acusação

Segundo Russomanno, uma "equipe de reportagem" teria divulgado nas redes sociais que procurou duas produtoras, mas não encontrou ninguém nos locais indicados. Isso é mostrado em um vídeo que circula pelas redes sociais desde a manhã desta quarta (11).

A equipe de Boulos nomeou as acusações como "fake news" e informou que os funcionários não foram encontrados por dois motivos: a Kyrion está trabalhando remotamente por conta da pandemia do novo coronavírus, como consta no contrato assinado com a campanha, e a Filmes de Vagabundo está com o endereço comercial desatualizado.

Após o debate, Boulos chamou a denúncia de "absurda" e entrou com uma ação na Justiça Eleitoral contra o vídeo publicado nas redes sociais. "Russomanno se aproveitou de o endereço estar desatualizado para dizer que a empresa é fantasma. É um nível de leviandade, de desespero", declarou Boulos.

A Kyrion Consultoria e Análise em Comunicação foi registrada no dia 12 de maio deste ano com o objeto social de "atividades de consultoria em gestão empresarial, exceto consultoria técnica especifica" sob o Nire (Número de Identificação do Registro de Empresas) 35236006745.

Segundo a Jucesp (Junta Comercial do Estado de São Paulo), ela foi aberta com um capital de R$ 10 mil e seu logradouro é na Vila Pirajussara, zona oeste. Não foi encontrado um site oficial.

Entre as atividades, consta ainda marketing direto, realização de pesquisas de mercado e de opinião pública, seleção e agenciamento de mão de obra e desenvolvimento e licenciamento de programas de computador customizáveis.

"Para prestar os serviços, a Kyrion conta com uma equipe com cerca de 20 colaboradores. O contrato entre a campanha e a Kyrion permite que, por razão da pandemia de covid-19, os serviços sejam prestados remotamente pela equipe, razão pela qual não há atividade de campanha na sede administrativa da empresa", informou a equipe do PSOL.

Fundada em 2012, a Filmes de Vagabundo é apresentada como uma produtora independente que já lançou curtas e um longa metragem que parcitipou do Festival de Gramado. Seu site oficial está desativado.

Segundo a Jucesp, ela está localizada na Vila Dom Pedro I, no Ipiranga, zona sul de São Paulo, e tem capital de R$ 3 mil. É este endereço que a campanha afirma que está desatualizado.

Em suas atividades consta produção cinematográfica de vídeos, de programas de televisão e de filmes para publicidade, produção teatral e aluguel de máquinas e equipamentos comerciais e industriais, sem operador.

"A produtora Filmes de Vagabundo pertence à cineasta Amina Jorge, diretora de audiovisual da comunicação digital da campanha. Ela trabalha como freelancer e o valor de R$ 28 mil diz respeito à sua remuneração por todo o período eleitoral", afirmou a campanha, por meio de nota.

Segundo o UOL apurou, a empresa continua a prestar serviços normalmente. Em 2018, venceu um edital da SPCine para produzir um vídeo sobre bairros da cidade de São Paulo. A reportagem tentou entrar em contato com as duas produtoras, mas não teve sucesso até a última atualização. Se enviado, seu posicionamento será incluído aqui.

"A tal da produtora de cinema, que eles dizem que é uma empresa fantasma, tem filmes que foram para mostras internacionais de cinema", disse Boulos em agenda de campanha nesta tarde.

Maior parte do financiamento vem do partido

De acordo com a prestação de contas no TSE, a principal fonte de financiamento da campanha de Boulos é o partido. Dos R$ 3,2 milhões arrecadados, R$ 2,7 milhões vieram do "fundo especial de financiamento de campanha".

Outros R$ 78 mil vieram de doações de pessoas físicas e R$ 427 mil, de financiamentos coletivos.

Investigado no inquérito das fake news

A "equipe de reportagem" que Russomanno cita, na verdade, é uma publicação feita pelo blogueiro Oswaldo Eustáquio, um militante bolsonarista que foi preso pela Polícia Federal em 26 de junho. Ele é um dos principais envolvidos no inquérito das fake news.

A PF alegou que o blogueiro estava utilizando táticas para não ser localizado e o prendeu para amenizar o risco de fuga.

Ele é investigado na Operação Lume, inquérito que apura financiamento, apoio e organização de atos antidemocráticos que defendem o retorno da Ditadura Militar e o fechamento do Congresso e do STF (Supremo Tribunal Federal).

O blogueiro já apareceu em lives com o ex-deputado condenado no processo do "mensalão" Roberto Jefferson, quando o líder do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro) defendeu que haveria uma tentativa de golpe contra Jair Bolsonaro (sem partido). Ele também foi assessor da ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, durante o governo de transição.

O militante, também alvo da ação, é "figura carimbada no mundo da política", diz a petição apresentada à Justiça pelo PSOL. "É conhecido por trabalhar com a 'destruição de reputações' por encomenda", traz o texto, citando reportagem do site The Intercept.

"Houve patente difamação da imagem de Guilherme Boulos e calúnia", diz a defesa de Boulos.

*Colaborou Nathan Lopes, do UOL, em São Paulo.