O despertar do voto latino não foi suficiente para a vitória de Hillary

Nicolas Bourcier

  • REUTERS/Carlos Barria

    Hillary Clinton discursa após ser derrotada por Donald Trump nas eleições norte-americanas; ao fundo, o marido Bill Clinton, ex-presidente

    Hillary Clinton discursa após ser derrotada por Donald Trump nas eleições norte-americanas; ao fundo, o marido Bill Clinton, ex-presidente

Os discursos de Trump contra os imigrantes mexicanos mobilizaram os eleitores hispânicos contra ele. Em vão.

O "gigante adormecido" acordou. A minoria hispânica, assim chamada pela imprensa, foi atiçada pelo efeito Trump e correu em peso para os postos de votação. No entanto, ela não foi capaz de impedir a inacreditável e assombrosa vitória do candidato republicano.

Segundo os números, os dados coletados nos Estados com forte presença hispânica indicavam de maneira inequívoca, antes mesmo de terça-feira (8), um aumento excepcional de votos antecipados. Na Carolina do Norte, o índice de participação dos latinos ultrapassava em 85% o índice obtido quatro anos atrás. Na Flórida, dos 6,2 milhões de votos antecipados, 1 milhão vieram dos latinos, ou seja, 75% a mais que em 2012. E quase 36% deles estavam participando pela primeira vez de uma eleição. A derrota foi amarga.

Anunciado em 2012, o despertar latino acabou se perdendo nas contagens estatísticas, amplamente dominadas pelo incrível avanço de Barack Obama entre o eleitorado branco e negro do norte do país. Não havia como negar os números, o voto hispânico não havia aumentado em relação às eleições de 2008, e isso, apesar do crescimento na faixa demográfica e dos debates sobre uma reforma da imigração que, afinal, não virá.

Naquele ano, uma maioria de latinos (2/3) votaram no candidato democrata, que havia prometido lhes "abrir o caminho para a cidadania". Mas Obama deu preferência à reforma do sistema de saúde. Ele também fez um aceno aos republicanos ao dar continuidade ao reforço da fronteira lançada por seu antecessor George W. Bush, e realizou quase 375 mil deportações por ano.

Choque

Desde então, a cada ano cerca de 803 mil jovens hispânicos completaram 18 anos, idade em que se pode votar. Mas a participação dos latinos nas eleições permaneceu sistematicamente fraca, de 47% em 2012, ante 67% entre os negros. Eles também adotaram menos rapidamente a nacionalidade americana, em relação aos outros estrangeiros, um dado ainda mais pronunciado entre os imigrantes mexicanos.

"Ao contrário das pessoas vindas da Ásia ou da América Central que procuram se instalar ou estudar, os mexicanos são imigrantes antes de tudo econômicos, sendo que grande parte dos mais velhos têm a ideia de voltar ao país depois de aposentados", ressalta Mark Lopez, diretor de pesquisas do Pew Research Center.

Em 2013, dos 8,8 milhões de residentes legais qualificados para uma naturalização, quase 2,7 milhões eram mexicanos, ou seja, o maior número de cidadãos estrangeiros registrados pelas autoridades. Mas somente 36% haviam optado por se tornar cidadãos americanos, sendo que esse índice é de 68% entre todos os outros imigrantes legais.

Em junho de 2015, o discurso de candidatura de Donald Trump em Nova York causou um choque, comparando os imigrantes mexicanos a "estupradores" e "traficantes". Pouco depois, ele prometeu construir um muro ao longo da fronteira "pago pelo México" e "expulsar 2 milhões de criminosos estrangeiros assim que pusesse os pés na Casa Branca."

Motivados pelo temor de ver o empresário aplicando seu programa, famílias inteiras latinas correram para as urnas. Tanto que o número de novos eleitores hispânicos se tornou "verdadeiramente histórico", ressaltou Daniel Smith, professor de ciências políticas na Universidade da Flórida, que ainda acrescentou, a alguns dias da eleição e sem nenhuma ironia: "Donald Trump fez mais do que qualquer outro candidato democrata."

Movimento amplificado

Já Hillary Clinton soube agarrar a oportunidade de acompanhar e amplificar o movimento. Antes mesmo do início das primárias, a ex-secretária de Estado e suas equipes entenderam muito cedo o potencial inexplorado dos eleitores hispânicos, que segundo os últimos números representavam 27,3 milhões, ou seja, 26% a mais do que em 2012. Em Nevada, logo nos primeiros dias de campanha, Hillary se encontrou com grupos de mulheres e apresentou suas propostas para a educação e a saúde.

"A história dessas eleições talvez seja a da mobilização dos hispânicos", avaliou Lindsey Graham alguns dias antes dos resultados das eleições. O senador republicano da Carolina do Sul e anti-Trump não estava completamente errado. Só que a mobilização não foi suficiente.

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