Por que a campanha de Alckmin ainda sofre resistência?

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo

  • Ricardo Borges/UOL

    Geraldo Alckmin é o pré-candidato do PSDB à sucessão presidencial

    Geraldo Alckmin é o pré-candidato do PSDB à sucessão presidencial

Apesar de quase oito anos em dois mandatos seguidos no maior colégio eleitoral do país, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) ainda não viu sua candidatura à Presidência da República decolar nem nos bastidores de seu próprio partido nem nas pesquisas eleitorais de intenção de voto.

O UOL conversou com políticos tucanos e com analistas da conjuntura política nacional sobre os fatores que explicam, na avaliação deles, a aparente resistência ao nome do afilhado político de Mario Covas (1930-2001), bem como os elementos que consideram fundamentais para que o quadro se reverta.

A última disputa nacional de Alckmin foi contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2006, quando perdeu no segundo turno cerca de 2,4 milhões de votos em relação ao primeiro.

Veja, a seguir, os principais pontos elencados pelos entrevistados:

1 – Mau desempenho nas pesquisas

Um dos pontos em que a candidatura de Alckmin ainda esbarra e gera desconfiança em possíveis aliados é o desempenho tímido do tucano nas pesquisas de intenção de votos.

Com índices que oscilam entre 10%, e, mais recentemente, 5%, nas últimas pesquisas nacionais, Alckmin chega a ficar atrás do deputado federal Jair Bolsonaro (PSL) em seu próprio estado, onde se reelegeu com facilidade em 2014, no primeiro turno.

Entre tucanos, há o entendimento de que, embora seja conhecido, o ex-governador de São Paulo teve pouco tempo de exposição ao eleitor como nome no páreo, já que se desincompatibilizou do cargo há menos de dois meses.

Outra aposta é a de que as pesquisas terão outro impacto a partir de julho ou agosto --após a Copa do Mundo e as convenções partidárias, quando as candidaturas serão oficializadas.

"Já vi muito candidato começar na pesquisa com um percentual alto e não ir para o segundo turno", afirma o deputado federal e 2º vice-presidente da executiva nacional tucana, Ricardo Trípoli (SP). Para ele, ex-governador "tem um nível de conhecimento bom", ainda que discreto.

"Ele não é um candidato que faz estardalhaço, como o Ciro [Gomes, do PDT]", compara. "Mas agora é tudo muito articulação. A tendência é a campanha começar mesmo depois da Copa do Mundo. Vai ser uma avaliação do passado do candidato", avalia Trípoli.

Alckmin minimiza pesquisas eleitorais: "O que é decolar?"

Líder do PSDB no Senado, o catarinense Paulo Bauer também apontou "pouco tempo de campanha" como responsável fundamental pelo desempenho apático de Alckmin nas últimas sondagens.

"Falta tempo de campanha. Alckmin começou a fazer campanha no dia 8 de abril deste ano apenas. Na medida em que os dias passam, e em que ele possa expor ideias ao conversar com segmentos organizados da sociedade, bem como comparecer a eventos, obviamente que ele vai crescer", afirma Bauer.

O desempenho de Alckmin nas pesquisas, porém, também é alvo de críticas no partido. O prefeito de Manaus, Arthur Virgilio, que chegou a ser adversário do ex-governador na busca por uma indicação à disputa presidencial, não tem poupado o paulista.

"É uma situação muito estranha ele empatar com Bolsonaro, ainda mais em São Paulo. É como se não estivesse fazendo o dever de casa no próprio estado e sempre acreditando nas articulações. Com partidos e políticos, mas sem mostrar nada do que a cabeça do eleitor está pedindo", diz Virgilio.

Para o professor de Ciência Política da FGV (Fundação Getulio Vargas) Marco Antonio Teixeira, é possível que a campanha ganhe mesmo mais fôlego depois da Copa do Mundo. Mas ele pondera: "Alckmin não é marinheiro de primeira viagem. Essa lógica vale mais para quem não é tão conhecido", afirma.

Segundo Teixeira, a estagnação do tucano nas pesquisas pode ser explicada substancialmente pelo desempenho dele em São Paulo. "Alckmin deixou o governo agora com pouco mais de 30% de aprovação. Em 2006, tinha mais de 60%. Além disso, o PSDB historicamente dominava em Minas, o que se perdeu na eleição passada [Dilma Rousseff bateu Aécio Neves em 2014]. Ou seja: perderam a dominância em dois estados muito importantes no contingente de eleitores e não apresentaram alternativas a isso, ainda", pondera.

Indagado sobre o assunto na sabatina UOL/Folha/SBT, há duas semanas, Alckmin minimizou os resultados. "Pesquisa eleitoral nesse momento não está olhando o futuro", declarou. "Eu tenho de 6 a 12%. Eu não decolei. O que é decolar? Até 15 dias atrás, tinha 22 pré-candidatos. Isso é fruto da falta da reforma política", avaliou.

"Não passamos a mão na cabeça de ninguém", diz Alckmin sobre Azeredo

2- Aécio e Azeredo encrencados com a Justiça

Nas últimas semanas, o PSDB viu dois de seus ícones sofrerem duros revezes na Justiça. Segundo colocado na disputa presidencial de 2014 por uma margem apertada de votos, o senador e ex-governador mineiro Aécio Neves se tornou réu em processo de corrupção por conta do escândalo da J&F.

Já o ex-senador e ex-governador por Minas Eduardo Azeredo foi condenado e preso no processo sobre o mensalão tucano, em Minas, após uma série de recursos ao longo de 11 anos.

Para o líder do partido no Senado, Azeredo e Aécio "são problemas de pessoa física, não jurídica". "Imagina se, em uma igreja, um pastor fosse penalizado cada vez que um dirigente cometesse alguma falha? Queremos que a Justiça cumpra o seu papel. Questões pontuais não prejudicam, nem comprometem, como um todo, o partido", afirma Bauer.

Quem também minimizou o impacto do fator Aécio-Azeredo no cenário presidencial foi o cientista político Bolívar Lamounier, um dos fundadores do PSDB.

"Lula foi hábil em achatar todo mundo, mas o eleitor sabe que nem todos são iguais. Alckmin tem uma acusação vaga de caixa dois, não vai além disso. O eleitor está um pouco perplexo, vivendo em um mundo em que ele nunca viveu, envolto em corrupção, mas hoje qualquer chofer de táxi sabe os nomes dos ministros do Supremo. Há um tema novo, uma dimensão nova, e essa dimensão, por ora, não está muito ligada a eleições", declarou.

Sobre os correligionários, também na sabatina, Alckmin foi taxativo: "O PSDB não é imune à crítica, a prestar contas ao Poder Judiciário. Nós não passamos a mão na cabeça de ninguém. Justiça se cumpre. É para o PT, para o PSDB, é para todos os partidos. Ninguém está acima da lei", declarou, na ocasião.

Especificamente sobre Aécio, porém, o ex-governador afirmou ter "a impressão de que ele não será candidato" este ano, ao ser questionado se subirá no palanque de Aécio em Minas Gerais ou se receberia o senador em seu comício.

Alckmin diz que Aécio não será candidato e que não subirá em palanque

3 - Investigação contra Alckmin

Além das implicações de Aécio e Azeredo com a Justiça, o próprio Alckmin é alvo de investigação sobre suspeita de caixa 2 na eleição de 2010.

Em acordo de delação, representantes da Odebrecht, empresa investigada na Operação Lava Jato, relataram a entrega de R$ 10,7 milhões, não declarados, ao cunhado de Alckmin, o empresário Adhemar Ribeiro, na campanha de 2010. A Odebrecht tem a concessão de algumas das principais rodovias paulistas, como o complexo Anhanguera-Bandeirantes e trechos da rodovia Castello Branco e da Raposo Tavares.

Em maio, reportagem da Folha de S.Paulo apontou que representantes da CCR, maior concessionária de estradas do país e quinta do mundo, relataram ao Ministério Público de São Paulo que teriam dado cerca de R$ 5 milhões à campanha do tucano sem que esse recurso tivesse entrado na prestação oficial de contas. O dinheiro também teria sido entregue ao cunhado do ex-governador.

No último domingo (3), também na Folha, o criminalista Marcelo Martins de Oliveira, que faz a defesa de Alckmin, afirmou que, nas cópias integrais da investigação sobre a CCR, após a reportagem de maio, "simplesmente não consta nenhuma referência, muito menos acusação, sobre Geraldo Alckmin." "O fato, noticiado como verdadeiro, não existe. Não havia nem sequer menção indireta ao ex-governador", escreveu.

Na avaliação do professor Teixeira, da FGV, as implicações de Azeredo e Aécio em casos de corrupção e a própria citação de Alckmin na investigação de caixa 2 comprometem o desempenho do ex-governador à medida em que provocam um descolamento entre o discurso do partido e a prática.

"Em 2006 e 2010, os tucanos surfaram na onda de combate à corrupção por conta do escândalo do mensalão. Em 2014, a mesma coisa, mas na onda da Lava Jato. Agora, os efeitos da Lava Jato sobre o PSDB, como em relação às grandes siglas partidárias, revela ao eleitor que a bandeira de moral e bons costumes que antes defendiam não pega mais em relação a eles", diz.

Tanto quanto a de 2016, essa será uma eleição de análise de reputações

Marco Antonio Teixeira, professor de Ciência Política da FGV 

Alckmin afirmou que se sente "indignado" com as suspeitas de supostos crimes ocorridos em suas campanhas eleitorais e disse que "não tem absolutamente nada" nas investigações sobre ele. Sobre o caso da CCR, em que o cunhado foi citado, foi taxativo: "Nunca vi ninguém, é um absurdo verdadeiro, ajudar alguém que sabe de antemão que vai trabalhar contra os seus interesses", afirmou. Sobre o suposto caixa 2 da Odebrecht, resumiu: suas campanhas "foram feitas dentro da lei, sem ostentação". Ele também defendeu o cunhado, a quem se referiu como "casado com banqueira e simpatizante do PSDB. Só isso".

Alckmin rebate acusações sobre ter recebido propina da CCR

4 – Proximidade com a "política tradicional" e com Temer

Professor de marketing político na Faap (Fundação Armando Álvares Penteado) e na USP (Universidade de São Paulo), Celso Matsuda indicou que a resistência ao nome do ex-governador pode ter relação com o desgaste gerado à imagem dele pela associação à imagem de um presidente com baixíssima popularidade, como Michel Temer (MDB), além da dos antigos aliados que são alvo de processos judiciais.

"Ele está vinculado a um partido e a um grupo de lideranças do partido que se desgastaram. Aécio e Azeredo, por exemplo. Mesmo PT e MDB estão sofrendo as consequências dessa péssima imagem gerada como consequência da operação Lava Jato. E isso atinge figuras como Alckmin. Você olha para ele e faz a ilação direta entre uma coisa e outra. Ele sofre as consequências de uma rejeição por conta dessa possibilidade", afirma.

Se por um lado um eventual apoio do MDB garantiria maior tempo de TV a Alckmin, por outro, destaca Matsuda, implicaria ao tucano carregar "o fardo do governo Temer", representado não só pela baixa popularidade do medebista, como por uma política também pouco popular. O MDB, por enquanto, mantém a pré-candidatura de Henrique Meirelles.

"Em outras circunstâncias, Alckmin e o PSDB agarrariam com muita vontade essa união com o MDB, que tem uma base espalhada e um grande número de prefeitos. Isso tudo ajuda. Mas há um receio de parte do tucanato porque Temer exigiria que o PSDB abraçasse o governo dele", explicou.

Marcelo Chello/CJPres/Estadão Conteúdo
Para professor, um eventual apoio do MDB implicaria a Alckmin carregar "o fardo do governo Temer"

Matsuda trabalha com marketing político e eleitoral desde 1996. Já atuou com campanhas de Mario Covas, do próprio Alckmin e outros partidos.

O aspecto "tradicional demais" foi apontado também por Arthur Virgilio, para quem Alckmin não avança "porque você não vê uma frase interessante dele, algo que revele brilho, ainda que tenha uma grande equipe e uma pessoa como [o economista] Pérsio Arida [coordenador do programa econômico] nela."

"Não basta você mostrar um projeto de reformas, se, quando estava com a mão da massa, não apoiou, por exemplo, a reforma previdência e ficou em um jogo de empurra sobre o tema", disse.

Uma solução apontada pelo prefeito é Alckmin abrir mão da presidência do partido e se dedicar exclusivamente à própria candidatura. "Ele virou presidente sendo pré-candidato e não abre mão de acumular isso. Ou bem se é candidato, ou bem se é presidente de um partido. Vejo adiante um quadro muito complicado", sintetizou.

Para Bolívar Lamounier, entretanto, o descontentamento com a política tradicional pode ser, na realidade, "rancor" do eleitorado "saindo de uma recessão". "Há essa ideia de que 'tem que mudar', então, a demanda por novidade está favorecendo Alckmin", defende.

"Quando Bolsonaro for inquirido na TV, será triturado. Alckmin foi governador de São Paulo nos últimos anos e não deverá falar bravatas no palanque. Se ele fala de maneira pausada, serena, quer mostrar muito mais conteúdo e raciocínio do que se se exibir em um palco. Ele não deve tentar se passar por um líder carismático, porque ele não é, ele não tem essa qualidade – isso é para o Ciro, que não tem conteúdo nenhum e será um bravateiro", alfineta.

5 – A sombra de Doria

Após um segundo semestre de 2017 em tentativa de campanha pela Presidência, o nome do agora ex-prefeito João Doria é outro que ronda o padrinho político. O analista da FGV classifica a cena como "o espectro João Doria" e destaca que a própria predileção de Alckmin pelo empresário, em uma prévia que causou divisões no PSDB paulista em 2016, tem impacto agora sobre o ex-governador.

"Alckmin rachou o partido na eleição de 2016 com o apoio a Doria [tucanos históricos como Andrea Matarazzo e, mais recentemente, Mario Covas Neto deixaram a sigla contrariados com o apoio ao empresário]. Doria, por sua vez, buscou se viabilizar como nome ao Planalto passando por cima de seu próprio fiador, que não me parece exatamente satisfeito com sua candidatura ao governo do estado. Isso pode ter inviabilizado uma aliança nacional com o PSB, de Márcio França [ex-vice de Alckmin, agora governador]", destacou.

"Por sinal, Doria é candidato ao governo, mas mantém um discurso de presidenciável", observou.

Que medidas ele sugere ao ex-governador? "Falar como centro, e, nessa condição, fugir dos extremos. Doria cria uma armadilha para si mesmo ao se colocar como 'o anti-Lula' – importante lembrar que o ex-presidente tem mais de 30% do eleitorado em disputa. Se Alckmin apresentar pontos de eficiência em seu governo em São Paulo que possam ser expandidos ao Brasil, mas dialogando e propondo construir sobre as diferenças, é capaz que o cenário a ele mude", afirma.

Sobre o "espectro Doria", o ex-governador, na sabatina do UOL, atribuiu a possibilidade a "fake news", criticou a "criatividade" da imprensa e citou nomes que não vingaram, como o do apresentador Luciano Huck e do ex-ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa.

Sobra de Doria é "fake news", diz tucano

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