Reforma trabalhista

Mourão critica 13º e adicional de férias, e Bolsonaro desautoriza vice

Janaina Garcia

Do UOL, em São Paulo*

O candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro (PSL), o general da reserva Hamilton Mourão (PRTB), fez críticas ao pagamento de 13º salário e ao adicional de férias ao trabalhador brasileiro durante palestra a empresários no interior do Rio Grande do Sul nessa quarta-feira (26). Logo após o conteúdo ser divulgado pela imprensa, Bolsonaro criticou a declaração de seu colega de chapa.

Convidado da CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas) de Uruguaiana, Mourão prometeu, a uma plateia composta por empresários e representantes de associações e sindicatos patronais, a realização de reformas tributária e trabalhista em um eventual governo Bolsonaro. O capitão da reserva lidera as últimas pesquisas de intenção de votos à Presidência.

Ao se referir especificamente à reforma trabalhista pretendida, Mourão classificou como "jabuticabas" direitos trabalhistas que acabam onerando, segundo ele, os patrões, e elencou entre elas o 13º salário --instituído em lei desde 1962, além da Constituição Federal de 1988.

Temos algumas jabuticabas que a gente sabe que é uma mochila nas costas de todo empresário. Jabuticabas brasileiras: 13º salário. Se a gente arrecada 12, como é que nós pagamos 13 [salários]?

Hamilton Mourão (PRTB), candidato a vice-presidente

"É complicado, e é o único lugar em que a pessoa entra em férias e ganha mais, é aqui no Brasil. São coisas nossas, a legislação que está aí, é sempre aquela visão dita 'social' [faz aspas com as mãos], mas com o chapéu dos outros, não é com o chapéu do governo", continuou.

No Twitter, Bolsonaro se manifestou sobre a fala do vice. "O 13° salário do trabalhador está previsto no art. 7° da Constituição em capítulo das cláusulas pétreas (não passível de ser suprimido sequer por proposta de emenda à Constituição). Criticá-lo, além de uma ofensa à quem trabalha [sic], confessa desconhecer a Constituição", escreveu.

Ao UOL, por mensagem de WhatsApp, Bolsonaro --internado no hospital israelita Albert Einstein, em São Paulo --afirmou que "seria bom" que Mourão pudesse participar de debates com outros candidatos a vice-presidente "para exatamente botar em pratos limpos" suas críticas ao 13º salário e direitos trabalhistas.

A reportagem tentou entrar em contato com Mourão, mas ele não atendeu as ligações. Adversários de campanha criticaram a declaração (leia abaixo).

Em seu discurso, o vice de Bolsonaro defendeu a realização das duas reformas como forma de "priorizar gastos" e citou o responsável pelo programa econômico da campanha, Paulo Guedes.

"Ele vem falando há oito meses no mercado... surgiu aquela história da CPMF. Vamos lembrar que é um imposto que anda em cascata, ela vai tributando em cascata. Agora, para que ocorra algum tipo de imposto dessa natureza, os outros [impostos] têm que ser baixados. Temos hoje em torno de R$ 192 bilhões de desonerações, ou seja, o pessoal que não paga imposto", reclamou Mourão.

Na avaliação do general, "teremos que paulatinamente ir organizando isso [o fim da desoneração], não pode ser cortado da noite para o dia". Ele mencionou fechamento de "25 mil indústrias" e tributaristas "como o professor Marcos Cintra, gente que entende do assunto", que estão, segundo ele, "trabalhando no assunto".

"A filosofia é uma só: temos que colocar todo mundo na base, todo mundo pagando, tem muita gente que não paga", disse.

Sobre a reforma trabalhista, Mourão também fez questão de criticar o peso do imposto sindical "em cima da atividade produtiva". "É o maior custo que existe", classificou. A obrigatoriedade de recolhimento do imposto, entretanto, foi derrubada pelo governo de Michel Temer (MDB) no final do ano passado.

Após a repercussão do assunto, Mourão enviou, através de sua assessoria de imprensa, nota dizendo que suas declarações foram distorcidas. "O general Hamilton Mourão esclarece que mais uma vez sua fala foi descontextualizada ou interpretada de forma equivocada por um veículo de comunicação, nesta reta final de campanha eleitoral", diz a assessoria "O contexto foi em torno do planejamento gerencial necessário para que o 13º salário seja pago, ou seja, governos e empresários devem reservar, ao longo do ano, recursos de modo a fazer frente à despesa. Trata-se de um custo social, que faz parte do chamado custo Brasil", completa.

Declarações polêmicas do general 

Bolsonaro está fora das agendas de rua da campanha desde o ataque a faca sofrido durante um ato eleitoral em Juiz de Fora (MG) no último dia 6.

Em agosto, em seu primeiro evento público como candidato, Mourão declarara que o "caldinho cultural" do Brasil inclui a "indolência" dos povos indígenas e a "malandragem" dos negros africanos. A posição foi expressada em evento na Câmara de Indústria e Comércio de Caxias do Sul (RS).

Na mesma ocasião, se referiu a famílias pobres "onde não há pai e avô, mas, sim, mãe e avó", por exemplo, como "fábricas de desajustados" que fornecem mão de obra ao narcotráfico.

Assim como a posição a respeito de benefícios trabalhistas, ele também falara sobre o assunto em palestra a empresários, ao traçar um paralelo entre formação da família e ação de bandidos em áreas carentes.

Sobre isso, explicou depois aos companheiros de campanha que a fala sobre mães e avós se referia a uma situação em que um homem larga sua mulher e filhos e a mulher acaba forçada a trabalhar mais horas longe de casa para sustentar a família -- de modo que os filhos ficariam expostos a más influências.

No começo deste mês, após o ataque contra Bolsonaro em MG, o militar da reserva voltou a ganhar notoriedade ao cogitar uma intervenção militar em caso de "anarquia". Nesse contexto, defendeu uma nova Constituinte sem participação popular --feita por um "conselho de notáveis" e só então submetida a plebiscito.

Economista polemizou sobre IR e CPMF

Além de Mourão, quem também polemizou durante a campanha do candidato do PSL foi Paulo Guedes, espécie de guru que é chamado por Bolsonaro de "Posto Ipiranga". O economista cancelou pelo menos três eventos nos últimos dias ante a repercussão negativa de declarações dele e de Mourão. Ambos foram orientados a reduzir aparições públicas e o contato com a imprensa.

Dias antes, segundo o jornal "Folha de S.Paulo", Guedes anunciara a uma plateia restrita o interesse em recriar um imposto nos moldes da CPMF, que incide sobre movimentação financeira, além de instituir uma alíquota única do IR (Imposto de Renda) de 20% para pessoas físicas e jurídicas. O evento ocorreu no último dia 18.

Adversários criticam fala de general

As declarações de Mourão têm sido criticadas por adversários políticos de Bolsonaro.

Hoje, o primeiro presidenciável a se pronunciar sobre as colocações do candidato a vice a respeito do 13º e o adicional de férias foi o tucano Geraldo Alckmin, principal opositor, em declarações de campanha e no horário eleitoral, ao capitão da reserva. 

"Não posso ser a favor, como disse hoje o general Mourão, que o 13º é 'jabuticaba brasileira'. Não é possível achar que o trabalhador ou a trabalhadora que sua a camisa e trabalha muitas vezes até explorado não tenha direito nem ao 13º. Não é razoável", criticou o tucano.

Ele se expressou também no Twitter, ao classificar a campanha de Bolsonaro como "lamentável" e ao apontar que Mourão, "depois de ofender indígenas, negros e mulheres, ataca agora o 13º e as férias dos trabalhadores. E querem a volta da CPMF."

Outro presidenciável a se pronunciar na mesma rede social foi Guilherme Boulos, do PSOL. "O projeto de Brasil de Mourão é o dos direitos políticos durante a ditadura militar com os direitos trabalhistas de antes da abolição da escravidão", escreveu.

Por meio de nota, a executiva nacional do PT classificou as declarações de Mourão como "mais uma ameaça ao nosso povo".

"O 13º salário é uma conquista histórica da classe trabalhadora, assim como a gratificação de férias, incorporada democraticamente à Constituição de 1988. É inacreditável que alguém se candidate a governar o país propondo massacrar ainda mais os trabalhadores", diz trecho do texto.

Para Marina Silva (Rede), Mourão "atacou a Constituição quando 'jabuticabou' a importância do 13º salário e férias. Além de analisar os candidatos, PRESTEM MUITA ATENÇÃO NO VICE. Já sabemos o que a escolha mal feita de um vice pode fazer ao país", escreveu em seu perfil oficial no Twitter.

Afastado das agendas de rua por recomendação médica, Ciro Gomes (PDT) também se manifestou no Twitter sobre o episódio. "Imagine que esse homem pode virar presidente da República, como acabou acontecendo com três vices na história recente – entre eles, Sarney e Temer. Se você não tinha um motivo para votar no Bolsonaro, agora tem", disse o pedetista em vídeo que aproveitou trechos da fala de Mourão no Sul.

*Colaborou Gustavo Maia, de São Paulo

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