Em SP, redutos de Bolsonaro e Haddad relevam críticas e pregam mudança
Alex Tajra e Bruna Souza Cruz
Do UOL, em São Paulo
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João Teodorov (esq.) é Bolsonaro, e Maria Ferreira (dir.) vota em Haddad no 2º turno
Os bairros de Piraporinha, no extremo sul de São Paulo, e Santana, na zona norte da cidade, têm pouco em comum. Mas os eleitores desses dois pontos da capital paulistana têm um desejo semelhante para o fim das eleições deste ano: mudança, ainda que um bairro prefira o candidato do PT a presidente e o outro deposite suas esperanças em Jair Bolsonaro (PSL).
No primeiro turno das eleições presidenciais, Bolsonaro superou Fernando Haddad (PT) na maior cidade do país. Ao todo, o candidato do PSL conquistou 54% dos votos na capital paulista. Ele venceu em 54 das 58 zonas eleitorais, segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Em Santana, Bolsonaro teve pouco mais de 55% dos votos, o seu maior índice de votação na cidade. Já em Piraporinha, Haddad venceu o capitão reformado do Exército, com 36,7% dos votos válidos contra 31,8% do adversário.
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Santana é um dos bairros mais tradicionais e antigos da zona norte da capital paulista. Do total de eleitores que votaram na região, 55,22% (47.138 votos) escolheram ter Bolsonaro como o próximo presidente do Brasil na votação do último domingo (7).
Durante o começo do século 20, o bairro foi destino de várias pessoas interessadas em aproveitar os grandes terrenos que existiam até então na região. Fazendas surgiram e Santana foi sofrendo um processo intenso de industrialização posteriormente.
A família de Veronica Ariana Galvão Saldanha, 30, mora no bairro há 15 anos, mas se divide quando o assunto é política. Ela diz que votou por muitos anos em políticos do PSDB, mas resolveu mudar radicalmente o seu voto no domingo.
"Minha mãe ficou brava porque votei no Bolsonaro", conta. "Ela é homossexual e vota no PSDB. Então, comprei briga na família. Mas votei nele porque acho que ele pode ser uma boa opção. Fiquei desempregada por três meses, e acho que ele pode ajudar a resolver essa crise econômica."
"Votei também porque tenho amigos militares, e eles me disseram que ele é um bom candidato", acrescentou. "Só quero que ele ponha ordem, melhore a economia e gere emprego."
"Vou falar para você que eu gosto que minha mãe seja homossexual? Eu não gosto, mas aceito, dentro do meu limite. Vou fazer o quê?", respondeu Veronica, quando questionada sobre polêmicas frases de Bolsonaro que causaram indignação na comunidade LGBT.
Preocupação com a crise e voto em Bolsonaro
Em outro ponto de Santana, uma das vozes que desejam ter o capitão reformado do Exército no cargo máximo do governo brasileiro é a de Edilvaldo Godoy, 36, que mudou para o bairro ainda bebê.
"O Haddad é um fantoche do Lula, e eu não quero ser governado por um presidiário. O Bolsonaro é ficha limpa. Vi entrevistas dele e de outros candidatos, pesquisei na internet e decidi o meu voto. Conheço umas 300 pessoas, e apenas uma votou no PT", afirma, ao justificar o seu voto.
Godoy também se diz muito preocupado com a crise econômica que o país enfrenta e vê no candidato do PSL uma esperança de renovação e mudança. Sua família tem uma pequena marcenaria, que existe há 12 anos no bairro. Devido à crise, ele afirma que o estabelecimento deve fechar suas portas em breve.
"Se logo no começo o Bolsonaro conseguir diminuir a corrupção, eu já vou ficar satisfeito. Os outros partidos são corruptos, e eu não acho que o meu candidato é incorruptível. Mas, por enquanto, eu confio", afirmou durante uma pausa no trabalho. Seu pai, que acompanhava de longe a entrevista, concordava com a cabeça, em sinal de aprovação. Em seguida, entrou em seu escritório.
Sobre as polêmicas que envolveram Bolsonaro durante a campanha, Godoy diz que não concorda com quem acusa o candidato de ser racista, homofóbico ou machista. Para ele, as pessoas se sentem ofendidas sem ter motivos para isso.
"O racismo, na realidade, já é da própria pessoa. Ela mesma cria o racismo. Eles mesmos têm preconceito porque acham que todo mundo é contra eles. O racismo está na mente deles. Eles não deveriam se sentir ofendidos. Mas acho que ele [Bolsonaro] não deveria falar tanto", acrescenta Godoy.
Voto "útil" e sondagem eleitoral no salão
Outro eleitor de Bolsonaro em Santana foi João Teodorov, 75, que vive no bairro há 30 anos e fez questão de exercer o seu direito no último domingo.
"Para mim, votar é cumprir um dever. Sou contra o voto em branco ou nulo. Até por que, se vota assim, não pode reclamar depois", disse, animado, depois de abaixar o volume da TV onde acompanhava o noticiário sobre as eleições.
Confirmando os dados do TSE, Teodorov diz que votou, com orgulho, em Bolsonaro. Dono de uma loja de molduras, sem nenhum movimento no horário da visita da reportagem, ele acrescenta que optou por dar um voto "útil" para evitar que o PT volte ao poder.
"Eu votaria mesmo no Álvaro Dias [do partido Podemos], mas não queria perder o voto. Confio mais nele. Mas votei no Bolsonaro e vou votar novamente", acrescenta.
Voto pela mudança, para sair da rotina. Vi o programa dele para saúde, segurança. Gosto do patriotismo que ele tem e da autoridade, que não deve ser confundida com autoritarismo."
João Teodorov, eleitor de Bolsonaro em Santana, na zona norte de São Paulo
O eleitor de Bolsonaro acrescenta que muitas das críticas ao candidato são, na sua opinião, boatos espalhados na internet por seus adversários. "O PT errou em tudo. Não acertou em nada. Sei que a mudança não vai ser rápida, mas acredito que ele vai fazer. Se o PT ganhar, é bem capaz de eu ir morar com a minha filha nos Estados Unidos", acrescentou.
"Às vezes, ele [Bolsonaro] fala demais, fala umas besteiras. Mas ele é sincero e fala a verdade. Só que ele nunca falou mal de gay. Ele só não quer que isso seja ensinado nas escolas", defende o cabeleireiro Gilberto Meneses Barreto, 40, que nasceu em Sergipe e trabalha há 15 anos em Santana.
"Se a pessoa nasce gay, nem ele e nem ninguém é obrigado a gostar, mas tem que respeitar como ser humano que é", acrescenta.
O cabeleireiro conta que chegou a fazer uma sondagem no salão em que trabalha junto com um amigo, "petista roxo". Segundo ele, 65% das pessoas que responderam à enquente disseram que votariam em Bolsonaro.
Voto no partido por um governo que lembre dos pobres
Já Piraporinha, que faz parte do distrito do Jardim São Luís, foi um dos quatro bairros onde Haddad teve mais votos do que Bolsonaro em São Paulo. Em Parelheiros e no Grajaú, também no extremo sul, e na Cidade Tiradentes, na zona leste da cidade, Haddad foi melhor que o candidato do PSL. Foram mais de 66 mil votos para o petista apenas em Piraporinha.
"Votei no Haddad por que ele lembra que os pobres existem, não vai governar só para quem mora no Jardins", disse ao UOL a aposentada Maria Aparecida, organizando minuciosamente os jornais do dia na prateleira da banca onde trabalha. "Sei que o partido cometeu erros, mas ele fez alguma coisa. Se eles roubam 100, pelo menos deixam 20% para os pobres."
Aos 72 anos, ela abdicou do voto facultativo e deixou sua casa no último domingo para apoiar o candidato petista. Nos cargos legislativos, não deu votos ao Partido dos Trabalhadores. "Quando é deputado, eu voto na pessoa. Só para presidente que voto no partido."
A vendedora Maria Ferreira, de 61 anos, diz que também votou em Fernando Haddad no primeiro turno porque ele é o "candidato de Lula", mas não o poupou de críticas.
"Como prefeito, tem algumas coisas que eu não gostei. Mas eu sei que ele pode melhorar para presidente", acrescentou a eleitora, que já vendeu cachorros quentes e hoje tem uma barraca de frutas na esquina da rua Nicolino Leo com a estrada do M'boi Mirim.
Sempre fui eleitora do PT, gostei do Lula, votei na Dilma. Lula colocou água na casa das pessoas, graças a ele as pessoas podem comer carne, podem ter energia elétrica. Ele fez muito pelas pessoas do Nordeste e foi traído."
Maria Ferreira, eleitora de Haddad em Piraporinha, na zona sul de São Paulo
Questionada sobre o motivo de não ter votado em Bolsonaro, que também teve votação expressiva no bairro, disse que o candidato do PSL ""xinga muito as mulheres".
"Ele fala toda a hora contra as mulheres, coisas feias, depois veio com esse negócio de armas", comenta a vendedora. "Não gostei disso não."
Servindo um pingado para um cliente enquanto o questionava por ter votado em Henrique Meirelles, o comerciante Francisco Assis de Oliveira disse à reportagem que votar no PT é "coisa de família" para ele.
"Eu aprendi, desde cedo, que tem de votar no PT. É uma coisa que passa de geração para geração e, na minha família, não é diferente", contou Oliveira, morador de Piraporinha e dono de um pequeno bar na região.
Ele deixou a pequena Coremas, na Paraíba, para viver no extremo sul de São Paulo. Afirma que acompanha política e que deu seu voto ao PT nos últimos 12 anos. Mas admite que não tinha ouvido falar de Bolsonaro até as eleições deste ano.
"Acabei conhecendo agora, nem sabia quem era", diz o comerciante. "Mas, para mim, ele é o tipo do cara que vai provocar outros países, vai criar uma guerra."
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