Eleição para governadores mexe com vagas no Senado

Lucas Borges Teixeira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

  • Arte/UOL

    Mailza Gomes, Luiz Carlos do Carmos e Jean-Paul Prates assumem vaga no Senado

    Mailza Gomes, Luiz Carlos do Carmos e Jean-Paul Prates assumem vaga no Senado

As eleições deste domingo (28) mudaram parte da configuração da bancada do Senado Federal para 2019. Em 7 de outubro, foram escolhidos 46 novos senadores e oito conseguiram a reeleição.

Outros três senadores deixam para suplentes os mandatos até 2023 a que tinham direito por terem ganhado a disputa pelo governo de seus estados.

Dois deles disputaram o Executivo hoje: Fátima Bezerra (PT), no Rio Grande do Norte, e Antonio Anastasia (PSDB), em Minas Gerais.

Eleita governadora com 57,6% dos votos válidos, a senadora dará lugar ao suplente Jean-Paul Prates, correligionário do Partido dos Trabalhadores, enquanto o tucano se mantém como um dos três representantes mineiros, após a derrota para Romeu Zema (Novo).

Além de Prates, dois outros suplentes já haviam garantido suas vagas no Senado com as eleições do primeiro turno: Luiz Carlos do Carmo (MDB) ocupará o lugar de Ronaldo Caiado (DEM) por Goiás, e Mailza Gomes (PSDB), a vaga de Gladson Cameli (PP), novo governador do Acre.

Com estas mudanças, o MDB continua a ser o partido com maior número de cadeiras no Senado: 12, embora tenha sofrido uma queda significativa de seis representantes.

Logo em seguida está o PSDB, com nove, contando com Mailza, e o PSD, com sete. Caso Anastasia fosse eleito, os dois empatariam, visto que o senador daria lugar ao suplente Alexandre Silveira, do partido de Gilberto Kassab.

Em seguida, estão empatados com seis cadeiras o PT, que antes tinha nove vagas, e o Democratas, que antes tinha cinco. Com a eleição de Cameli, o PP fez o inverso e caiu de seis para cinco representantes.

Entre as novidades estão as quatro novas cadeiras do PSL, partido do presidente eleito Jair Bolsonaro, e a nova composição da Rede, de Marina Silva, com cinco representantes. Nanicos como PHS, PRP e PSC também obtiveram parlamentares nesta eleição.

Senado mais pulverizado

Especialistas ouvidos pelo UOL apontam que a pulverização entre diferentes partidos (22 legendas, além de Reguffe, do Distrito Federal, que está sem sigla) será a grande novidade da composição da Casa para 2019.

Entre 2015 e 2019, 17 partidos ocuparam a Casa. Além deste número crescer cinco siglas, elas estão mais bem divididas. O MDB passou de 18 para 12 nomes; o PSDB, de 12 para 9; e o PT, de 9 para 6. Enquanto isso, PSL, Rede e Podemos, então inexpressivos, ganharam mais espaço.

"Antes, com os 'partidões' com mais representantes, havia um eixo de condução no Senado. Agora, não, é uma composição mais pulverizada", afirma o cientista político Fernando Schuler, professor do Insper. "Virou uma Casa que apresenta mais incerteza, será imprevisível de composição e resultado."

"Você tinha basicamente um bloco de MDB + PSDB e o PT na oposição, mas o MDB e o PT enxugaram. O PSDB continua forte no Senado, mas também perdeu cadeiras", diz Schuler.

Arte/UOL
Eunício Oliveira, Edison Lobão e Romero Jucá não foram reeleitos

"A eleição de diferentes partidos e a rejeição aos tantos caciques que não foram reeleitos indicam um estresse do eleitor com esses políticos e partidos ditos tradicionais", avalia o cientista político Rodrigo Augusto Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 

O maior baque foi sofrido pelo MDB, que viu grande parte de suas lideranças perderem vagas em diferentes estados, como Eunício Oliveira no Ceará, Romero Jucá em Roraima e Edison Lobão no Maranhão.

"Pode-se ver que houve um crescimento da chamada centro-direita, embora estes conceitos estejam prejudicados. Por outro lado, quem mais sofreu foi o núcleo mais duro da esquerda, que não conseguiu eleger tantos nomes", afirma Schuler. 

"Uma surpresa fica por parte da Rede, que teve um resultado pífio na eleição presidencial, e elegeu quatro senadores, mas qual a cara da Rede? O que ela representará?", questiona o professor.

Barganhas políticas

Para os especialistas, esta composição menos concentrada trará uma nova dinâmica ao futuro presidente, o que pode ser positivo ou negativo.

"A dependência [de algum partido] diminui. Não tem uma só bancada ou bloco que concentra 1/3 da Casa", afirma Schuler. 

"Por outro lado, a negociação ficou mais dura, pois o recado das urnas foi claro: um veto ao chamado presidencialismo de coalizão."

Mateus Bonomi/Folhapress
Rodrigo Maia, deputado federal e atual presidente da Câmara

De acordo com o especialista, isso significa que o futuro presidente Bolsonaro/Haddad terá de diminuir a relação de "clientelismo", tão comum entre Executivo e Legislativo. Neste caso, uma bancada mais pulverizada pode ajudar a manter o discurso antibarganha com partidos tradicionais, como o MDB.

"Esta renovação dá ao presidente uma oportunidade de falar que a relação com outros partidos não representa nada. Ele sabe que terá de dialogar, mas no Senado isso se torna mais personalista. São apenas 81 senadores, você pode tratar com o parlamentar e sair do discurso de aliança com o partido", afirma Prando. "Acaba sendo mais fácil negociar com legendas menores."

"A figura clássica do Senado como oposição programática ao governo diminuiu. Hoje [com a nova composição], é mais pragmática", concorda Schuler. "A questão é como o governo Bolsonaro/Haddad vai gerir esta relação." 

Isso serve em especial para Bolsonaro. "A base que o apoiou afiançou uma retórica antissistema, mas este modelo [de alianças] é como a política funciona no Brasil. Na campanha, [o discurso de não negociação] pode até funcionar, mas no dia a dia do Congresso a conta é mais cara", afirma Schuler.

"Bolsonaro vai ter de rever o discurso antimercado, os termos da negociação vão mudar. É o que o eleitor espera", argumenta o especialista.

Prando diz acreditar que este não será um problema para o capitão reformado. "Se formos analisar ao pé da letra, Bolsonaro nunca foi antissistema. Ele sempre foi muito corporativista, inclusive, sabe conversar com estes parlamentares, já foi um deles", afirma o especialista.

Liberal na economia, conservador nos costumes

Os cientistas políticos também veem uma tendência conversadora pró-mercado nas eleições de 2018, replicada na nova formação do Senado. Alinhado ao seu discurso, Bolsonaro lidará com uma Casa voltada a pautas ligadas a religião e valores conservadores.

"Existe esta onda de conservadorismo nos costumes e pró-mercado, o que é uma coisa boa para a agenda de Bolsonaro", afirma Schuler.

Dos 22 partidos presentes no futuro Senado, só três declararam apoio a Bolsonaro no segundo turno: PSC, PTB e PSD. O número deve crescer a partir de agora. 

"Estes partidos menores não têm unidade nem lideranças com experiência política, mas certa afinidade com Bolsonaro por sua figura quase familiar. Seu problema é o oposto do comum: ele não terá problema em conquistar base, seu desafio vai ser conter todos os partidos que quiserem entrar", afirma Schuler.

Prando concorda. Partidos identificados com esta ideia conservadora que começarão a compor o Senado, como PHS e PRP, deverão entrar para a base já no início do governo.

"Mas não só eles. Já viu o MDB ficar fora de algum governo? Desde a redemocratização, com o [José] Sarney, eles estão lá", comenta o professor. "PSD e DEM a mesma coisa, eles têm a chamada 'vocação para o poder'."

O PP, com cinco cadeiras, também deverá se aliar. "Porque ali não é um partido, mas uma federação de líderes regionais com quem o presidente precisará dialogar", afirma Schuler.

Na oposição, deverão ficar PT, PSB, PDT, Rede e um ou outro partido de menor expressão.

"Não acredito que ele enfrentará dificuldade, mas agora o jogo muda. Esta eleição teve como base três fatores significativos: ódio, medo e rejeição. Até então, o Bolsonaro transitou com tranquilidade entre eles. É preciso ver a partir de agora", afirma Prando.

"Os livros de cabeceira que eu indicaria para Bolsonaro seriam os que tratam dos anos de Fernando Collor na Presidência: figura popular, de partido fraco e discurso antissistema que foi tirado do cargo. É preciso lembrar que a opinião pública é volátil, você pode perder seu apoio rapidamente", conclui Schuler. "O mesmo discurso que o levou a ganhar pode não ser o bastante para que ele governe."

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