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Na escuta: cinco grampos que balançaram a República

FHC - Bruno Santos/Folhapress - Bruno Santos/Folhapress
Grampo mostrou que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso favoreceu empresas na privatização das telefônicas.
Imagem: Bruno Santos/Folhapress

Pablo Raphael

Do UOL, em São Paulo

25/03/2016 06h00

Os grampos telefônicos do celular do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva provocaram uma tempestade nacional, tanto pelo conteúdo das conversas quanto pela legalidade das gravações e sua divulgação. Mas é sempre bom lembrar que interceptações telefônicas não são novidade na história recente do Brasil.

O uso do recurso -- e sua divulgação -- têm sido frequente tanto pela Polícia Federal quanto pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência), arranhando a imagem de figuras importantes como os ex-presidentes FHC e Sarney, entre outros.

No vídeo que abre esta reportagem, UOL relembra e explica os cinco grampos telefônicos que balançaram a República. A seguir, você pode conferir com mais detalhes a história por trás de cada um deles.

Lula, Dilma e o termo de posse (2016)

Lula e Dilma - Reprodução/NBR - Reprodução/NBR
Conversa entre a presidente Dilma e Lula sugere que o ex-presidente usaria o termo de posse para evitar a prisão
Imagem: Reprodução/NBR

O grampo, feito pela Polícia Federal, traz uma conversa entre a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, horas antes da posse dele como ministro da Casa Civil. Divulgada para a imprensa pelo juiz Sérgio Moro, com várias outras interceptações, a gravação levou milhares de pessoas às ruas, tanto contra quanto a favor do atual governo, e resultou em várias liminares para impedir Lula de assumir o cargo de ministro, além de impulsionar o processo de impeachment de Dilma.

A legalidade do grampo é questionada pela presidente Dilma e pelos advogados de Lula e divide a opinião dos juristas, pois foi feita horas depois de Moro ter ordenado o fim das gravações, como revelou o UOL. Dilma já afirmou algumas vezes que grampear o telefone da presidente da República é crime, mas o telefone interceptado foi o de um assessor do ex-presidente Lula, para quem Dilma telefonou.

O ex-consultor da NSA (Agência Nacional de Segurança) dos EUA Edward Snowden comentou o caso no Twitter: "Três anos após as manchetes de escuta de @dilmabr, ela ainda está fazendo chamadas não criptografadas".

Demóstenes Torres, Aécio Neves e Carlos Cachoeira (2011)

Aécio Neves - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Citado nos grampos da Operação Monte Carlo, o senador Aécio Neves disse que "se sentiu traído" por Demóstenes Torres
Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

O grampo feito pela PF no telefone do ex-senador Demóstenes Torres (DEM-GO), durante a operação Monte Carlo, que investigou um esquema de máquinas caça-níqueis em Goiás, acabou pegando também uma conversa envolvendo o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que teria conseguido um cargo no Senado para uma prima de Cachoeira.

Falando sobre o caso, Aécio disse que se sentiu "traído" por Demóstenes e que não sabia da ligação do ex-senador com o bicheiro Carlinhos Cachoeira. Demóstenes Torres se desfiliou do DEM.

Gilmar Mendes, Protógenes e a Operação Satiagraha (2008)

Gilmar Mendes - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
O telefone de Gilmar Mendes, na época presidente do STF, foi grampeado durante a Operação Satiagraha
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Operação da Polícia Federal, que investigava corrupção e desvio de verbas públicas, terminou se revelando fachada para espionagem ilegal, quando foi descoberto que o delegado Protógenes Queiroz, responsável pela operação, grampeou diversas autoridades.

A operação da Polícia Federal, que investigava desvio de verbas públicas, lavagem de dinheiro e corrupção, resultou na prisão de banqueiros, diretores de bancos e investidores, com destaque para Daniel Dantas, do grupo Opportunity, envolvido em negócios com os governos FHC e Lula. Dantas foi liberado da prisão por duas vezes pelo então presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes.

A decisão dividiu as opiniões no meio jurídico brasileiro. Gilmar Mendes teria "criado um foro privilegiado para um banqueiro, coisa que não existe na Constituição", disse o procurador da República Rodrigo de Grandis. Muitos juristas pediram o impedimento do presidente do STF, que foi defendido por membros do Congresso. Em retaliação, o delegado teria grampeado e monitorado não só o telefone de Gilmar Mendes, mas também todos os telefones do Supremo.

Na época, a imprensa divulgou diversas conversas que teriam sido vazadas pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência), de Gilmar Mendes, como a em que agradece ao senador Demóstenes Torres pelo apoio contra o pedido de impeachment feito pelos juristas. As gravações mostravam que Protógenes teria usado a agência para monitorar não só o juiz, mas também outras autoridades. As gravações, no entanto, não apareceram. 

Por conta dos grampos, a operação foi anulada em 2015 e Protógenes, por outras irregularidades, foi afastado do cargo na Polícia Federal.

Família Sarney e Agaciel Maia (2008)

José Sarney - Pedro Ladeira/Folhapress - Pedro Ladeira/Folhapress
Conversa grampeada de Sarney mostrou que a família do ex-presidente negociava cargos no Senado, mas gravação foi considerada ilegal
Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

A operação Boi Barrica, da Polícia Federal do Maranhão, pegou Fernando Sarney (filho do ex-presidente José Sarney) e Agaciel Maia, que ocupava a função de diretor geral do Senado, em um esquema de tráfico de influência. Nos grampos, o ex-presidente, o filho Fernando e a neta Maria Beatriz Sarney negociam um cargo no Senado para o namorado de Maria Beatriz.

Foram interceptadas conversas entre Fernando, Maria Beatriz e José Sarney, onde o então diretor geral do Senado, Agaciel Maia, foi citado em mais de uma ocasião. Para os Sarney, o cargo em questão era "da família", pois anteriormente era ocupado pelo irmão de Maria Beatriz. A operação foi anulada pelo Supremo Tribunal de Justiça, que considerou as provas que a PF encontrou como ilegais.

FHC, Lara Resende e o megaleilão das teles (1998)

Fitas gravadas na sede do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) provaram que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tomou partido no leilão das telefônicas, considerado um dos maiores processos de privatização do mundo -- na época, a União arrecadou R$ 22 bilhões.

FHC autorizou André Lara Resende, então presidente do BNDES, a usar seu nome para pressionar um fundo de pensão estatal a entrar em um dos consórcios que participavam do leilão.

O grampo resultou na queda do ministro das Comunicações, Luiz Carlos Mendonça de Barros, e de André Lara Resende.