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Eike mentiu ao citar Caixa para justificar repasse a mulher de Cabral, diz MPF

30.nov.2016 - O empresário Eike Batista deixa o prédio do Ministério Público Federal após depor sobre os serviços de advogacia de Adriana Ancelmo - Fábio Motta/Estadão Conteúdo
30.nov.2016 - O empresário Eike Batista deixa o prédio do Ministério Público Federal após depor sobre os serviços de advogacia de Adriana Ancelmo Imagem: Fábio Motta/Estadão Conteúdo

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, no Rio

26/01/2017 13h12Atualizada em 26/01/2017 13h32

O ex-bilionário Eike Batista mentiu para os investigadores do MPF (Ministério Público Federal) ao citar um suposto contrato com a Caixa Econômica Federal para justificar o repasse de R$ 1 milhão ao escritório da advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB), de acordo com o procurador-geral da República José Augusto Vagos.

A informação foi revelada pela Operação Eficiência, realizada nesta quinta-feira (26) pela Polícia Federal. São nove mandados de prisão preventiva, um dos quais contra Eike, que está fora do país.

Se ele não se apresentar espontaneamente nas próximas horas, será considerado foragido da Justiça brasileira. A reportagem ligou para o celular do advogado de Eike, mas não conseguiu o contato. À "GloboNews", ele afirmou que Eike se entregará quando voltar ao país. A assessoria de comunicação do grupo EBX, de Eike, ainda não foi localizada.

De acordo com o procurador, as contas da Ancelmo Advogados foram verificadas durante a Operação Calicute e seus desdobramentos, que culminaram nas prisões de Cabral e da mulher --hoje, ambos se encontram no Complexo Penitenciário de Gericinó, em Bangu, na zona oeste carioca.

O valor de R$ 1 milhão repassado pela EBX --empresa de Eike-- sem justificativa aparente intrigou os investigadores, que convocaram o empresário para depor.

"Ele deu uma versão tentando dar foro de legalidade a esse repasse", afirmou Vagos. Na ocasião, Eike apresentou uma simulação de financiamento que havia negociado com a Caixa com objetivo de aplicar em fundo de investimento.

O documento, porém, consistiria tão somente em uma proposta, e não um contrato oficial. 

"Ficou bastante claro que essa versão não é verdadeira. Ou seja, o repasse de R$ 1 milhão não foi em decorrência de qualquer contrato com a Caixa", declarou.

Eike afirmou ainda que o repasse teria ocorrido a pedido da Caixa, pois a falsa negociação exigiria "a contratação de um escritório de advocacia". A Caixa, por sua vez, apresentou documentos à PF e desmentiu a versão de que teria sido ela a responsável por fazer qualquer indicação de transferência de dinheiro.

"Não temos nenhum motivo para duvidar da Caixa", comentou o procurador.

"A gente tem depoimento de uma testemunha que trabalhou muitos anos no escritório [da Ancelmo Advogados] e afirmou que jamais viu qualquer documento relativo à EBX", disse.

Os investigadores também constataram que a transferência de dinheiro da EBX para a Ancelmo Advogados não foi "pontual". Os indícios apontam, segundo Vagos, para pagamento mensal "fruto de ocultação".

"Precisamos avançar mais, porém tudo leva a crer que o repasse é fruto da ocultação de algum valor que não poderia ser revelado", concluiu.

A investigação do esquema criminoso envolvendo o ex-governador Sérgio Cabral, o empresário Eike Batista e outros denunciados começou em junho do ano passado e transcorreu a partir da delação premissa de duas pessoas que se identificaram como operadores financeiros de Cabral --os nomes não foram revelados.

De acordo com os colaboradores, foram lavados mais de US$ 100 milhões (R$ 340 milhões) a partir de remessas ao exterior realizadas desde 2002, quando o peemedebista foi eleito para a chefia do Executivo.

Desse montante, o ex-governador ficou com cerca de R$ 78 milhões, e Wilson Carlos e Carlos Miranda, juntos, com aproximadamente R$ 22 milhões. De acordo com o Ministério Público Federal, do total, R$ 85 milhões já foram repatriados.

Há acordos em curso com instituições financeiras internacionais para que o restante também seja recuperado, afirmou o procurador Leonardo Freitas.

Dos mais de US$ 100 milhões que Cabral movimentou no exterior, US$ 16,5 milhões foram provenientes da propina paga por Eike Batista, relatam os investigadores. Depois de uma tentativa fracassada de realizar a transferência do dinheiro por meio de uma offshore dos operadores financeiros de Cabral (o motivo não foi informado), Eike optou por consumar a transação comprando ações da Vale, da Petrobras e da Ambev e, posteriormente, repassando-as para o ex-governador.

Para dar uma aparência de legalidade às transações, uma das empresas de Eike teria firmado um contrato de fachada referente à intermediação de compra e venda de uma mina de ouro.

A beneficiária, a Arcadia Associados, recebeu o dinheiro de Eike em uma conta aberta no Uruguai e que ficou à disposição de Cabral, embora estivesse registrada em nome de terceiros. Freitas afirmou que esse trâmite é uma "tipologia clássica de lavagem de dinheiro".

Mas há uma pergunta que os investigadores da Operação Eficiência ainda não sabem responder: de que forma Eike se beneficiou da propina paga a Cabral. O MPF afirma que ainda está apurando de que forma o ex-governador agiu em favor do ex-bilionário, e há grandes obras que estão na mira dos procuradores, como o Porto do Açu.

Até mesmo o investimento feito pelas empresas de Eike nos projetos das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) está sendo analisado.

Dos nove mandados de prisão preventiva expedidos pelo juízo da 7ª Vara Criminal Federal, quatro foram cumpridos nesta quinta: Flávio Godinho, Álvaro Novis, Sérgio de Castro Oliveira e Thiago Aragão.

Outros três alvos já se encontravam detidos, são eles o ex-governador Sérgio Cabral e dois de seus operadores: Wilson Carlos e Carlos Miranda. Restam, portanto, dois procurados: o empresário Eike Batista e Francisco Assis Neto.