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Ataque de Gilmar a Bretas envolve advogado de alvos de peso da Lava Jato

O ministro do STF Gilmar Mendes - Fellipe Sampaio /SCO/STF
O ministro do STF Gilmar Mendes Imagem: Fellipe Sampaio /SCO/STF

Igor Mello e Silvia Ribeiro

Do UOL, no Rio

12/03/2021 04h00

Resumo da notícia

  • Novos ataques de Gilmar Mendes reacendem guerra com Lava Jato do Rio
  • O pivô é um advogado investigado por suspeita de tráfico de influência
  • Procuradores apontam falta de embasamento em declarações de Gilmar
  • Caso está pendente de decisão no Superior Tribunal de Justiça

A menção feita por Gilmar Mendes a um "escândalo" que pode vir à tona na 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro —responsável pelos processos da Lava Jato no estado— é mais um round do embate público entre o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) e a operação.

Nos últimos anos, multiplicaram-se os ataques mútuos —sejam em declarações públicas ou em autos de processos. Desta vez, Gilmar Mendes trouxe à tona um caso sob investigação de um advogado suspeito de arrebatar clientes de peso de escritórios advocatícios do Rio oferecendo facilidades junto à força-tarefa e ao juiz Marcelo Bretas.

Após as declarações de Gilmar, integrantes da Lava Jato se disseram perplexos por passarem de vítimas a investigados, e o juiz Bretas refutou irregularidades (leia mais abaixo).

O que disse Gilmar Mendes

Gilmar mencionou a Lava Jato do Rio durante julgamento nesta semana sobre a suspeição do ex-juiz Sergio Moro. "A tal 7ª Vara do Rio de Janeiro, não sei por que o escândalo ainda não veio à tona, mas o que se fala em torno dessa Vara também é de corar frade de pedra", disse o ministro, sem citar Bretas nominalmente.

Corrupção na Justiça Estadual vai para a Justiça Federal, para a 7ª Vara, que está extremamente mal falada. Não sei se ouviram sobre um personagem chamado Nythalmar, um advogado que liderava as delações até determinado momento e depois se tornou uma figura espúria e veio reclamar no STJ? Por isso tenho dito para eles, para os colegas do Conselho da Justiça Federal e do STJ: façam alguma coisa, antes que a Justiça se comprometa de forma indelével

Gilmar Mendes em sessão da 2ª Turma do STF

O pivô do caso

O pivô do imbróglio, que hoje tramita no STJ (Superior Tribunal de Justiça), é o advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho, que cuida da defesa de pesos pesados investigados pela Lava Jato, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, o empresário Arthur Soares —conhecido como Rei Arthur— e o ex-secretário de Segurança do Rio José Mariano Beltrame.

Nythalmar foi acusado por outros advogados, inicialmente em um procedimento interno da OAB-RJ, de cooptar clientes de colegas com a alegação de que ele "vendia facilidades" junto a Bretas e da força-tarefa da Lava Jato.

O MPF-RJ chegou a apreender um bilhete na casa do almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, em que Nythalmar era descrito como "advogado 'milagreiro' do juiz Marcelo Bretas".

Nythalmar apresentou então uma reclamação ao STJ e conseguiu em dezembro decisão favorável do ministro Humberto Martins, presidente do Tribunal, suspendendo as buscas autorizadas pela 3ª Vara Federal do Rio.

O advogado alegou que, em razão da citação de procuradores na investigação, o caso deveria ser analisado pelo tribunal superior. O caso aguarda manifestação da relatora, a ministra Laurita Vaz —ela pode manter a liminar ou rejeitá-la, devolvendo o caso à 3ª Vara Federal.

Procurado pelo UOL, Nythalmar preferiu não se manifestar.

O que dizem Bretas e a Lava Jato

Para os procuradores da força-tarefa da Lava Jato do Rio —que será dissolvida ao final deste mês— as declarações de Gilmar não têm embasamento em fatos. Eles defendem a retomada da investigação e pontuam que, de vítimas, passaram a ser investigados por uma decisão tomada durante o plantão judiciário do STJ.

Já o juiz Marcelo Bretas usou as redes sociais para rebater Gilmar Mendes.

Libertação de alvos

As rusgas entre Gilmar e a Lava Jato do Rio remontam a abril de 2017, quando o ministro decidiu pela prisão domiciliar de Eike Batista, preso por ordem de Bretas. A decisão revoltou os procuradores, que apontavam falta de isenção de Gilmar —sua mulher, Guiomar Mendes, integra o escritório do advogado Sergio Bermudes, que à época representava Eike em ações.

O então procurador-geral da República Rodrigo Janot pediu que fosse decretada sua suspeição no caso, mas o pedido acabou arquivado.

Meses depois, Bretas e Gilmar travaram um duelo de decisões em torno de Jacob Barata, conhecido como o Rei dos Ônibus do Rio. Em 2017, ele foi preso três vezes no âmbito da Lava Jato do Rio, e obteve três habeas corpus julgados por Gilmar. O ministro é padrinho de casamento da filha de Barata, fato que fez com que Janot também pedisse sua suspeição no caso.

Dossiê contra Gilmar Mendes

Outro episódio foi o vazamento em 2019 de um procedimento feito pela Receita para apurar "focos de corrupção, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio ou tráfico de influência" envolvendo Gilmar e sua mulher Guiomar, revelado pela revista Veja.

Documentos enviados pela Receita à PGR mostraram que o auditor responsável pelo procedimento enviou ao menos um dossiê contra Gilmar para o colega Marco Aurélio Canal, que então era supervisor de Programação do órgão na Lava Jato do Rio.

"Estão incomodados com o quê? Com algum habeas corpus que eu tenha concedido na Lava Jato?", reagiu Gilmar na ocasião.

No mesmo ano, Canal foi preso por operação da Lava Jato contra extorsão de investigados. Após a prisão, Almir Sanches, procurador da força-tarefa no Rio, cobrou que Gilmar se retratasse.