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O que a proposta de Trump de proibir muçulmanos nos EUA diz sobre o eleitorado americano

Bebeto Matthews/AP
Imagem: Bebeto Matthews/AP

Katty Kay

Apresentadora do programa BBC World News America, da BBC World News

08/12/2015 08h44

Donald Trump não é um político eleito e nem sequer foi escolhido para ser o candidato de seu partido, o Republicano, nas eleições americanas no ano que vem.

Ou seja, sua proposta de proibir a entrada de muçulmanos nos Estados Unidos, feita na noite de segunda-feira, na prática, significa pouco.

O bilionário, um dos favoritos à nomeação do Partido Republicano, propôs em um comunicado barrar "total e completamente" a entrada de muçulmanos até que os americanos "entendam o que está acontecendo".

A proposta foi feita após os ataques que deixaram 14 pessoas mortas em San Bernardino, na Califórnia - os atiradores seriam muçulmanos e teriam jurado lealdade ao grupo autodenominado Estado Islâmico.

Mas barrar muçulmanos não é uma política americana. Nunca foi uma política americana. Eu apostaria todas as minhas economias de que isso nunca será uma política americana.

É tentador desqualificar o comentário como um golpe de publicidade, uma jogada de Trump para polarizar a campanha, chamar atenção e conquistar alguns pontos extras nas pesquisas de intenção de votos.

Quase dá para imaginar alguém da campanha de Trump pensando: "O que podemos dizer para chocá-los desta vez?".

Afinal, esse foi apenas o último de uma série de comentários linha dura sobre imigrantes e muçulmanos.

Mas essa declaração foi mais extrema e desencadeou ondas de revolta vindas até de republicanos - e é preciso analisá-la, por diversas razões.

Primeiro, a afirmação de Trump - que foi recebida com animação por seus simpatizantes em um comício - diz algo sobre o estado do eleitorado americano.

Trump lidera a corrida eleitoral entre os republicanos por uma grande margem de diferença, e ele está nesta posição, em parte, por dizer coisas como estas.

Sim, seus simpatizantes gostam do fato de ele ser uma celebridade - o magnata apresentava a versão americana de O Aprendiz -, mas também foram as suas posições extremas que deram a ele popularidade suficiente entre eleitores de primárias republicanas para colocá-lo no topo da intenção de votos.

E, lembre-se, isso não é um sentimento unicamente americano - o que será que a líder do partido de extrema-direita francês Frente Nacional, Marine Le Pen, pensa dos mais recentes planos de Trump?

Segundo, a reação de outros pré-candidatos republicanos diz muito. O governador de Nova Jersey, Chris Christie, foi o primeiro a criticar a proposta de Trump. Em uma entrevista no rádio pouco após a proposta ser divulgada, Christie a chamou de ridícula.

Marco Rubio chamou o plano de bizarro. Jeb Bush disse que Trump deveria estar alterado ao fazer uma afirmação do tipo.

O senador Lindsey Graham, da Carolina do Sul, pediu que os candidatos condenassem Trump e até Ted Cruz, senador do Texas que está alcançando Trump em intenções de votos em Iowa, segundo pesquisas recentes, disse que essa não seria uma política sua.

Em declarações polêmicas anteriores, os pré-candidatos republicanos hesitaram em criticar o líder nas pesquisas. Mas não dessa vez.

É preciso se perguntar se o nomeado pelo partido para concorrer à eleição será julgado, em parte, pela forma como reagiu a essa última declaração de Trump.

Isso se o nomeado não for o próprio - o homem que quer impedir qualquer muçulmano de entrar nos EUA.

Mas é preciso observar os próximos passos com cautela.

Até o momento, todas as vezes que comentaristas políticos previram que um comentário "inaceitável" de Trump significava que ele havia ido longe demais, os eleitores pensaram diferente - e ele acabou subindo ainda mais nas pesquisas.

Será interessante ver o que acontecerá desta vez.

Eu, pessoalmente, aprendi que é loucura fazer previsões sobre o futuro político de Trump.