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Em meio à confusão e indefinição dos adversários, Trump se autodeclara vencedor das primárias democratas em Iowa

Eleitores democratas aguardam a divulgação do resultado das primárias em Iowa - Reuters
Eleitores democratas aguardam a divulgação do resultado das primárias em Iowa Imagem: Reuters

Mariana Sanches - @mariana_sanches

Da BBC News Brasil em Washington

04/02/2020 09h59

A confusão na apuração dos votos da primeira rodada das primárias democratas em Iowa levou o presidente americano Donald Trump, republicano que tentará a reeleição em novembro, a se autodeclarar o vencedor da disputa entre os opositores.

"A única pessoa que pode reivindicar uma grande vitória em Iowa na noite passada é 'Trump'", tuitou o presidente americano na manhã desta terça-feira, 4/2, quando o atraso na divulgação dos resultados já somava mais de 8 horas.

De acordo com os democratas, o problema aconteceu na hora de contabilizar os apoios em um software adotado pelo partido. Nas redes sociais, uma série de representantes democratas afirmava não ser capaz de manejar o sistema.

Chamado de caucus, o sistema eleitoral das primárias em Iowa já é complexo de saída: primeiro, cada eleitor aponta seu candidato preferido. Computadas as preferências, todos os pré-candidatos que receberam menos de 15% dos votos são eliminados da disputa e seus eleitores são convidados a votar mais uma vez, escolhendo algum dos pré-candidatos remanescentes.

E assim o processo se repete até que não haja mais nenhum postulante com menos de 15% dos votos. O número de delegados — representantes do partido com direito a voto na convenção nacional em julho — é dividido proporcionalmente entre os vencedores.

Os democratas afirmaram ter encontrado "inconsistências" nas diferentes etapas de votação da primária ontem. E passaram a conferir os resultados mostrados pelo sistema com fotos e anotações manuais de cada local de votação. Ainda na noite de ontem, em nota, eles informaram que não havia ataque de hackers. Dentro das hostes democratas, a acusação foi de que o partido falhou em desenvolver e testar seu sistema de dados.

"Aposto até meu último dólar que o aplicativo usado em Iowa e que falhou não foi desenvolvido internamente e é um aplicativo da web projetado para economizar custos e executar em uma ampla variedade de dispositivos. Também aposto que não há um servidor de back-end real e que ele usa algo como planilhas de Google docs para gerar relatórios", afirmou a especialista em segurança digital e desenvolvedora de softwares Brianna Wu, candidata democrata à Câmara dos Deputados por Massachussets.

O caos tecnológico provocou um forte anticlímax entre os democratas. O resultado obtido em Iowa, apenas o trigésimo PIB entre os Estados americanos, não define ainda a indicação democrata, mas é considerado simbólico sobre quem deverá sagrar-se candidato.

"É verdade que, desde 2000, o vencedor em Iowa se tornou o candidato nomeado em 100% das vezes. Este ano é um pouco incomum, no entanto, porque há muito mais postulantes do que vimos nas últimas décadas", argumenta Samara Klar, professora da Escola de Governo e Política Pública da Universidade do Arizona.

A profusão de pré-candidatos — são ao menos oito competitivos — se deve ao fato de que os democratas ainda não conseguiram concluir qual esquerda tem mais chances de bater Trump: aquela mais moderada, não disruptiva e até por isso menos empolgante, ou aquela mais progressista e radical, que promete transformações profundas na sociedade americana e por isso assusta e afugenta eleitores mesmo na base democrata.

De um lado, estão postulantes antiestablishment, o senador por Vermont e autodenominado socialista Bernie Sanders e a senadora de Massachussets Elizabeth Warren, conhecida por suas posturas anti-Wall Street. De outro, candidatos alinhados com a tradição moderada da legenda, como o ex-vice-presidente Joe Biden, o bilionário e ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg, o veterano do Afeganistão e ex-prefeito no estado de Indiana Pete Buttigieg, e a senadora por Minnesota Amy Klobuchar.

"No geral, o que estamos vendo se desenrolar em Iowa é uma luta pela alma do Partido Democrata", resume o cientista político Thomas Whalen, da Universidade de Boston.

Em meio à falta de um veredito sobre a disputa em Iowa, os pré-candidatos se dividiram entre se autoproclamar vencedores ou líderes — como fizeram Buttigieg, Klobuchar e Sanders — ou dar por encerrada a etapa e partir para a próxima quando as primeiras notícias de desempenho não soavam auspiciosas, como fez Joe Biden.

Espera-se que até o final do dia haja uma definição sobre o resultado dos democratas. Até lá, no entanto, seu rival a bater, Trump, já terá capitalizado o mau momento dos adversários.

"O caucus democrata é um desastre absoluto. Nada funciona, assim como quando eles administravam o país", comemorou Trump, que ainda essa semana deve ser inocentado no processo de impeachment a que responde desde o fim do ano passado no Congresso.