Opinião: Para salvar Paris, é preciso derrotar o Estado Islâmico

Roger Cohen

Em Milão (Itália)

  • Frank Augstein/AP

    Torre Eiffel foi iluminada com as cores da França em homenagem às vítimas

    Torre Eiffel foi iluminada com as cores da França em homenagem às vítimas

O massacre em Paris reivindicado pelo Estado Islâmico constitui, como declarou o presidente da França, François Hollande, um "ato de guerra". Logo, isso exige de todos os países membros da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, uma aliança militar ocidental) uma resposta coletiva de acordo com o Artigo 5º de seu tratado. Ele diz que: "Um ataque armado contra um ou mais deles na Europa ou América do Norte deve ser considerado um ataque contra todos".

Os líderes da Aliança já estão debatendo qual deve ser a resposta. Hollande já conversou com o presidente Obama. Outros países da Otan, incluindo a Alemanha e o Canadá, expressaram solidariedade. Mas indignação e ultraje, apesar de justificados, não bastam.

A única medida adequada, após a morte de pelo menos 129 pessoas em Paris, é militar, e o único objetivo proporcional à ameaça é esmagar o Estado Islâmico e eliminar sua fortaleza na Síria e no Iraque. Não se pode permitir que os terroristas bárbaros, exultando nas redes sociais o sangue que derramaram, mantenham controle de território no qual possam organizar, financiar, dirigir e planejar sua selvageria.

Hollande não deixou dúvida de que os ataques foram "preparados, organizados e planejados no exterior, com cumplicidade interna". O Estado Islâmico, ou um de seus afiliados, também reivindicou a responsabilidade pela recente queda de um avião russo de passageiros, com a perda de 224 vidas. Os Estados Unidos e o Reino Unido acreditam que essas reivindicações são críveis.

Foi errado desprezar o Estado Islâmico como sendo uma ameaça regional. Sua ameaça é global. Basta. Não pode ser permitido a uma certa qualidade de mal que disponha de território físico no qual possa se reproduzir. O papa Francisco declarou que os ataques em Paris não eram humanos. De certa forma, ele está certo. Mas a história nos ensina que os seres humanos são capazes de um mal abismal. Se não combatido, ele cresce.

Forças em solo

Derrotar o Estado Islâmico na Síria e no Iraque exigirá forças da Otan em solo. Após as intervenções ocidentais prolongadas e inconclusivas no Iraque e Afeganistão, é razoável perguntar se isso não seria insensatez. Também é razoável questionar –e muitos o farão– se uma ação militar só resultaria em um maior recrutamento pelo Estado Islâmico, com mais vidas e recursos desperdiçados. Como há muito se sabe, o terrorismo nunca pode ser completamente derrotado. 

Esses argumentos são sedutores, mas é preciso resistir a eles. Uma guerra aérea contra o Estado Islâmico não concluirá o trabalho. Os ataques em Paris ocorreram em meio a uma campanha de bombardeio não persuasiva. As grandes potências, incluindo Rússia e China, condenaram vigorosamente os ataques a Paris. Elas não devem ficar no caminho de uma resolução das Nações Unidas autorizando uma ação militar para derrotar e eliminar o Estado Islâmico na Síria e no Iraque. Os poderes regionais, especialmente a Arábia Saudita, têm interesse em derrotar o monstro que ajudaram a criar, cujo Califado imaginado os destruiria.

O Estado Islâmico é hábil e eficaz. Ele conta com uma máquina de propaganda bem dirigida e uma ideologia atraente aos jovens muçulmanos descontentes, persuadidos de uma deslealdade ocidental. A combinação de interpretação literal medievalista e habilidade tecnológica produziu um exército fanático de apelo internacional. Mas o Estado Islâmico está longe de ser insuperável em termos militares. A inteligência ocidental agora é elaborada. A morte quase certa em um ataque aéreo na quinta-feira de Mohammed Emwazi (conhecido como Jihadi John), o executor mais procurado do Estado Islâmico, demonstra isso.

Não basta dizer, como o governo Obama tem feito até agora, que o Estado Islâmico será derrotado. Essas palavras carecem de significado sem um plano correspondente. Há a pressão do tempo, porque tempo está sendo usado precisamente para o planejamento de novas atrocidades.

A cada uma, aumenta a possibilidade de um agravamento da violência religiosa e sectária nas sociedades europeias estressadas. O ódio aos muçulmanos parece estar crescendo. O Bataclan, o clube visado nos ataques de Paris, como apontou a revista francesa "Le Point", é um local de encontro frequente de organizações judaicas.

As mortes ocorreram enquanto centenas de milhares de refugiados muçulmanos desesperados da Síria seguem para a Europa. Este não é o momento de dar as costas a eles, mas sim de ajudá-los, mesmo que vigilância extrema seja necessária. Eles também, em sua vasta maioria, estão fugindo do Estado Islâmico, assim como da violência indiscriminada do presidente Bashar al-Assad. A não intervenção na Síria provou ser uma política repleta de risco e derramamento de sangue, agora se infiltrando na Europa.

A batalha será longa. O Islã está em um estado de crise febril, dilacerado pela batalha regional de interesses sunitas e xiitas (diga-se Arábia Saudita e Irã), aflito pela metástase de uma ideologia de ódio anti-Ocidente e fundamentalismo wahabista, buscando um meio-termo razoável com a modernidade. O flagelo em seu interior provavelmente só pode ser derrotado internamente, pelas centenas de milhões de muçulmanos que são pessoas de paz e estão chocadas, como qualquer ser sensível, com o massacre de Paris. Suas vozes precisam se erguer em um uníssono, sem ambiguidade e de modo sustentado.

Esmagar o Estado Islâmico na Síria e no Iraque não eliminará a ameaça do terrorismo jihadista. Mas o perfeito não deve ser inimigo do bom. A passividade é uma receita para o fracasso certo. É hora, em nome da humanidade, de agir com convicção e força contra o flagelo do Estado Islâmico. Desunião e distração minaram os esforços militares anteriores para derrotar os jihadistas. A união agora é possível, e com ela a vitória.

Tradutor: George El Khouri Andofalto

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