Debate sobre o massacre do Colorado expõe incompreensão entre europeus e americanos
Os Estados Unidos e a Europa Ocidental compartilham uma longa tradição de valores ligados à tolerância, à liberdade e ao respeito dos direitos humanos. Difundidos pelo Iluminismo no século 18, esse ideal incorporou-se à legislação europeia e americana. Tais valores também aparecem nas constituições dos países democráticos pelo mundo afora.
No entanto, há dois temas sobre os quais reina a incompreensão mais total entre os europeus e os americanos: a existência da pena de morte e o uso generalizado de armas de fogo nos Estados Unidos. Sobre o primeiro tema, há uma lenta evolução. Embora somente 17 Estados e o Distrito de Columbia tenham abandonado a pena de morte, a abolição no Illinois em 2011 e no Connecticut em abril deste ano, além do embargo à aplicação da pena em outros Estados, mostra uma mudança gradual.
De todo modo, a União Europeia (UE) conta ajudar o movimento abolicionista americano. Assim, a UE proibiu, no ano passado, que as firmas europeias exportassem para os Estados Unidos certos anestesiantes ministrados aos condenados à morte americanos antes das injeções letais na hora da execução.
Sobre o outro tema, a permissão para a posse e uso das armas de fogo, a incompreensão entre europeus e americanos permanece e acentua-se. Sobretudo quando ocorre uma tragédia como o massacre no cinema em Aurora, no Colorado, dia 20 de julho.
Editorialistas, comentadores e blogueiros europeus exprimiram sua perplexidade, listando os números assustadores sobre a violência nos EUA. Assim, a taxa de homicídio por arma de fogo corresponde a 20 vezes a soma dos outros países ocidentais, incluindo o Canadá. A evocação das sondagens mais recentes sobre o assunto, mostrando que em 2011, 73% dos americanos se oporiam a uma lei que banisse o porte de armas, aumenta o estranhamento entre europeus e americanos.
Nestas circunstâncias, a maioria dos políticos e, sobretudo, os dois candidatos à presidência, Romney e Obama, prefere evitar discussões sobre o tema. Tanto mais que uma recente análise publicada no site da CNN mostra que a eleição presidencial tem grandes chances de terminar empatada. Provocando um impasse parecido com o das presidenciais de 2000.
Porém, o prefeito republicano (mas liberal) de Nova York, Michael Bloomberg, interpelou diretamente os dois candidatos. Numa declaração pública, ele declarou ter chegado a hora dos dois candidatos darem sua opinião sobre a matéria, completando: “há muitos assassinatos cometidos todo ano com armas de fogo, e isto deve acabar”.
Aparentemente, a interpelação surtiu algum efeito porque logo em seguida Obama falou mais diretamente sobre o porte de armas. Depois de afirmar sua crença no direito constitucional que os americanos possuem para deter armas de fogo, ele fez uma nuance: “mas eu também acredito que muitos donos de armas de fogo concordarão que o fuzil AK-47 deve estar nas mãos dos nossos soldados e não nas ruas de nossas cidades”.
Muitos consideram, entretanto, que a declaração presidencial está aquém do esperado de um candidato do partido democrata. Aliás, um comunicado da Casa Branca atenuou a declaração de Obama, notando que nenhuma medida será tomada sobre a questão do porte de armas.
Fica então mais pertinente o artigo de reflexão de Alex Koppelman no New Yorker, reproduzido pelos sites jornalísticos europeus. Nele, Koppelman escreve: “Há um protocolo na política americana para fazer face a dias como estes [do massacre de Aurora]. Os políticos mudam de assunto. Oferecem palavras reconfortantes às vítimas e à suas famílias...Eles fazem discursos emocionantes. Eles não falam do controle do porte de armas”.
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