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Grande interesse da espionagem americana no Brasil está nos cabos submarinos

29/07/2013 11h29

Na entrevista que deu ao jornal “O Globo” no começo do mês de julho, o jurista e jornalista americano Glenn Greenwald, que vive no Brasil, fez uma declaração surpreendente. Segundo Greenwald, editor de um blog no portal do jornal londrino The Guardian, os documentos secretos americanos copiados por Edward Snowden demonstram que o Brasil é um dos países mais espionados pela rede PRISM, montada por Washington. Milhões de e-mails e chamadas telefônicas no Brasil teriam sido interceptadas pelos Estados Unidos.

A notícia suscitou alguns sarcasmos. Internautas brasileiros e estrangeiros perguntaram, às vezes com ironia: será que o Brasil, onde não há atividades terroristas internacionais, é um país tão importante assim?

Ryan Lizza, correspondente da revista New Yorker em Washington e colaborador da CNN,  também ficou intrigado com o assunto. Depois de ouvir uma declaração do general Keith Alexander, diretor da National Security Agency (NSA) – organismo do Departamento de Defesa dos EUA -, e de entrevistar o general Michael Hayden, ex-diretor da CIA e da própria NSA, Lizza junto os pontos e foi ao essencial.

Sua análise mostra que a atenção dos serviços de segurança não está voltada para o que se fala e o que se escreve nas redes de comunicação brasileiras. O que interessa à NSA é o que está sendo transmitido ao largo das praias do Brasil: nos circuitos de cabos submarinos que passam ao longo da costa e afloram em alguns pontos do litoral.

Como indica um mapa muito ilustrativo inserido no artigo de Ryan Lizza, Santos, Rio de Janeiro, Natal e sobretudo Fortaleza são importantes elos de conexão dos cabos internacionais de fibra ótica por onde circulam torrentes de informações na velocidade da luz. Em Natal e Fortaleza convergem os únicos quatro cabos que ligam a África subsahariana às América, que também estão conectados aos cabos europeus, norte-africanos e do Oriente Médio. São essas conexões que o programa PRISM grampeia na costa brasileira, e são elas que explicam a grande espionagem americana no Brasil.

Sabe-se que na virada do século 20 a criação das redes internacionais de cabos telegráficos submarinos deu lugar a rivalidades e enfrentamentos entre as grandes potências da época. Na era da informática, o papel estratégico dessas redes de cabos aumentou exponencialmente, mas o assunto suscita pouco interesse no Brasil.

O primeiro Livro Branco da Defesa Nacional, lançado no ano passado pelo Ministério da Defesa, sintetizou as informações e os estudos sobre a segurança brasileira. Há análises sobre o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras, sobre a importância do Atlântico Sul, as bacias petrolíferas do pré-sal e as relações políticas e militares brasileiras com os países africanos. Mas não há mapas ou sequer referência à relevância estratégica dos cabos de transmissão maciça de dados submersos ao longo do litoral brasileiro.

Há duas semanas, alguns jornais noticiaram a declaração do general Keith Alexander, afirmando que a NSA não lia os emails dos brasileiros. Da mesma forma, a reportagem de Ryan Lizza na New Yorker foi competentemente assinalada por Nelson de Sá, na Folha de S. Paulo. No entanto, não houve mais nenhuma referência à espionagem dos cabos submarinos. Nem na audiência pública realizada no Senado no dia 10 de julho, nem nas declarações dos ministros Antônio Patriota e Celso Amorim. Em todas essas ocasiões as autoridades brasileiras deram ênfase ao eventual grampeamento de informações no solo brasileiro pelos americanos.

Ficou claro que as autoridades brasileiras não sabiam que o país estava sendo intensamente espionado pelos americanos. Agora ficou evidente que também não sabiam por quê.