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Militares tinham acesso a joias guardadas por Bolsonaro em imóvel de Piquet

Colunista do UOL

29/04/2023 04h00Atualizada em 29/04/2023 14h33

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A investigação sobre as joias sauditas obteve informações detalhadas a respeito do armazenamento de bens, a pedido do ex-presidente Jair Bolsonaro, em uma fazenda em Brasília pertencente ao ex-piloto de Fórmula 1 Nelson Piquet. Faziam parte desse acervo dois kits de joias dados de presente pela Arábia Saudita e que foram devolvidos por sua defesa após ordem do Tribunal de Contas da União (TCU).

Dois militares nomeados para assessorar Bolsonaro após ele ter deixado a Presidência contaram, em depoimentos prestados à Polícia Federal, que somente eles têm acesso ao local e que não há nenhum tipo de registro escrito sobre o manuseio desse material.

Coronel da reserva do Exército, Marcelo da Costa Câmara é assessor de confiança de Jair Bolsonaro e recebeu a missão de cuidar do acervo pessoal dele após a saída da Presidência da República. Câmara escalou o tenente do Exército Osmar Crivelatti para lhe auxiliar na tarefa. Foram eles, em momentos diferentes, os responsáveis por buscar os dois kits de joias no acervo para devolução ao TCU. Eles explicaram como funcionava o armazenamento:

  • O acervo é composto por mais de 9 mil objetos e ocupam um espaço de aproximadamente 200 m³. Ficam em um depósito na Fazenda Piquet, localizada em região próxima ao Lago Sul, bairro nobre de Brasília.
  • De acordo com os militares, o material é armazenado sem custo na fazenda e fica em um local arejado e sem umidade.
  • "Não há controle de acesso ao local, mas apenas o depoente e Marcelo possuem esse acesso", afirmou Crivelatti.
  • Apesar da grande quantidade de objetos, os dois kits de joias foram guardados de forma separada dos demais itens. De acordo com Crivelatti, essa diferenciação foi feita pelos servidores do Gabinete Adjunto de Documentação Histórica durante o processo de catalogação do material para armazenamento.
  • "O depoente lembra que na época da embalagem, os técnicos do GADH separaram alguns itens mais sensíveis que pudessem ser do interesse do presidente Bolsonaro e informaram ao depoente e ao Marcelo Câmara", contou Crivelatti.
  • Por isso, prosseguiu ele, "na hora de acondicionar esse material na Fazenda Piquet, esses itens também foram colocados em um lugar mais reservado, o que facilitou encontrar as joias no meio do acervo privado presidencial".

Em seu depoimento, Marcelo Câmara também foi questionado pelos investigadores se essas joias haviam sido levadas por Bolsonaro aos Estados Unidos em sua viagem no fim do ano passado, mas respondeu negativamente.

"Tem certeza que as joias não foram levadas aos Estados Unidos, pois o depoente estava nos Estados Unidos juntamente com o ex-presidente da República Jair Bolsonaro e sabe que elas não estavam lá", respondeu.

Fazenda de amigo

Bolsonarista, o ex-piloto de Fórmula 1 Nelson Piquet é o dono da fazenda que armazena os itens do ex-presidente.
Com área total de 91 hectares, o local tem área residencial, mas também sedia um centro hípico, com aulas de equitação, e até mesmo uma pista de pouso para aeronaves.

Em seu depoimento à PF, Jair Bolsonaro disse que o galpão foi "emprestado" por Piquet para o armazenamento de seus itens. A investigação não detectou irregularidades a respeito dessa guarda dos presentes na fazenda.

'Patrimônio público'

Em outro depoimento prestado à Polícia Federal, o ex-número 2 da Receita Federal, José de Assis Ferraz Neto, afirmou que as joias retidas pelo órgão no Aeroporto de Guarulhos dadas de presente pela Arábia Saudita não poderiam ser destinadas ao patrimônio pessoal de Bolsonaro.

"O único destino possível seria a destinação para a União, não tinha como deduzir ser para o patrimônio privado do presidente da República, pois não há previsão legal para isto", afirmou.

Os investigadores, entretanto, já identificam indícios de que Bolsonaro buscava se apropriar desses bens, sem destiná-los ao patrimônio do governo federal, o que poderia caracterizar crime de peculato. O depoimento de Assis reforça o caráter público dessas joias.

A defesa de Bolsonaro nega irregularidades sobre o recebimento das joias. Jair Bolsonaro disse à PF que não pressionou servidores para a retirada das joias retidas pela Receita Federal.