País vive clima de fim de feira, e o capitão vai para a praia, dando risada
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De que tanto ri ultimamente o nosso capitão presidente da República?
Podem reparar: qualquer que seja o assunto, ele fala alguma bobagem, e cai na gargalhada. Só pode estar rindo da cara de quem o elegeu.
Nesta última semana do ano, em que Jair Bolsonaro completa a primeira metade do seu mandato tragicômico, deixando para trás um país detonado e acéfalo, o que ele faz?
Vai outra vez para a sua praia particular no Forte dos Andradas, um condado do Exército no Guarujá, o mesmo balneário paulista onde Jânio Quadros ficou confinado por um bom tempo, nos anos 60, depois de chutar para o alto o cargo de presidente da República.
Jânio também ria muito quando fui entrevistá-lo no Guarujá sobre as razões da sua renúncia, poucos meses após a sua posse. O Brasil deve ser um país muito engraçado para os donos do poder.
Mas do capitão não se deve esperar o mesmo gesto de grandeza do presidente relâmpago, pois está cada vez mais deslumbrado com as mordomias do poder, garantido por uma tropa de generais aquartelados no Palácio do Planalto, todos eles indiferentes ao seu redor, onde já se contam quase 200 mil mortos e 14,1 milhões de desempregados no campo da batalha perdida contra a pandemia.
Partiu boteco
Seguindo o exemplo do presidente, milhões de brasileiros estão fazendo o mesmo, dando uma banana para o mundo, e se aglomerando alegremente nas praias, nos botecos e nas festas de fim de ano.
Sem nenhuma vacina comprada e aprovada até agora, com o general da logística desaparecido há vários dias, mais perdido do que cego em tiroteio, o Brasil bate outra vez recordes diários de óbitos e de contaminados pelo coronavírus, mas parece que só os médicos dos hospitais superlotados ainda se preocupam com isso.
Lamento informar, mas não há nenhum sinal no horizonte de que os próximos dois anos de mandato do capitão sejam diferentes.
Muito ao contrário de Jânio, agora Bolsonaro só pensa na reeleição e vai comprar quantos deputados forem necessários para eleger o próximo presidente da Câmara, fazendo qualquer negócio para continuar onde está e garantir a impunidade da família das "rachadinhas" aplicadas em imóveis adquiridos com grana viva.
Lembranças de Samuel Wainer
Mudam os tempos, os homens e as histórias, mas o Brasil não consegue escapar da tutela dos militares, desde a Proclamação da República, que não passou de uma quartelada, a primeira de uma série.
Cheguei a essa conclusão ao ler a brilhante biografia "Samuel Wainer - O homem que estava lá", escrita com maestria pela jornalista Karla Monteiro (Companhia das Letras).
Íntimo de três presidentes da República antes do golpe militar de 1964 — Getúlio, Juscelino e Jango, que assumiu após a renúncia de Jânio —o grande jornalista Samuel Wainer, que criou e comandou a rede de jornais "Última Hora", um ponto fora da curva da grande mídia, foi ao mesmo tempo repórter e protagonista do jogo de poder travado entre civis de esquerda ou de direita, liberais ou trabalhistas, sob a permanente mediação de militares nacionalistas ou entreguistas.
Daquela época emergem dois grandes personagens: o eterno golpista civil Carlos Lacerda, que tinha um caso de amor e ódio mal resolvido com Wainer, e o general Henrique Teixeira Lott, o grande defensor da Constituição, para garantir as posses de Getúlio, Juscelino e Jango, que acabou derrotado justamente por Jânio Quadros, na eleição presidencial de 1960.
Não consigo mudar de assunto
Nem Glauber Rocha, em seus roteiros mais delirantes, seria capaz de criar esta trama que, no começo do terceiro milênio, revelou um personagem chamado Jair Bolsonaro, um ex-tenente terrorista, defenestrado pelo Exército, que chegou a presidente pelo voto direto, com o apoio dos generais.
Empobrecemos. A direita golpista não tem mais nenhum tribuno como Lacerda e o Exército não tem mais nenhum general com a grandeza de Lott para defender a democracia. .
E no jornalismo não temos mais nenhum jornalista como Samuel Wainer, repórter, editor e dono de jornais, um sonhador que sacudiu e renovou a imprensa brasileira, pagando bons salários aos jornalistas, com o dinheiro que tomava de governos, bancos e empresários.
Virou agora tudo uma geleia geral, em que pontificam personagens menores, grotescos e patéticos, por todos os lados, sem brilho nem ideal (até rimou...), que só querem levar vantagem em tudo, enquanto o país se degrada diante do mundo, queimando a Amazônia e não conseguindo vacinar a sua população.
É muito, muito triste tudo isso, eu sei, mas é o que temos. Não consigo mudar de assunto.
Vida que segue.
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