Não vote neste domingo
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Votar? Que coisa mais antiga! No meu tempo, ninguém votava. E era tudo melhor. A gente ia a pé para a escola, tinha aula de moral e cívica, cantava o Hino Nacional e amava o Brasil. Ou o deixava. Este era um país que ia pra frente, talquei?
Não vote.
Não entendo essa fixação de vocês com a eleição. Dizem que é a "festa da democracia". Pancadão da democracia, isso sim. Pouca vergonha da democracia. Gente presa por fazer boca de urna, voto de cabresto, maluco trocando voto por cesta básica, patrão lotando o carro e levando um monte de mané pra votar no candidato que ele apoia. E no dia seguinte? Ruas imundas, lotadas de cédulas e santinhos. É isso a democracia?
Não vote.
Cá entre nós, faz alguma diferença? Em São Paulo, por exemplo, algum prefeito resolveu o problema da Cracolândia? Acabou com os ônibus lotados, parecendo lata de sardinha? Acabou com os engarrafamentos? Com as enchentes?
Não vote.
Você é uma pessoa informada, um brasileiro de bem que acompanha a internet, usa o WhatsApp, envia um monte de vídeos no grupo da família. Você não ficou sabendo que os resultados da eleição já estão definidos? Que as urnas usam uma tecnologia chinesa com um software russo que pode ser monitorado remotamente direto de um gabinete de Xangai ou de Moscou? E que a tecla verde está programada para transmitir coronavírus para quem apertar? E que os comunistas estão no comando para fraudar as eleições?
Não vote.
Vamos boicotar essa eleição. É fundamental que ninguém vote. E, se votarem, vamos interromper a contagem! Go, Georgia, go!
Não vote.
Você, seu marica, que está há oito meses sem sair de casa por causa dessa gripezinha. Você que deixou de abraçar vários dos seus amigos e parentes nos dias de seus aniversários. Talvez esteja com saudade de ir ao cinema ou à churrascaria, não é, minha filha? Você vai sair de casa justo agora, em razão de uma coisa tão fora de moda quanto votar?
Não vote.
E por que raios você quer votar? O filósofo Tiririca já ensinou que pior que tá fica. Deixa tudo como está. O Anhangabaú vai continuar enchendo. Ciclista vai continuar morrendo. Nóia vai continuar levando toco da polícia. Preto assassinado na bala, a carne mais barata do mercado. Milícia ditando as regras no Rio. Mais um cemitério clandestino na conta do Escritório do Crime. E você aí saindo de casa e pegando fila para reeleger os mesmos políticos de sempre? O mesmo bandido de estimação?
Não vote.
Eu vi as pesquisas. Não dá para entender você. Seu plano é fazer tudo exatamente igual e esperar um resultado diferente? Eu, hein, parece até terraplanista.
Não vote.
Agora, se você acha que sua cidade precisa de você, e que cada voto é importante, e que é preciso começar agora, o quanto antes, para reinventar o futuro, então vá. Nesses dias soube que a Margarida Genevois, aos 97 anos, está decidida a sair de casa para digitar seu voto em favor da democracia. Se for esta, também, sua decisão, não vote por ódio nem por comodismo. Também não vote em branco. Votar em branco não serve pra nada (com o perdão do duplo sentido).
Vá de máscara e use álcool em gel.
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