Carlos Madeiro

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Reportagem

Por que sertão da PB é local ideal para radiotelescópio 'ouvir' o universo

No primeiro semestre de 2024, a paisagem da serra do Urubu, no município paraibano de Aguiar, vai mudar para sempre: o local receberá o maior radiotelescópio do país e um dos mais importantes do mundo.

O Bingo (sigla em inglês para Oscilações Acústicas de Bárion de Observações Integradas de Gás Neutro) vai "escutar" o passado e ajudar os cientistas a finalmente entenderem o que é a energia escura que hoje acelera a expansão do universo.

Com ele a gente vai olhar o universo quando ele tinha entre 9 a 12 bilhões de anos atrás [e o universo tem 13,7 bilhões de anos], quando a expansão do universo passou a ser governada pela energia escura.
Carlos Alexandre Wuensche, pesquisador principal do Inpe

Mas porque lá?

O equipamento será o primeiro radiotelescópio a detectar as BAO (Oscilações Acústicas de Bárion) por meio de ondas de rádio do mundo. Acontece que captar essas ondas é um desafio em um mundo repleto de outros tipos de ondas de rádio, produzidas pelo homem, no ar.

Para chegar a um local apropriado, os cientistas passaram cerca de 6 meses visitando mais de 30 locais no Uruguai e no Brasil até chegarem na serra do Urubu. "Em uma linha reta, foram 2.700 quilômetros percorridos até chegar ao local", explica Carlos.

Em Aguiar, os cientistas ficaram surpresos com a ausência de sinais de rádio produzidos pelo homem.

É muito raro achar um lugar desse, porque em todo canto hoje tem ondas circulando, seja de celular, de rádio, de wi-fi, ou de controle aéreo. Então, a escolha da área era fundamental porque, quanto menos 'contaminação', melhor. Existem poucos locais no mundo com esse baixo nível de contaminação: a Antártica, o deserto de Atacama [Chile], e regiões isoladas no interior da Austrália e da África do Sul.
Carlos Alexandre Wuensche

Carlos diz que os cientistas, ao fazerem os primeiros testes na região, ficaram surpresos porque a área era "absurdamente limpa."

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Fizemos várias vezes as medidas para confirmar que não havia problemas nos equipamentos. Totalizamos mais de 24 horas de observação espalhados por vários dias. Foi uma bela surpresa vermos o resultado.
Carlos Alexandre Wuensche

Entenda o que se busca

As BAOs são ondas geradas pela interação dos átomos com a radiação no início do universo.

O objetivo principal do Bingo será identificar as BAOs, a partir de medidas da distribuição do hidrogênio neutro em distâncias cosmológicas. Com essas informações, será possível estudar as propriedades da energia escura.

Carlos explica que se as observações tiverem o êxito esperado, os cientistas poderão responder uma das perguntas mais intrigantes da astronomia: o que é a energia escura que impulsiona o universo.

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A época que a gente está investigando é aquela em que energia escura passou a dominar a expansão do universo, acelerando-a. E ela é importante porque constitui cerca de 70% da composição do universo, mas sua origem e propriedades são, no século 21, ainda um mistério para a ciência.
Carlos Alexandre Wuensche

Imagem revela como ficará o Bingo quando estiver pronto
Imagem revela como ficará o Bingo quando estiver pronto Imagem: Divulgação

Parcerias e investimentos

As discussões para construção do equipamento remontam ainda a 2010. Após estudos, o primeiro artigo científico sobre o Bingo saiu três anos depois.

O projeto final foi aprovado em 2019 com a revisão dos pares cientistas, mas a montagem dos equipamentos começou em 2018. Já as obras no sítio foram iniciadas no ano passado.

Até agora, o Bingo já teve investimento de cerca de R$ 35 milhões na primeira fase prevista do projeto.

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Parte da infraestrutura para receber o radiotelescópio na Paraíba já está pronta, com a expectativa de a construção civil para receber espelhos e cornetas estar concluída até dezembro de 2023. Entretanto, um protótipo da corneta com o receptor, denominado "Uirapuru", já está em funcionamento no campus da UFCG desde 2021.
Carlos Alexandre Wuensche

Área onde será instalado o Bingo, em Aguiar (PB)
Área onde será instalado o Bingo, em Aguiar (PB) Imagem: Divulgação

A fabricação de equipamentos integrantes do radiotelescópio está sendo feita pela empresa CETC54, da China, e a previsão de entrega é fevereiro de 2024.

Um edital será lançado nos próximos dias para contratar a empresa que construirá as fundações, preparando a montagem do equipamento.

Até junho de 2024, espera a equipe, o Bingo deve estar montado e operando com suas primeiras cornetas. "A partir daí temos um processo de comissionamento, para garantir que o instrumento está funcionando como esperado, e podemos fazer as primeiras observações científicas", explica.

A fase 2 —que será complementar— deve ter pelo menos mais R$ 35 milhões (o valor total ainda é incerto) e vai envolver outros tipos de receptores. O recurso deve ser captado junto a agências de fomento a partir do próximo ano.

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A ideia é que a nova fase esteja operando até 2028, elevando a qualidade da pesquisa.

Nós vamos ampliar muito a capacidade do Bingo e coloca-lo entre os telescópios mais competitivos do mundo, sem dúvida.
Carlos Alexandre Wuensche

O Bingo é uma colaboração multinacional e está sendo desenvolvido em parceria por:

  • INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais)
  • USP (Universidade de São Paulo)
  • UFCG (Universidade Federal de Campina Grande)
  • Governo da Paraíba
  • Universidade de Shanghai Jiao Tong (China)
  • Universidade de YangZhou (China)
  • University College London (Inglaterra)
  • Universidade de Manchester (Inglaterra)

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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