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Chico Alves

O quebra-quebra de Marcelo Crivella

Praça de pedágio da Linha Amarela  - Jose Lucena/Futura Pressa/Estadão Conteúdo
Praça de pedágio da Linha Amarela Imagem: Jose Lucena/Futura Pressa/Estadão Conteúdo

Colunista do UOL

28/10/2019 10h24Atualizada em 28/10/2019 16h13

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A espiral de insanidade política que assola o Brasil não para de produzir cenas absurdas. As últimas foram vistas ontem, na Linha Amarela, uma das principais vias de trânsito do Rio de Janeiro. Há meses, o prefeito Marcelo Crivella está em briga judicial com a concessionária para zerar o pedágio no local. Dias atrás, anunciou que a prefeitura romperia o contrato de concessão para passar a operar o tráfego, sob argumento de lucros abusivos. Na noite de domingo, o prefeito abandonou a tática jurídica e partiu para a ignorância.

Funcionários municipais usaram retroescavadeiras e barras de ferro para destruir as cabines de cobrança de pedágio. Quebraram vidros, inutilizaram computadores, fizeram em pedaços tudo o que puderam. Restaram guichês depredados, vidros estilhaçados e cacos de máquinas.

Desde então, os motoristas passaram a ter passagem grátis. Na manhã de hoje, porém, a Justiça determinou que a administração da Linha Amarela volte à concessionária Lamsa. Além disso, a prefeitura pagará R$ 100 mil por cada dia que a concessionária ficar impedida de operar.

Qualquer administrador de bom senso colocaria nos cálculos a possibilidade de uma reviravolta judicial. Mas, pelo visto, Crivella achou que daria a solução final. Hoje, em meio aos escombros da praça do pedágio, por onde passam diariamente 105 mil veículos, a Lamsa anunciou que levará tempo até poder retomar a atividade normal. Assim, o embate que poderia ter como resultado uma economia para o cidadão carioca gerou como consequência uma conta pesada para os cofres públicos. O arroubo do prefeito vai custar caro.

Crivella tem razão ao questionar os altos ganhos da concessionária. Ainda mais depois que uma CPI instalada na Câmara dos Vereadores chegou à conclusão de que houve lucro indevido de R$ 1,6 bilhão, além de outras irregularidades. No entanto, ao abandonar a civilidade da disputa jurídica e incorporar o espírito black bloc, o prefeito perdeu a razão. O próprio relator da CPI condenou a ação de ontem.

Impossível não identificar intenções populistas no vandalismo da prefeitura. Cansados de pagar um pedágio caro, os motoristas atravessavam ontem as cancelas em ruínas promovendo buzinaço. Afinal, qual cidadão vai ser contrário à supressão do pedágio? A forma como isso se deu, no entanto, colide com todas as regras de boa administração.

Além do prejuízo da multa diária que será repassado aos cofres públicos, há um outro: que conceito terão empresários e investidores de um mandatário que toma atitude como essa? Para uma cidade tão carente de aportes financeiros, isso deveria ser uma preocupação.

Por fim, as imagens de funcionários públicos depredando as cabines de pedágio não são nada educativas, especialmente nesses tempos de debates tão agressivos e ameaçadores por toda a parte. Numa época em que impera o discurso de ódio, governantes deveriam ser os primeiros a prestigiar as decisões dos tribunais, nunca aqueles que se dispõem a fazer Justiça com as próprias mãos.