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Chico Alves

Lava Jato: E agora, "filhos de Januário"?

Força-tarefa da Lava Jato, em 2015: Deltan Dallagnol ao centro. Januário Paludo é o terceiro da esquerda para a direita - Junior Pinheiro-31.mar.2015/Folhapress
Força-tarefa da Lava Jato, em 2015: Deltan Dallagnol ao centro. Januário Paludo é o terceiro da esquerda para a direita Imagem: Junior Pinheiro-31.mar.2015/Folhapress

Colunista do UOL

30/11/2019 13h14

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Desde que o site The Intercept começou a publicar os diálogos vazados que indicam parceria ilegal entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da força-tarefa da Lava Jato, defensores incondicionais dos métodos de Deltan Dallagnol e companhia alegavam que o objetivo final dessas revelações seria defender os corruptos. Por essa tese fundamentalista, Moro e a turma de Curitiba estariam acima do bem e do mal, a salvo de críticas ou suspeitas. Qualquer um que ouse fazer objeção a eles seria defensor da impunidade dos poderosos.

Entre os difusores desse maniqueísmo inclui-se até mesmo o ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal. Em várias oportunidades, ele rechaçou os críticos da Lava Jato com argumentos que praticamente os colocava como cúmplices da corrupção.

Interessante será acompanhar agora o discurso dessa turma diante das revelações contidas na matéria do repórter Vinicius Konchinski , que o UOL publica com exclusividade. Em diálogo a que a Polícia Federal teve acesso, o mais experiente procurador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, Januário Paludo, é citado pelo doleiro Dario Messer como beneficiário de propinas, com o objetivo de afastar o risco de que os procuradores atrapalhassem seus negócios ilegais.

É preciso notar que Paludo não é um procurador qualquer. Em vários diálogos revelados na Vaza Jato, ele é apontado como exemplo de conduta pelos colegas da força-tarefa, tanto que o grupo de Telegram onde Dallagnol e sua equipe trocavam mensagens tinha o nome "Filhos de Januário", em sua homenagem.

Paludo é referência para a força-tarefa em vários sentidos. Até mesmo na crueldade que dedica aos alvos de suas investigações. Segundo noticiou o The Intercept, ele fez comentários abjetos ao saber da internação no hospital de Marisa Letícia, mulher de Lula, que viria a falecer pouco depois: "Estão eliminando as testemunhas..."

Também foi Paludo que colocou sob suspeita a morte de Marisa. "A propósito, sempre tive uma pulga atrás da orelha com esse aneurisma. Não me cheirou bem", disse. Outros integrantes da força-tarefa destilaram esse ódio em comentários parecidos.

Por meses a fio, a série Vaza Jato mostrou diálogos com fortes evidências de atuação ilegal dos procuradores e do ex-juiz Moro. Os lavajatistas se defenderam colocando em dúvida a veracidade do material ou minimizando as revelações.

A acusação de agora não veio na forma de grampo ilegal, é produto de investigação da Polícia Federal. A veracidade, portanto, está garantida. Minimizar o fato não é possível dessa vez: como considerar corriqueira a denúncia de que um dos principais integrantes da principal ofensiva anticorrupção do país esteja envolvido com propina milionária?

A investigação sobre o diálogo revelador de Messer com sua namorada não chegou ao final e Paludo terá bastante espaço para se defender. A revelação deve servir como ponto de partida para a PF elucidar a questão, não como prova irrefutável de culpa. Considerá-la assim seria fazer sobre Januário Paludo julgamento sumário, algo que não combina com a civilização ou com a democracia.

Ironicamente, essa é uma das principais críticas feitas à Operação Lava Jato. Boa oportunidade para que os "filhos de Januário" reflitam sobre suas práticas.