Drauzio Varella, Suzy e o poder do abraço em tempos de cólera
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A expressão entristecida de Suzy, presa na penitenciária paulista José Parada Neto, parece ainda mais comovida ao ouvir a pergunta: "Há quanto tempo você não recebe uma visita?" Constrangida, ela responde, pouco antes de deixar escapar uma lágrima: "Sete anos, oito anos... bastante tempo".
O interlocutor, então, lamenta, emocionado: "Muito tempo, não é, minha filha?". Em seguida, dá-lhe um abraço carinhoso.
A imagem do médico Drauzio Varella abraçado a Suzy de Oliveira Santos, detenta transgênero e soropositiva, foi ao ar no Fantástico de domingo passado. Desde então, passou a ser replicada freneticamente nas redes sociais, acompanhada de comentários emocionados, gerando uma repentina onda de solidariedade.
No Facebook e no Twitter, surgiu um mutirão para enviar mensagens de conforto à presa. A Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo apoiou a ideia e criou a campanha "Cartas para Suzy". Outra trans mostrada no programa, que depois de passar a cumprir pena em regime aberto não consegue emprego, também é alvo de uma enorme corrente de solidariedade na internet.
Mesmo com bastante experiência em programas de TV, onde já apresentou séries e deu incontáveis entrevistas, o oncologista Drauzio Varella se mostrou surpreso com a repercussão da última reportagem. "Achei que ia causar um certo mal-estar essa discussão toda", admitiu.
A surpresa foi geral. Nesses tempos em que a homofobia se mostra tão desavergonhadamente e a opinião impulsionada pelos robôs nas redes sociais é de que os presos têm que mofar na cadeia sem qualquer atenção ou simplesmente matarem-se uns aos outros numa rebelião qualquer, o gesto de Drauzio despertou nas pessoas sentimentos opostos a estes.
E melhor: a emoção foi disseminada pelas redes sociais, ambiente tão contaminado pelo ódio de todos os tipos.
Em seu paciente trabalho de três décadas, levando aos presidiários palavras de alento e orientação que vão na linha da ressocialização que os governos não cumprem, o médico certamente não esperava que justamente agora, nesta época tão tóxica da vida nacional, e da política em particular, fosse motivar reações positivas em favor de pessoas marginalizadas
O episódio serve para alertar a todos nós, usuários das redes sociais, que talvez estejamos dando espaço demais a manifestações de rancor e intolerância, deixando de lado histórias bonitas de luta contra o preconceito e desigualdade que podem estar ao alcance dos nossos olhos.
Nada indica que a explosão espontânea de solidariedade a Suzy e outras detentas vá mudar milagrosamente a condição estrutural de pessoas excluídas como elas, espalhadas pelo Brasil inteiro. Pode ser, porém, um primeiro passo, por lembrar-nos o lado bondoso que muitas vezes esquecemos.
A mudança verdadeira desse quadro dramático de esgarçamento social é trabalhosa. Mas se houver reversão possível, ela não virá da cólera, hoje disseminada, mas da empatia, essa palavrinha da moda tão repetida quanto pouco praticada.
Ninguém espera soluções definitivas de um simples gesto de afeto, como se a vida fosse um filme da Sessão da Tarde. Mas o abraço de Drauzio e Suzy mostrou por onde devemos começar.
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