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Chico Alves

REPORTAGEM

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'Obrigar' voto útil em Lula não é democrático, diz ex-petista Eduardo Jorge

Eduardo Jorge (PV)  - Leo Martins/Folhapress
Eduardo Jorge (PV) Imagem: Leo Martins/Folhapress

Colunista do UOL

20/09/2022 04h00

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O apelo crescente pelo voto útil em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a ameaça que Jair Bolsonaro (PL) representa para a democracia brasileira não sensibiliza o ex-deputado Eduardo Jorge (PV), que foi filiado ao PT até 2003. Nessa eleição, ele apoia a candidatura de Simone Tebet.

Para o ex-petista, optar pelo mal menor ou pelo menos ruim entre os dois favoritos na primeira rodada de votação é contraproducente. "Não é democrático você querer constranger as pessoas a já votar no menos ruim no primeiro turno", disse Eduardo, em entrevista à coluna.

Ele acha que Marina Silva tomou decisão errada ao declarar apoio imediato ao petista e critica o próprio partido, o PV, por participar da federação com o PT.

Ambientalista, ele explica por quais motivos apoia a candidatura da emedebista Simone Tebet, que é vista como próxima do agronegócio.

"A Simone tem condições de fazer esse diálogo, esse casamento virtuoso entre agricultura moderna e sustentável e a potencialidade econômica do meio ambiente brasileiro", acredita Eduardo Jorge.

UOL - Por quais motivos o sr. decidiu apoiar a candidatura de Simone Tebet (MDB) à Presidência?

Eduardo Jorge - No Brasil, depois do desastre econômico do PT e do desastre em todos os campos do Bolsonaro, o país está fraturado, sangrando. A repetição do segundo turno de 2018 nessa nova versão vai prorrogar essa fratura, esse imobilismo, por mais quatro anos.

Simone tem mais condições de pacificar, reunificar, fazer um governo de retomada democrática, de prioridade social bem clara. Desses quatro que estão disputando as primeiras posições é a que tem melhores condições para fazer a reunificação do país, de dialogar inclusive com aqueles setores mais moderados que estão optando por Lula e Bolsonaro.

Incrivelmente, há os moderados que se movem apenas pelo antipetismo e pelo antibolsonarismo. Simone é a melhor opção para fazer a reunificação do país e dialogar com todas as correntes.

Alguns ex-petistas como o sr. declararam apoio a Lula. Por que não seguiu esse caminho?

Qualquer diálogo com Lula e o PT passa por uma reavaliação dele e do partido em relação pelo menos a quatro pontos importantes. Quanto aos erros de sua política econômica, que levou à maior recessão do país; uma revisão profunda em relação ao clima e ao meio ambiente nos seus governos; uma reavaliação sincera em relação aos erros e desrespeito ao orçamento público, ao orçamento das estatais durante os seus quatro mandatos e, por fim, uma revisão total de sua política de alianças internacionais, que privilegiou aliados antidemocráticos, que não respeitam os direitos humanos.

Esses quatro pontos deveriam ter revisão profunda por parte dele e do partido, mas ele não fez nada disso nessa campanha. Apenas promete uma volta ao passado. Mas voltar ao passado sem fazer essas revisões não seria bom para o Brasil.

Quando fala de desrespeito ao orçamento das estatais se refere a práticas como as que foram expostas no caso do Petrolão?

Falo de postura não-republicana. Quanto a condenar ou não condenar, é uma questão para o Judiciário. Não sou juiz, não sou polícia, mas acho que eles precisam esclarecer tudo o que está pendente. Não condeno ninguém antes de ser julgado.

O sr. é conhecido pela atuação na defesa do meio ambiente. Acredita que Simone Tebet é a pessoa certa para tratar dos problemas nessa área?

O Brasil tem duas grandes potencialidades econômicas diferenciais: a riqueza que Deus nos deu de produção agrícola e a riqueza ambiental. Isso é um diferencial inclusive em relação aos grandes líderes como China, India, Estados Unidos, Rússia.

Simone vem de um estado que tem essa riqueza e ela tem essa experiência e capacidade de fazer diálogo entre a proteção e a potencialidade econômica ambiental e a evolução da agricultura cada vez mais científica, técnica e sustentável. A grande vocação do Brasil é fazer esse casamento entre a nossa riqueza ambiental e uma agricultura moderníssima, sustentável, que cada vez use menos agrotóxico, respeitando a questão ambiental, produzindo energia limpa e produzindo o ouro líquido do século 21.

Tem gente na esquerda e na direita, inclusive o Lula, que acha que o ouro líquido ainda é o petróleo. Isso é século 20. O ouro líquido na verdade é a água.

Muitos apontam que Simone é ligada ao agronegócio, o que seria incompatível com a defesa do meio ambiente.

Os críticos de cada corrente cada um procura seus pontos para abordar. O agronegócio precisa evoluir para a sustentabilidade, assim como a indústria, como a energia. A Simone tem condições de fazer esse diálogo, esse casamento virtuoso entre agricultura moderna e sustentável e a potencialidade econômica do meio ambiente brasileiro.

Mas a posição de Simone quanto ao Marco Temporal, por exemplo, colide com o interesse das lideranças indígenas.

Ela diz que quando houver presença de agricultores em terras indígenas, sejam eles pequenos, médios e pequenos, e que estão lá de alguma forma legitimados e de boa fé, é preciso que haja uma indenização. Você quer o quê? Que a gente retorne a guerra com os indígenas, deixando aqueles pequenos, médios e grandes agricultores sem indenização?

Ela quer uma solução pacífica, negociada, que garanta as terras indígenas. Isso é essencial: ela quer garantir as terras indígenas, mas com uma solução negociada. Não uma negociação de guerra. Essa guerra entre agricultores e indígenas só serve para eleger deputados aqui e ali. Não interessa os indígenas.

A argumentação dos que pedem voto útil em Lula, por conta dos ataques de Bolsonaro à democracia, não o sensibilizam?

O primeiro turno é feito para você fazer sua escolha com liberdade, por aquilo que você tem afinidade. O segundo turno é feito para escolher entre os dois que o povo decidir. Nesse sentido, você votar no mal menor ou no menos ruim entre os dois favoritos no primeiro turno é contraproducente.

São duas discussões diferentes, a do primeiro turno e a do segundo turno.

Não é democrático você querer constranger as pessoas a já votar no menos ruim no primeiro turno. Não é uma coisa adequada.

O que achou da decisão de Marina Silva, ex-petista e ambientalista como o sr., de anunciar voto em Lula no primeiro turno?

Tanto a Marina quanto a Rede fizeram opções políticas erradas, aliando-se ao PT de um lado e ao PSOL de outro. Há uma subordinação. Nessas federações, tanto o PV quanto a Rede ficaram subordinados ao PT e ao PSOL.

Isso compromete a independência que os ambientalistas têm que ter em relação à direita e à esquerda. Nós somos de outra vocação. Nós dialogamos tanto com os conservadores, com os liberais, com os socialistas, no sentido do ambientalismo.

Se acontece como o PV em relação ao PT e como a Rede com relação ao PSOL, o partido se subordina a uma determinada corrente ideológica e diminui nossa capacidade de ajudar o conjunto da sociedade a evoluir em direção ao ambientalismo. Acho que tanto PV quanto a Rede fizeram opções equivocadas nessa eleição.