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Chico Alves

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Com omissão no caso de yanomamis, Exército marca tristemente sua história

Crianças yanomamis resgatadas em operação do Ministério da Saúde - 22.jan.2023 - Weibe Tapeba/ Sesai / Divulgação
Crianças yanomamis resgatadas em operação do Ministério da Saúde Imagem: 22.jan.2023 - Weibe Tapeba/ Sesai / Divulgação

Colunista do UOL

26/01/2023 17h33

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Desde que parte dos generais resolveu embarcar no projeto de candidatura de Jair Bolsonaro à Presidência da República, as Forças Armadas se expuseram a um inédito projeto de desconstrução. A decantada neutralidade política foi por água abaixo. Militares se envolveram em uma sucessão de episódios lamentáveis, da colaboração na produção de cloroquina à participação na infame campanha de descrédito que Bolsonaro liderou contra as urnas eletrônicas.

É extensa a sequência de ações questionáveis empreendida por generais como Braga Netto, Hamilton Mourão, Augusto Heleno, Luiz Eduardo Ramos e Paulo Sérgio Nogueira. Praticamente todas as sandices praticadas por Bolsonaro tinham a participação de ao menos um desses estrelados.

Mesmo depois do fim do governo de Bolsonaro, essas aberrações continuam vindo à tona.

É o caso da colaboração do Exército com golpistas que praticaram a depredação terrorista contra as sedes dos três Poderes, em Brasília. Bandidos e fanáticos ficaram acobertados nas proximidades do QG. Ali, terroristas preparam artefatos explosivos. Dali saíram para tentar instalar o caos na capital, nos dias 12 de dezembro e 8 de janeiro.

Mesmo depois da depredação aos prédios do Executivo, Legislativo e Judiciário, as hordas ainda foram protegidas pelo comandante do Exército, Júlio César Arruda, que acabou demitido por isso.

Esses absurdos já seriam graves o bastante, mas agora, com a revelação dos detalhes sobre a omissão do Exército na defesa da comunidade yanomami em Roraima, o conceito da força terrestre fica ainda mais desgastado.

Como explicar que uma das áreas de maior ocupação de garimpeiros na região está situada próxima ao 4° Pelotão Especial de Fronteira do Exército (PEF), de Surucucu? Foi ali que se registrou o maior número de crianças yanomamis subnutridas e mortas.

Como justificar que militares do Exército participassem do mesmo grupo de WhatsApp com garimpeiros para avisá-los de ações de repressão ao garimpo no território yanomami, como mostra relatório da Funai?

Quais motivos poderiam justificar o fato de que militares da reserva que estão na direção do Ibama ignoraram os pedidos de socorro dos indígenas?

Outro destacado general da reserva, Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), tem argumentos racionais para explicar a permissão para mineração de ouro em área de 9,8 mil hectares próximo à Terra Indígena Yanomami?

Tristemente irônico que esse tipo de tratamento dado aos indígenas venha justamente de uma força que teve em seus quadros o marechal Cândido Rondon, pioneiro na exploração da Amazônia e na preservação das comunidades indígenas.

Foi ele que, na década de 1950, após décadas de trabalho em favor dos povos originários, ajudou a criar o Parque Nacional do Xingu.

Se o Exército Brasileiro tem hoje homens à altura da grandeza de Rondon — que disse ser capaz de morrer pelos indígenas, mas nunca matá-los —, que eles se apresentem urgentemente.

Pelo bem dos yanomamis e pelo bem do próprio Exército.