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Bolsonaro representa um modelo agudo de capitalismo, diz filósofo
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* Cesar Calejon
Os estados modernos, os ordenamentos jurídicos nacionais e, basicamente, toda a organização da vida social, sobretudo nos países ocidentais, são frutos de um modelo de sociabilidade que vem sendo elaborado pela lógica de reprodução do capital, que depende de crises recorrentes para fazer a manutenção das suas propriedades.
Nesse contexto, o bolsonarismo é a forma de expressão mais aguda desse modelo de sociabilidade capitalista no Brasil. Essa foi a principal ideia explanada por Alysson Leandro Mascaro, filósofo, jurista e professor da Universidade de São Paulo, em entrevista à coluna realizada na última semana.
"O estado como o conhecemos é uma forma de organização sociopolítica do capital. Caso a democracia não seja mais interessante ao capital, essa força fará com que um golpe ou uma ditadura aconteçam. Nesse contexto, surge o bolsonarismo", explica Mascaro, que é autor dos livros Crise e Golpe (Boitempo), Crise e Pandemia (Boitempo), Althusser e o Materialismo Aleatório (Contracorrente), entre outros.
Ao encontro desse raciocínio, a ex-presidenta Dilma Rousseff disse, também em entrevista exclusiva para essa coluna, que o "impeachment (2016) aconteceu porque nós (Brasil) travamos a agenda neoliberal".
Cinco anos depois, existem provas robustas que comprovam a ingerência imediata de elites nacionais e estrangeiras no golpe parlamentar, o que abriu as portas para a agudização do modelo de sociabilidade brasileiro e para a própria ascensão do bolsonarismo. Em seguida, Paulo Guedes e a sua equipe completaram o trabalho.
"Ainda vivemos em uma sociedade bastante infantil no sentido do que é a luta política e social. (...) O que aconteceu com o Salvador Allende, com (Getúlio) Vargas, com Jango (João Goulart) não nos serviu de exemplo, infelizmente", complementa Mascaro.
Segundo ele, "com base em uma suposta neutralidade do estado e solidez da democracia, imaginou-se que situações assim não aconteceriam novamente, que não existiria mais a interferência do imperialismo estadunidense na nossa geopolítica nacional, que o Exército do Brasil, de fato, defenderia a soberania nacional, que o direito fosse a legalidade e assim por diante".
"Enquanto a sociabilidade for dominada economicamente pelo capital, a política será capitalista, de tal sorte que o elemento central da luta não é somente e necessariamente o político, mas o econômico. Sem essa consciência social de luta contra a exploração econômica, apenas enxugaremos gelo", prossegue o professor.
A favor desse argumento, consta o agravamento da materialidade econômica e trabalhista da vida social brasileira após o golpe: o preço da gasolina, do gás de cozinha, da taxa de conversão do dólar, a retirada dos direitos conquistados pela classe trabalhadora, a informalidade etc.
Conforme também foi demonstrado em artigo prévio publicado nessa coluna, há uma correlação direta entre o nível de submissão das políticas econômicas dos países da América Latina à agenda neoliberal internacional e o aumento da miséria nos seus respectivos territórios nacionais.
Atualmente, o Brasil registra a volta da fome, da inflação, da escassez e da precarização do trabalho e do aumento da população vivendo nas ruas, enquanto um grupo ínfimo de investidores ligados ao capital estrangeiro se torna bilionário.
Para todos os efeitos, Mascaro acredita que esse processo de exploração do povo brasileiro deverá ser reeditado em 2022 ou nos anos subsequentes de forma ainda mais agressiva, possivelmente.
"É golpe em cima de golpe. (...) Nesse sentido, a luta de transformação social deve ser para a emancipação popular em face do capital, sendo que o capital guia o destino político da humanidade. Há quase trezentos anos temos as condições de emancipar a sociedade, mas ainda não chegamos lá", conclui o professor.
Para assistir à entrevista completa, clique aqui.
* Cesar Calejon é jornalista, com especialização em Relações Internacionais pela FGV e mestrando em Mudança Social e Participação Política pela USP (EACH). É escritor, autor dos livros A Ascensão do Bolsonarismo no Brasil do Século XXI (Kotter) e Tempestade Perfeita: o bolsonarismo e a sindemia covid-19 no Brasil (Contracorrente).
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