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Fim do governo Bolsonaro seria cômico se não fosse trágico
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* Cesar Calejon
Em menos de duas semanas, termina o governo Bolsonaro, a pior administração federal que chefiou o Poder Executivo brasileiro em toda a história do país.
Desde a derrota nas urnas, no último dia 30 de outubro, grupos de bolsonaristas autointitulados "patriotas" têm protagonizado cenas cômicas ao demandarem, em frente aos quartéis das Forças Armadas, um golpe de Estado. Teve de tudo: de surtos de comemorações por prisões que jamais aconteceram de ministros do STF até tentativa de comunicação com alienígenas para evitar o "comunismo".
Por outro lado, durante a última semana, os atos antidemocráticos ganharam uma dimensão terrorista, com radicais extremistas do bolsonarismo causando danos reais no Distrito Federal, logo após a diplomação do presidente eleito.
Além disso, Bolsonaro deixa um passivo fiscal de R$ 400 bilhões, quatro violações do "teto de gastos", um apagão da base de dados, a destruição das políticas públicas, a infraestrutura nacional em frangalhos, o desmonte da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico no país, mais de 60 milhões de pessoas na linha da pobreza, recordes de devastação das áreas de preservação e das florestas, dentre outros aspectos. Em última instância, o fim do governo Bolsonaro seria cômico se não fosse extremamente trágico.
O vice-presidente eleito Geraldo Alckmin sintetizou bem a situação do país a interlocutores que acompanharam o processo de transição. "Desde que entrei na vida pública, nunca vi nada parecido. (...) A impressão que se tinha é de que não havia gestão e que tudo era decidido aleatoriamente. (...) Há documentos desaparecidos, há apagões de dados que sempre existiram em governos anteriores e há rombos financeiros inexplicáveis. (...) Nem isso dá para saber (se o caso caracteriza um processo de corrupção), simplesmente não existe registro de nada", destacou semanas atrás.
Segundo André Roncaglia, professor de economia da Unifesp, os estragos não param nesse ponto. "Temos uma fila de 128 mil famílias no Auxílio Brasil, a privatização dos dividendos da Eletrobras e socialização dos custos. Ou seja, uma bomba de R$ 500 bilhões, sendo R$ 364 bi para construir gasodutos de usinas térmicas distantes do fornecimento, carência de R$ 23 bilhões na Saúde, corte de 90% no investimento das universidade federais, corte de bolsas de estudo para todo o Brasil, contingenciamento de gastos correntes na gestão de institutos federais, autonomia do Banco Central com o presidente consultando banqueiros sobre juros e mantendo dinheiro em paraíso fiscal e assim por diante", explica Roncaglia.
"Além disso", prossegue ele, "o esquema de 'porta giratória' virou uma passarela: membros do governo que facilitaram privatizações de estatais se tornam agora executivos das empresas beneficiadas e executivos de bancos, como o BTG, do qual Guedes era sócio, e o valor recorde de juros da dívida de R$ 591 bilhões em 2022. Esse é o legado do 'liberalismo' da dupla Guedes e Bolsonaro", conclui o especialista.
Evidentemente, considerando esse cenário de terra arrasada e as mais de 691 mil mortes que a sua falta de bom senso mínimo e negacionismo ajudaram a catalisar durante a pandemia, Bolsonaro tem inúmeras razões para estar profundamente deprimido.
Ao concluir a sua farra irrestrita frente à Presidência da República, a conta a ser paga parece ser muito salgada e o futuro não indica ser promissor para o projeto de déspota que, nas urnas, viu seus delírios autoritários serem chutados pela população.
Enganou-se e deve arcar com as consequências na medida da Lei. Adeus, Bolsonaro. O Brasil do futuro celebra a sua derrocada.
* Cesar Calejon é jornalista, mestre em Mudança Social e Participação Política pela USP com especialização (MBA) em Relações Internacionais pela FGV. Autor de Sobre Perdas e Danos: negacionismo, lawfare e neofascismo no Brasil, além de outras obras sobre o bolsonarismo.
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