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Com multa do TSE, abrigar Bolsonaro tornou-se caro para os partidos
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* Vinícius Rodrigues Vieira
Bolsonaro ficou Bolsocaro. A partir de agora, servir de hospedeiro para a extrema-direita brasileira deve ter consequências legais para os partidos na forma de multas e, eventualmente, processos criminais. Esse é o grande recado do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, ao impor a penalidade por litigância de má-fé de quase R$ 23 milhões ao PL, ao qual o capitão reformado Jair Messias está afiliado, e seus parceiros na coligação que sustentou a campanha de reeleição (Republicanos e PP).
Formalmente ainda presidente da República, ele hoje veste sem qualquer pudor o figurino de golpista-mor, ao instrumentalizar seu partido a contestar os resultados do segundo turno das eleições presidenciais com base numa suposta falha de urnas eletrônicas produzidas antes de 2020. Seria apenas trágico ter um chefe de Estado golpista se não fosse ilógico o pedido: os equipamentos foram os mesmos empregados no primeiro turno, que deu ao PL a maior bancada na Câmara dos Deputados e Senado, além da vitória de aliados de Bolsonaro nos Estados mais ricos — incluindo Minas e São Paulo.
Para que a multa seja paga, o TSE determinou ainda a retenção de recursos do fundo partidário que seriam repassados ao PL. Dispersos por partidos de direita, bolsonaristas tornam-se, portanto, um fardo demasiadamente pesado para ser carregado por políticos que, como o presidente do PL, Valdemar da Costa Neto (que, na juventude, atendia pela alcunha de 'Boy'), pautaram sua carreira pelo pragmatismo extremo. Sua promessa de bancar Bolsonaro como presidente de honra do partido, que será oposição ao governo eleito Lula-Alckmin, deu-se visando um mercado de votos em potencial para 2026.
Apesar das ilegalidades bolsonaristas, esse mercado deve manter-se forte. No entanto, o custo para qualquer partido se associar a essa parcela do eleitorado tende a gerar mais ônus no curto prazo que os frutos a serem colhidos apenas no fim deste ciclo eleitoral, em quatro anos.
Assim, serão grandes os incentivos para que, em nome da sobrevivência política, Bolsonaro e seus seguidores retomem o projeto de organizar um partido próprio, o Aliança pelo Brasil, cujo nome emula o AfD (Aliança pela Alemanha, no idioma germânico), de clara inspiração nazista, e que defende, na prática, um nacionalismo branco, tal como escrevi em 2019 nesta coluna. Gente graúda, que hoje financia os atos golpistas que se avolumam país afora, teria interesse em bancar a empreitada ainda que o TSE cerre o cerco sobre os que pagam fanáticos para bloquear estradas e acampar em frente a quartéis.
A existência de um partido explicitamente fascista parece perigosa num primeiro momento, mas deixaria às claras quem pretende se valer da democracia para derrubá-la. Hoje, o bolsonarismo fica escamoteado em siglas à direita que, convenientemente, querem explorar os votos dos extremistas. Com seu próprio partido, a extrema-direita brasileira teria um espaço legítimo para se manifestar, estando, porém, sujeita às penalidades legais que devem sofrer aqueles que, independentemente da posição no espectro político, agem com má-fé ao buscar destruir as instituições por dentro.
Por fim, as multas são instrumento que torna natimorta a narrativa que caracteriza o TSE como um braço autoritário de um sistema supostamente corrupto. Prisões de golpistas são, sem dúvida, necessárias, mas abrem espaço para um discurso de martírio com o potencial de fomentar, ainda mais, o fanatismo que se apropriou dos símbolos nacionais. Foi o caso da prisão do deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado, mas depois anistiado por Bolsonaro.
A luta contra a extrema-direita está apenas começando. Quanto mais caro ficar para o bolsonarismo ser golpista, menos eleitores passarão a ponderar o ônus de buscar reformas com discurso e ações de extrema direita. Não se destrói o fascismo apenas com boas intenções: o rigor institucional é, mais do que nunca, necessário para enquadrar devidamente os extremistas e seus garotos de recado.
* Vinícius Rodrigues Vieira é doutor em relações internacionais por Oxford e leciona na Faap e em cursos MBA da FGV.
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