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Bolsonaro mente sobre urnas, e 'donos do PIB' se calam
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Já é grande a lista de grupos que, nos últimos dias, criticaram o presidente Jair Bolsonaro por se reunir com chefes de missões diplomáticas e despejar neles uma série de mentiras sobre a lisura do processo eleitoral brasileiro. Mas um grupo — extremamente relevante para a estabilidade do país — ainda falta entrar nessa lista.
Repudiaram as mentiras ouvidas no evento de segunda-feira (18) a cúpula do Judiciário, diferentes setores do Ministério Público, Polícia Federal e Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o presidente do Senado, políticos dos mais diversos partidos e até parte relevante da comunidade internacional (como a imprensa e o governo americanos). Mas a elite econômica do país segue no mais absoluto silêncio ante o flerte anti-democrático do presidente. Por onde andam empresários e banqueiros? O que pensam os dos "donos do PIB (Produto Interno Bruto)"?
Nos últimos três dias, passei algumas horas navegando por portais de notícia, redes sociais e sites de entidades que reúnem os donos do dinheiro. Procurei notas de repúdio, entrevistas com frases contundentes, simples tuítes contrários às falsidades ditas por Bolsonaro aos embaixadores. Mas não encontrei nada. O "PIB" ficou mudo ante as (perigosas) maluquices do presidente — e isso merece atenção.
Quem olha para a história recente do Brasil vê — com facilidade — que não foram poucas as vezes em que, de forma coordenada, empresários e banqueiros tiveram papel ativo e definitivo nos rumos da política nacional.
A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), por exemplo, foi peça-chave nas manifestações pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. De lá, veio a campanha "Quem vai pagar o pato?", que espalhou pelo país milhares de aves de plástico como forma de criticar os rumos da política petista à frente do Planalto.
A Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), por sua vez, foi parar no noticiário em agosto do ano passado depois de ter costurado com mais de 200 entidades de classe uma "carta pela democracia". O texto, que reverberou no noticiário por dias, buscava (e conseguiu temporariamente) aplainar os ânimos em torno das manifestações do 7 de setembro. O documento evidenciava a preocupação dos banqueiros com os constantes confrontos entre o Palácio do Planalto e o STF (Supremo Tribunal Federal), pedindo conciliação
Confederações nacionais — entre elas, CNI (da indústria) e a CNC (do comércio) — também sempre exerceram papel de destaque em anos eleitorais. Costumam preparar e encaminhar aos presidenciáveis uma série de propostas para políticas públicas que são de interesse do setor. Em seguida, se reúnem com os polítcos e buscam influenciar seus planos de governo de forma direta e explícita. Em 2022 não foi diferente. O último encontro desse tipo ocorreu em 30 de junho, mostrando que indústria e comércio estão, sim, antenados e dipostos a interagir com a corrida presidencial.
Nesta semana, porém, a elite empresarial e financeira do país não deu nenhum pio. Não entrou no debate público para tentar frear o presidente e sua narrativa desinformativa sobre as urnas. Não apresentou sua posição com relação à confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro. Subiu no muro. Não ficou nem do lado de Bolsonaro nem contra ele.
E falta apuração jornalística para entender o porquê.
Em fevereiro deste ano, o empresário Josué Gomes, que substituiu Paulo Skaf à frente da Fiesp, disse num encontro com jornalistas que é preciso "confiar no povo brasileiro, na urna eletrônica e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral)" e sugeriu que Bolsonaro deixasse de atacar "as vacinas, o TSE, as urnas eletrônicas, a imprensa" com informações inverídicas.
Então por que permaneceram calados nesta semana? Será que os "donos do PIB nacional", não percebem que silenciar sobre as mentiras ditas na segunda-feira extrapola qualquer intenção de ser apartidário ou apolítico? Será que os grandes empresários ainda não entenderam que essa mudez coloca em risco muito mais do que a reputação dessa ou daquela entidade junto a um determinado partido ou candidato? Não vêem que ameaça a democracia como um todo? E será que não enxergam a urgência de se somar ao ministro Edson Fachin, presidente do TSE, ao pedir "um basta" aos ataques que Bolsonaro desfere sistematicamente contra o processo eleitoral brasileiro?
Cegos não são.
Cristina Tardáguila é diretora sênior do ICFJ e fundadora da Lupa
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